
Foi há seis anos, mas não há um único dia em que Sara Santos não pense naquele dia. A modelo e antiga apresentadora da SIC estava grávida de 30 semanas quando deu entrada de urgência no Hospital de São Bernardo, em Setúbal, com tensão alta, náuseas e vómitos. A situação clínica era grave e o primeiro exame de monitorização sugeria que Sara deveria ser sujeita a uma cesariana para colocá-la a ela e à bebé que esperava em segurança, uma vez que o exame indicava sinais de sofrimento fetal. Só que o médico que a acompanhou demorou mais de quatro horas a tomar a decisão para avançar para a cirurgia de emergência e quando finalmente o fez, o feto já não tinha batimentos cardíacos.
"A cesariana deveria ter sido feita nos primeiros 20 minutos, assim que fui ligada ao CTG. Aquele homem deixou a minha filha morrer dentro de mim, asfixiada", revelou logo na altura a manequim que, depois de investigar o caso e falar com o obstetra que a originalmente acompanhou, decidiu avançar com um processo contra o profissional de saúde.
O caso conheceu esta semana um desfecho com o médico José Sacramento Sousa a ser condenado a um ano e meio de pena suspensa por um crime de homicídio negligente por omissão e a pagar uma indemnização de 35 mil euros a Sara e de 20 mil ao seu antigo companheiro, o ex-jogador de futebol Carlos André. Uma sentença que a modelo considera branda face a um erro grave que culminou na morte da bebé que esperava.
"Vamos recorrer. A juíza nem a carteira de médico lhe tirou, não foi condenado por negligência médica grosseira, quando a própria Ordem dos Médicos já o tinha impedido de exercer durante três meses por isso", começa por contar à 'The Mag' Sara, acrescentando que o que mais a tem revoltado é a postura do médico, algo que, garante, a tem impedido de fazer o luto.
"Saiu do tribunal a rir-se... E nunca, mas nunca me pediu desculpa, era humano que admitisse o erro. Isto até se pode encerrar daqui a uns meses, mas é algo que me vai ficar sempre atravessado. Ainda não consegui fazer o luto da minha filha e talvez se ouvisse uma palavra deste homem, uma assunção de culpa, isso ajudasse, mas não e isso vai ficar sempre marcado."
Com o caso a arrastar-se na Justiça durante seis longos anos, Sara Santos sente que a sua vida ficou em suspenso e que nada nunca mais nada será o mesmo. "Foi muito duro. Tive de fazer funeral da minha filha... E depois, foram muitos anos, dediquei-me muito a investigar o processo, no meio disto tudo divorciei-me, há muita culpa associada."
Apesar de todo o sofrimento, Sara Santos acabou por reencontrar o amor e hoje vive uma relação estável ao lado de Gonçalo Sousa, de 45 anos. Com um namoro feliz, a modelo começa, aos poucos, a fazer planos para o futuro, que envolvem voltar a pensar numa gravidez.
"Não é este médico que me vai roubar o sonho de voltar a ser mãe", conta a modelo, que já é mãe de um rapaz. "O Gonçalo tem 45 anos e ainda não é pai. Já falámos sobre isso e é algo que queremos. Se acontecer, vou querer ser acompanhada de forma diferente e tentar abstrair-me de tudo o que me aconteceu, que foi por causa do erro de uma pessoa."
O DIA EM QUE TUDO MUDOU
Sara Santos comoveu o país ao relatar o momento em que a sua vida mudou, a 6 de fevereiro de 2018. A modelo era acompanhada como tendo uma gravidez de risco devido a uma vilite crónica, um problema que leva a restrição de peso intrauterina e faz com que o bebé não apresente um crescimento adequado à idade gestacional.
No entanto, quando deu entrada no Hospital de São Bernardo, gravida de pouco mais de sete meses, Sara nunca imaginou o que estava prestes a acontecer-lhe.
"Existem episódios desse dia que são os que mais me vêm à cabeça. As enfermeiras a gritar com o médico, a dizer que tinha de ser transferida para a Maternidade Alfredo da Costa e o médico respondeu: 'Não vai para lado nenhum, o médico aqui sou eu', quando vi o meu marido a vir na minha direção, após o parto, a chorar. Foi quando percebi que a minha filha tinha morrido. Soube a notícia pelo meu marido, o médico, enfermeiras e pediatras que tentaram ressuscitar a minha filha, não me dirigiram uma única palavra", contou na altura à VIP, acrescentando que só mais tarde, ao ser chamada pelo seu próprio obstetra, percebeu que se tinha tratado de negligência médica.
"O médico que me fez o parto, nunca falou comigo, mesmo durante o tempo em que estive internada. O que me foi explicado, no dia seguinte após o parto, por parte do diretor de Obstetrícia, foi que o médico que me assistiu tentou fazer os possíveis e que teria feito o mesmo que aquele médico fez, o que significa que iria matar a minha filha também. Disse-nos que era uma bebé muito pequena (e era) e que se tivesse sobrevivido ficaria um vegetal. Eu e o meu marido, que não somos médicos, acreditámos. Já em abril, fui contactada pelo médico que me acompanhou durante toda a gravidez que me disse tínhamos sofrido negligência médica, que tinha tido acesso aos relatórios médicos e ao CTG [Cardiotocografia] e que aquele médico matou a minha filha. Chamou-lhe um CTG assassino, que não entendia porque é que o médico se tinha negado a transferir-me de hospital e tinha levado mais de quatro horas a fazer uma cesariana, com um CTG com sofrimento fetal. E aí, foi um balde de água fria para mim e para o meu marido. Ele incentivou-nos a avançar com uma queixa-crime. Tínhamos duas opiniões, uma inicial em que afirmam terem feito o que podiam e uma segunda que diz ter sido negligência. Foi aí que comecei a investigar. Pedi, junto do hospital, todo o meu relatório, o CTG e comecei a falar com outros obstetras mostrando os elementos que tenho comigo e todos confirmaram ter sido negligência à descarada. Que a cesariana deveria ter sido feita nos primeiros 20 minutos, assim que fui ligada ao CTG. Aquele homem deixou a minha filha morrer dentro de mim, asfixiada!".
O relato chocante foi repetido até ao limite por Sara em tribunal e, apesar de sentir algum alento com a condenação do médico, de 74 anos, a modelo e apresentadora não tem dúvidas de que tem de haver uma mão mais pesada na Justiça para evitar que mais casos como o seu terminem em tragédia.