Vamos por partes. Conhece Catarina Gouveia? Se não, nós pômo-lo a par. Catarina Gouveia tem 34 anos de idade, é atriz e ao partilhar o seu estilo de vida saudável tornou-se uma influenciadora portuguesa. É conhecida pelas suas receitas com produtos biológicos - que até deram origem a um livro -, por ser disciplinada e exigente no que diz respeito à escolha das suas refeições e é raro o dia em que deixe um treino por fazer.
Quem a segue parece que entra num verdadeiro conto de fadas. Mudou os seus hábitos por amor à profissão - porque o tipo de alimentação que tinha estimulava o aparecimento de acne, que se tornou impossível de esconder com maquilhagem -, conheceu o "homem da sua vida" e partilha diariamente as suas rotinas. É, para muitas mulheres, vista como uma inspiração; para outras um extremo. Mas é generosa nas suas partilhas. A Catarina [vamos deixar o último nome para trás] partilhou, sempre, com os seus mais de 580 mil seguidores os momentos mais importantes da sua vida.
O pedido de casamento, o realizar do sonho de comprar uma casa na Comporta e, por fim, a maior benção da sua vida: que estava à espera de um filho. Esteve 40 semanas à espera de ter a menina nos braços (que a criança teimava em não nascer) e, quando aconteceu, Catarina decidiu anunciar ao mundo a chegada da sua bebé da mesma forma como sempre tratou o seu feed do Instagram: de uma forma bonita, cuidada. Uma imagem com a filha nos braços e o marido a olhar a bebé. Uma fotografia pensada, de um momento bonito e que fez a internet parar com a chuva de críticas que caiu na sua caixa de comentários. A questão é: porquê? À primeira vista isto pode parecer-nos até uma afronta... mas foi real. A piscóloga clínica Vera Ribeiro explica-nos o fenómeno que tomou conta das redes sociais... e do mundo. Mas já lá vamos...
A DESILUSÃO COM OS "ÍDOLOS"
Quando falamos das críticas de que Catarina Gouveia foi alvo, estamos a falar de acusações e palavras graves. O cabelo "em cascata" da atriz e previamente pensado parece ter feito incomodado muitos seguidores. "Nunca me senti tão feliz na minha vida. Esta é, agora, a nossa família". Foi desta forma que a atriz partilhou com os seguidores o nascimento da primeira filha. Alegadas mães acusam-na de passar a ideia de um "pós-parto irreal".
"Deixei de seguir a Catarina Gouveia. No Instagram dela é sempre tudo perfeito, demasiado", "a fotografia está um bocado irrealista e demonstra uma alta produção por trás", "a realidade é mais camisa de hospital, fraldas e maminhas de fora", são apenas alguns das mais "leves" palavras que se podem ler.
Antes de mais, a psicóloga clínica Vera Ribeiro explica que não há nada que justifique estes ataques que, normalmente, "vêm de mulheres", mas as explicações podem ser as mais variadas. "Sendo a Catarina a cara da natureza, dos bons hábitos, muitos dos seus seguidores poderiam estar à espera que ela partilhasse uma fotografia sem produção, algo mais natural e que não aparecesse fantástica logo a seguir ao parto, apesar de ter esse direito. Essa expectativa que criaram, foi defraudada e isso, hoje em dia, com a repercursão das redes sociais gera uma onda de ódio."
Foi de tal forma que Catarina Gouveia se afastou, desde então das rede social que é, atualmente, a sua maior ferramenta de trabalho.
A FALTA DE IDENTIFICAÇÃO
A polémica tomou proporções desmedidas. A influenciadora foi acusada de não ter empatia para com as mulheres e de dar um exemplo irreal àquelas que projetam ser mães. "Talvez a Catarina Gouveia não tenha noção do que fez com esta fotografia! Talvez ela não saiba a quantidade da mulheres que se vão sentir na merda quando estiverem na maternidade. O mundo precisa de normalizar a vida real e esquecer os filtros do Instagram", pode ler-se no Twitter. Mais há mais...
"A Catarina Gouveia teve um parto ou fez um ‘unboxing’?" ou "A Catarina Gouveia teve uma filha ou foi só uma foto para uma campanha publicitária, fiquei confusa assim de repente." A resposta é mais fácil e básica do que tudo isto: "A Catarina publicou uma fotografia bonita, de um dos momentos mais felizes da sua vida, com a sua família", começa por deixar claro a psicóloga, que defende que muitas das reações negativas surgem também da falta de identificação de outras mulheres (mas que continua sem ser uma justificação para maus-tratos). "Não se pode generalizar um pós-parto. Há de tudo. Há quem tenha uma recuperação difícil e há quem tenha partos maravilhosos como foram os meus, por exemplo. Quem faz esta crítica está a querer projetar no outro uma realidade negativa popular, de que a mulher depois de ter um bebé deve estar com péssimo ar, mas trata-se apenas de uma foto." OS COMPORTAMENTOS "DOENTIOS" As redes sociais puseram-nos em contacto com o mundo, permitiram-nos publicar o que queremos, quando e onde queremos. Os famosos ganharam a possibilidade de dar as notícias em primeira mão e ao seu público mais direto, mas permitiram também que fosse enxovalhados sem sequer sairem de casa.
"Não se pode generalizar um pós-parto. Há de tudo. Há quem tenha uma recuperação difícil e há quem tenha partos maravilhosos como foram os meus, por exemplo. Quem faz esta crítica está a querer projetar no outro uma realidade negativa popular, de que a mulher depois de ter um bebé deve estar com péssimo ar, mas trata-se apenas de uma foto."
OS COMPORTAMENTOS "DOENTIOS"
As redes sociais puseram-nos em contacto com o mundo, permitiram-nos publicar o que queremos, quando e onde queremos. Os famosos ganharam a possibilidade de dar as notícias em primeira mão e ao seu público mais direto, mas permitiram também que fosse enxovalhados sem sequer sairem de casa.
"Antigamente, uma pessoa tinha que sair à rua para ser alvo de críticas e podia ouvir uma coisa ou outra. Hoje em dia não é assim, estamos mais vulneráveis e as ofensas ganham outras dimensões e ficam eternizadas para sempre na internet", explica a psicóloga, que realça que há verdadeiras vítimas destas "perseguições internautas". "Há certos telespectadores de certos programas de televisão que criam grupos para denegrir pessoas nas redes sociais. E pode começar no Facebook, depois passa para o Instagram, para o Twitter... e é uma bola de neve sem fim."
Preocupada com as gerações futuras, Vera Ribeiro considera que alguns comportamentos chegam mesmo a "ser doentios" e "psicologicamente exigentes" para quem está exposto à crítica desta forma tão gratuíta. Está na altura de pararmos, pormos a mão na consciência e pensarmos para que lado queremos levar o mundo. Porque tem uma mulher que ser "aniquilada" socialmente porque, na sua própria rede social, uma fotografia maravilhosa, ao lado do marido e da filha? E se preferisse pôr uma fotografia cheia de sangue, ainda no bloco operatório, com uma touca na cabeça? O que faria de Catarina mais ou menos mulher? No que é que nos tornámos umas para as outras? A falta de "empatia" não é da Catarina...
