Quando o primeiro volume das 'Crónicas do Fogo e do Gelo' foi editado, em 1996, teve uma receção discreta e não o sucesso de vendas que os seus editores esperavam. O mundo medieval criado pelo norte-americano George RR Martin passou mais ou menos despercebido à nascença mas rapidamente se foi tornando um fenómeno global. Inspirado por escritores tão diferentes como JRR Tolkien (criador do universo do 'Senhor dos Anéis') e Stan Lee ("pai" da maioria das personagens Marvel, do Homem-Aranha ao Quarteto Fantástico, entre muitas outras) e por acontecimentos históricos como 'A Guerra das Rosas' (uma série de guerras civis pelo trono inglês), Martin foi tão bem sucedido que acabou, de certa forma ultrapassado, pela sua própria criação.
Ao fim de oito temporadas e 73 episódios, de 2011 a 2019, 'A Guerra dos Tronos' tornou-se na mais vista (segundo o site IMDB) e comentada série da história da televisão, popularizando personagens e expressões na cultura global, isto apesar de um final que deixou muitos dos seus fãs descontentes – a lentidão na escrita dos livros pelo autor (ainda lhe falta escrever dois volumes, sendo que o quinto e último editado saiu em 2011...) levou a que as temporadas finais já não fossem baseadas na obra incompleta e se afastassem das ideias iniciais de Martin. Este pretendia que a série tivesse dez temporadas e foi sendo afastado aos poucos durante as últimas quatro. "Não fiquei zangado, nem nada disso. Percebo que os atores quisessem procurar os outros papéis ao fim de sete ou oito anos de contrato mas ficou alguma melancolia em mim", confessou.
É por isso com muita expetativa que se espera a estreia do primeiro spin-off, 'The House of the Dragon', nesta segunda-feira 22 de agosto, na HBO Max, que voltará a ter a contribuição de Martin. Com a ação situada 200 anos antes dos acontecimentos de 'A Guerra dos Tronos', a nova série – cuja primeira temporada terá dez episódios, o primeiro deles chamado 'Os Herdeiros do Dragão' – vai desenvolver-se em redor da queda do império da Casa Targaryen (uma das nove dos sete reinos) e dos acontecimentos que antecederam e levaram à guerra da sucessão que resultou na denominada "Dança dos Dragões". Tudo baseado na segunda parte da primeiro livro da novela 'Fogo e Sangue', que George RR Martin editou em 2018, o que exigiu o regresso do linguista David J. Patterson para criar mais palavras em alto valiriano, a língua falada pelos Targaryens – na internet, é possível aos fãs mais fervorosos encontrarem dicionários para enriquecerem o vocabulário (que em 2013 já consistia em 667 palavras). Quem viu 'A Guerra dos Tronos' vai agora perceber como a inocente Daenerys Targeryan (interpretada por Emilia Clarke) foi obrigada a partir do zero, através de um casamento gizado pelo irmão com o gigante bruto Khal Drogo (Jason Momoa) de modo a conseguir o apoio do exército Dohtraki para tentar reconquistar o Trono de Ferro.
SEXO, NUDEZ, VIOLÊNCIA É pois de esperar uma nova dose brutal de violência, sangue, nudez e, claro, muito sexo
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De qualquer forma, a produtora executiva Sara Hess assegurou que, desta feita, esse tipo de cenas não vão retratar graficamente atos de violência sexual, como sucedia frequentemente em 'A Guerra dos Tronos' - para a história ficou a sequência em que Sansa Stark é violada pelo marido na noite do casamento (quinta temporada), com a atriz Sophie Turner, então com 19 anos, a confessar o trauma que constituiu filmar o acontecimento e muitas queixas de espectadores indignados. "Vamos apenas mostrar as consequências e o impacto na vítima e na mãe do abusador. O que a nossa série faz, e tenho orgulho nisso, é focar-se na violência contra a mulher que está inerente a qualquer sistema patriarcal", referiu Hess à Vanity Fair. O INGREDIENTE EXTRA: OS CENÁRIOS FILMADOS EM PORTUGAL
Já para o espectador português, este spin-off vai ter um ingrediente especial, o facto de Portugal ter entrado no roteiro de localizações da produção. A escolha recaíu em Monsanto, considerada a "aldeia mais portuguesa de Portugal", onde as filmagens decorreram entre outubro e novembro do ano passado na zona do castelo. Vai ser preciso esperar ainda um bom bocado para ver essas cenas, que só devem aparecer no oitavo e nono episódio da temporada, mas parece certo que a paisagem local vai continuar a ser opção. Sofia Noronha, da Sagesse Productions, contou à Lusa como tudo se passou e dá como certo um regresso: "Já tinham filmado em Espanha [na região de Cáceres] e tiveram curiosidade de fazer uma visita técnica a Portugal para explorarem sítios. Encontraram vários mas aquele que lhes ficou mesmo, pelo qual se apaixonaram, foi Monsanto."
Diga-se de passagem que a visibilidade do local vai, provavelmentem atrair muitos turistas à zona, isto apesar dos avisos que já surgem na imprensa quanto à reduzida capacidade hoteleira existente por ali. Foi assim com todas as localizações, como sucedeu na Irlanda do Norte, onde há tours para se visitar as paisagens emblemáticas que fizeram parte da série – algo que constituiu para o primeiro-ministro um dos maiores golpes publicitários da história para o país. Diga-se que este tipo específico de turismo, relacionado com produções audiovisuais, representou um valor de quase 900 milhões de libras em 2019 no Reino Unido, segundo o British Film Institut. Também a Islândia, a cidade croata de Dubrovnik e Ouarzazate, em Marrocos, viram as reservas hoteleiras crescer exponencialmente graças à série.
Que comece então a luta pelo Trono de Ferro, em Westeros! E, como "o homem que dá a sentença deve brandir a espada", nada como gritar "Valar Morghulis". A queda chegará mas Daenerys Targeryan, "Mãe dos Dragões", acabará por recuperar o poder da sua Casa. Assim se consiga acompanhar o desfile das incontáveis personagens que seguramente farão parte desta nova caminhada.
