Hoje, com 66 anos de idade, Manuela Marle, que saltou para a ribalta com a sua Cristina, na primeira novela portuguesa, 'Vila Faia', em 1982, na RTP1, decidiu revelar uma história deliciosa, na 'TV Guia' desta semana, a propósito de como tudo nasceu. Nicolau Breyner, claro, Jô Soares e os pais são os protagonistas.
"Foi há 40 anos! Como o tempo voa! Meses antes da 'Vila Faia', eu estava no Brasil e, na véspera de regressar a Portugal, fui abordada por Jô Soares, num dos seus espetáculos. Ao perceber que era portuguesa, incumbiu-me de uma missão – entregar uma carta importantíssima, lacrada, ao Nicolau Breyner, num prazo máximo de cinco dias. Lá vim com a carta na mão, com medo de que se extraviasse no avião. Assim que cheguei, pedi ajuda a uma amiga para encontrar o Nicolau. Acabei na Edimpim, sem saber bem onde estava, na altura em que decorriam os castings para a nossa primeira novela. Fiquei lá até às oito da noite, à espera que terminassem, para poder entregar a carta. Assim que entrei, o Nicolau disse-me: 'Já sei, mas a carta agora não interessa nada. Está entregue. Coloque-a em cima da mesa e diga o texto.'
Surpreendida, entrei em pânico e retorqui: 'Não faço. Não sou atriz. Quero ir embora.' Na altura, eu era mesmo teimosa e foi uma guerra. Mas ele insistiu e convenceu-me com uma simples pergunta: 'Acha que tem alguma hipótese?' Claro que já sabia o texto, porque tinha ajudado a minha amiga a preparar-se para o casting, mas… Ele, já cansado, ditou: 'Faça o teste, despache-se e não me chateie, que não tenho tempo a perder.' Acabei por ceder, até que ele deixa de seguir o texto e sou obrigada a improvisar. Achei que era imenso. Fartei-me, levantei-me, bati com a mão na mesa e disse: 'Estou farta disto e vou-me embora.' E o Nicolau exclamou: 'Corta! Agora já pode ir.'
E pronto, lá fui à minha vida e não mais pensei naquilo. Duas semanas depois, chama-me, volta a testar-me e já não me deixou sair sem assinar o contrato para interpretar a Cristina, de 'Vila Faia'. Caiu-me no colo, mas nada acontece por acaso. Na verdade, o Nico obrigou-me a aceitar. E ainda bem!
Contudo, a derradeira peripécia dá-se no dia da estreia. Os meus pais não sabiam até lerem o 'Diário de Notícias' dessa manhã. Sim, eu vinha na primeira página e dizia assim, em letras garrafais: 'Futura Sónia Braga portuguesa estreia-se hoje à noite.' Na altura, via-se 'Gabriela Cravo e Canela' na televisão, com a sensualíssima Sónia Braga, que andava mais despida do que vestida na novela. Imaginam a reação da minha mãe?! Educada num colégio de freiras e no seio de uma família superconservadora, foi um choque! Assim que cheguei a casa dos meus pais, mostraram o jornal e perguntaram-me:
'O que é isto?!' Não tinha saída. Contei-lhes que ia fazer uma novela. 'Como a Sónia Braga?! Ela anda nua, filha', interrompeu a minha mãe. Tentei acalmá-la e reforcei: 'Vou fazer uma novela. Não um filme pornográfico. Logo à noite a mãe vai ver.' E ao terceiro ou quarto dia já estavam rendidos."