
Lembra-se do filme 'Sliver - Violação de Privacidade'? Eu relembro-o. Uma mulher aluga um apartamento e descobre, depois de se apaixonar pelo proprietário, que este grava todos os momentos íntimos que ela e todos os que vivem naquele condomínio passam. Se lhe disser que é com Sharon Stone e William Baldwin talvez se lembre melhor.
Pois... é de violação de privacidade que lhe falamos.
Mas se no início dos anos 90 era em vídeo, e apenas o proprietário podia vê-la, ou então teria de passar muito tempo a fazer cópias (basta para isso espreitarem a série 'Pam & Tommy' para ver como era feito esse processo) para as poder divulgar ao mundo hoje isso já não é assim. Basta um click...
A videocassete... isso já foi chão de deu uvas há muito tempo. Hoje, na era digital, o roubo de uma imagem, de um vídeo mais íntimo, pode transformar a vida de qualquer um num verdadeiro inferno. E não, não estamos a falar de Pamela Anderson, nem de Kim Kardashian, que inclusive lucraram e muito com os vídeos que fizeram. Falamos de algo completamente diferente, de verdadeiros filmes de terror. Made in Portugal.
No início desta semana, a jovem atriz Margarida Corceiro abandonou as redes sociais depois de ter visto fotos alegadamente suas, de conteúdo íntimo, divulgadas nas redes sociais. Segundo acabaria por ser veiculado, a atriz na altura das fotos teria apenas 15 anos, portanto seria menor. Isto se for ela a pessoa nas fotos. A jovem, atualmente na novela 'Quero é Viver', tornou-se subitamente num dos assuntos mais falados, nomeadamente no Twitter onde chegou a ser 'trend'.
Isto sem nunca o desejar...
PRIMEIRAS VÍTIMAS
Esta não é a primeira vez que um drama destes acontece no nosso País. A primeira vítima conhecida é Carla Matadinho, quando era ainda modelo. Alegadamente terá colocado o computador para arranjar quando algumas imagens e vídeos seus, privados, com um namorado, teriam sido roubados do disco rígido. Já passaram mais de 15 anos desde esse caso, mas Carla não está livre das imagens que circulam livremente em vários sites apesar da hoje produtora de espectáculos, ter tentado diversas vezes proibir que estas circulassem.
Também Fernanda Serrano passou por um episódio escandaloso de cariz sexual. A atriz pode nunca ter feito um vídeo intimo, mas na Internet surgiu uma montagem com uma mulher, em tudo semelhante à estrela da TVI... num vídeo com conteúdo explícito. A atriz foi rápida e conseguiu travar a exibição do falso vídeo, que estava colado ao seu nome. O caso acabaria por não ter tanto enfoque já que ficou rapidamente provado que a pessoa em questão não era a atriz mas sim uma pessoa que se assemelhava a ela.
Mais recentemente, em 2016, foi a vez da modelo e apresentadora Beatriz Moniz Ramos. Vídeos de cariz íntimo surgiram na Internet fruto de alegado roubo. Na altura, a musa de Agir seria defendida pelo músico que mostrava o desagrado com a situação. Beatriz Moniz Ramos nunca disse nada sobre o assunto, para não causar mais falatório, mas nas redes sociais circulava que estas imagens tinham chegado (e ainda estão) na Internet devido ao desfecho azedo de uma relação no passado.
Há mais.
Três anos depois era a vez da estrela da 'Casa dos Segredos' Sofia Sousa ver a sua intimidade exposta para todos verem. Diversas fotos da jovem sem roupa apareciam pelas redes sociais levando-a a ter que agir judicialmente. Na altura foi nas redes sociais que esta reagiu primeiro. "Pessoal, entendo as mensagens que me estão a mandar (a alertar do sucedido), mas o telemóvel do meu namorado Miguel Colaço foi roubado e estão a postar fotos indevidas. Agradeço que não divulguem e entendam a situação", disse revelando que o caso já estava "a ser resolvido". Certo é que o telemóvel roubado apareceria entretanto, mas o mal... esse já estava feito.
O CASO QUE NÃO TEM FIM
No início de 2021 outro caso. Desta vez envolvendo não só uma mulher mas também um homem. Zena Pacheco e André Abrantes viram vídeos seus, íntimos, gravados durante a sua estadia no 'Big Brother', divulgados pelas redes sociais. O casal, que tinha entrado em acordo com a produção para manter a sua vida sexual ativa, sem que alguma vez as imagens fossem divulgadas, viu-se traído por um colaborador da Endemol, a produtora que produz o reality show, da TVI que expôs parte desses vídeos.
Mais de ano e meio depois o caso continua na justiça. Quer Zena Pacheco quer André Abrantes levaram o caso a tribunal, pedindo o pagamento de 20 mil euros por danos morais. Zena recordou recentemente à 'TV Guia' ter, por causa destes traumatizantes acontecimentos, "entrado em depressão" e "nem saído de casa" durante vários meses. Garantia na mesma entrevista ter tido o apoio dos pais mas que tinha reagido "graças à ajuda do André".
O músico sentiu que ambos foram "traídos" e que tinham sido "muito prejudicados" por causa dos vídeos, após saírem da casa mais vigiada do País... especialmente porque os mesmos ainda hoje estes circulam livremente na Internet. "Por mais que uma pessoa queira, eles vão ficar lá... para sempre", disse na mais recente entrevista à 'TV Guia'. "Eles não vão desaparecer. Foi muito duro para a Zena. Foi muito duro para todos, mas especialmente para ela. Porque as mulheres pagam muito mais que isto do que os homens".
A VITÓRIA
Não é só cá que as estas coisas acontecem. Talvez o caso mais famoso tenha acontecido há 8 anos.
Em 2014 Jennifer Lawrence, Rihanna e Scarlet Johnason levaram a tribunal a Apple depois da cloud onde armazenavam as suas fotografias ter sido 'hackeada' por um informático que, depois, publicou diversas fotografias íntimas das atrizes. As estrelas Kirsten Dunst, e as cantoras Ariana Grande e Selena Gomez também agiram judicialmente contra a empresa americana que acabaria por apanhar o 'hacker' responsável pelo que foi chamado de 'Celebgate'.
Ryan Collins, terá acedido a 72 contas de Gmail e 50 de iCloud roubando conteúdo fotográfico e de vídeo de várias celebridades. Apanhado em 2016, o homem acabou condenado a uma pena de 18 meses estando depois proibido de entrar em contacto com as figuras públicas assim como de aceder a um computador por cinco anos - ou seja, neste momento já o pode fazer.
A REAÇÃO
Mas voltemos ao início... não ao filme 'Sliver', mas ao caso mais recente e mediático de violação de privacidade: Margarida Corceiro.
O silêncio foi quebrado pela jovem nas redes sociais esta quarta feita, 23 março depois de uma semana de silêncio. Num único post a jovem disse o que pensava sobre o que lhe tinha acontecido. "Voltar aqui depois de tudo o que se tem dito sobre mim e sobre a minha imagem, não é fácil. Mas cá estou. As redes têm o bom da partilha positiva e a fragilidade da partilha negativa. Que sirva de ponto final para outros casos e que vos ajude a perceber a gravidade da situação", começou por dizer.
"Quero que imaginem, quero que calcem os meus sapatos – meus e de todas as pessoas a quem isto já aconteceu. Imaginem estar tranquilos no vosso trabalho e encontrarem uma imagem, que dizem ser vossa, a circular pela Internet. Milhões de comentários especulativos, milhares de mensagens, telefonemas sem parar e, o mais difícil, verem todos os vossos amigos e família a ter de lidar com tudo o que vai saindo sobre vocês, sem poderem fazer nada. Imaginem sair à rua e terem a sensação de que estão todos a olhar para vocês (...) ser tendência numa rede social, por motivos completamente alheios à vossa vontade", afirmou.
E explicou como agiu. E agradeceu à família pelo suporte que lhe foi dado. "Eu tenho a sorte de ter uma estrutura familiar coesa, amigos presentes e profissionais que me acompanham e ajudam a lidar com a situação. Mas há centenas de pessoas que não têm", relembrou mostrando que apesar dela ser figura pública muitos anónimos passam por situações semelhantes á sua. "Garanto-vos que não me ri com as mensagens que recebi de pessoas com histórias semelhantes e que, por isso, só queriam desaparecer e pôr termo à vida.Não me ri com histórias de pessoas que acabaram mesmo por fazê-lo por verem a sua intimidade completamente violada e repartilhada, vezes e vezes sem conta, recordo, tudo porque alguém decidiu fazer uma partilha", revelou.
No mesmo post afirmou que tinha fica apenas triste por perceber que apesar de muita gente ter percebido a dor que a partilha daquelas imagens - onde alegadamente surge - provoca, não resistiram a partilhar com amigos. "Garanto-vos que deste lado fiquei muito surpreendida, pela negativa, por saber que dar corpo a um monstro está nas nossas mãos e que, muitos, escolhem alimentá-lo e continuar a corrente, sem nunca pensar no impacto que pode estar a ter na vida de alguém. Que esta minha partilha ajude a refletir sobre este tema e que permita que as centenas de pessoas a quem isto já aconteceu, sobretudo mulheres, possam ser percebidas e não julgadas. E, lembrem-se, agora foi comigo, amanhã pode ser convosco ou com alguém que vos é muito próximo", concluiu.
Resta saber se o público aprendeu... ou se 'Sliver', foi só mesmo o início do que foi a invasão de privacidade!