
Poucas semanas antes de deixar o cargo em Lisboa, Robert A. Sherman recebeu-nos na residêncial oficial do embaixador norte-americano em Lisboa, para uma entrevista onde falou da paixão por Portugal, da relação entre os dois países, de Donald Trump e ainda de Barack Obama.
Depois de ultrapassadas as questões de segurança para aceder ao interior da residência oficial do embaixador norte-americano em Lisboa, somos surpreendidos com uma simpatia e simplicidade desarmantes.
O casal Robert A. Sherman e Kim Sawyer posam com uma descontração pouco habitual nos meandros diplomáticos, por vezes demasiado formais. "Só assim faz sentido fazer política", refere o antigo embaixador dos EUA em Portugal.
Sherman descobriu parte de Portugal e dos portugueses aos comandos de uma Harley Davidson. Com 60 anos de idade, foi a primeira vez que andou de mota. Natural de Boston, advogado de sucesso – defendeu o caso ‘Spotlight’ – e casado com uma empresária bem sucedida, pai de dois filhos adultos – um rapaz e uma rapariga – a viverem nos EUA, apaixonou-se por Portugal, onde voltará sempre.
Natural de Boston, advogado de sucesso – defendeu o caso ‘Spotlight’ – e casado com uma empresária bem sucedida, pai de dois filhos adultos – um rapaz e uma rapariga – a viverem nos EUA, apaixonou-se por Portugal, onde voltará sempre.
Porquê a escolha de Portugal para o cargo de embaixador?
Este era um cargo que precisava funcionar para os dois. Queríamos um país onde pudéssemos fazer a diferença, e sabíamos que Portugal tinha muitas coisas boas que precisam de ser descobertas pelos Estados Unidos. Muitas das qualidades portuguesas como o empreendedorismo, inovação, tecnologia ou a parceria militar com os Estados Unidos podem ser trabalhadas por nós. Queríamos fazer a diferença e foi isso que nos fez escolher Portugal.
É habitual o povo norte-americano conhecer mal Portugal e os portugueses. O país foi uma surpresa para vós?
Robert A. Sherman – Acabou por ser uma surpresa. Não estávamos à espera da energia vibrante que existe, especialmente entre os mais novos, a criatividade e inovação que saem das universidades portuguesas, de norte a sul do país. Portugal é um grande embrião de ‘start ups’, desde Braga, passando por Lisboa, e por aí fora. Fomos surpreendidos pela forma como Portugal está posicionado para enfrentar a economia moderna do século XXI.
KimSawyer – Para além de tudo isso, fiquei muito surpreendida pela qualidade dos vinhos e dos queijos portugueses. Sem dúvida os melhores queijos e vinhos que alguma vez provámos. Já não compramos vinhos nem queijos franceses, porque descobrimos os portugueses. O azeite, o peixe fresco, os produtos aqui são incríveis. Os sapatos que calço (não os que trago hoje), os designers, como Luís Onofre ou Os Storytailors, que desenham roupa para mim. O que se produz neste país é incrível.
PORTUGAL É SINÓNIMO DE LUXO
E nada disso é conhecido ainda nos Estados Unidos?
RAS – Portugal continua a ser visto como um país de pescadores e de mulheres de lenço na cabeça a caminho da igreja. Não pode estar mais longe da realidade. Tem havido uma grande mudança desde que aqui chegámos. Os Estados Unidos estão a descobrir Portugal, da mesma forma que Portugal descobriu mundos novos há séculos.
KS – Desde que aqui cheguei que percebi que Portugal e Luxo são sinónimos. Tal como o Bob (Robert) disse, é preciso dar a conhecer isso ao resto do mundo. Uma das coisas que o Bob e eu descobrimos quando cá chegámos é que uma das qualidades do país é a humildade das pessoas mas, ao mesmo tempo, grande parte da culpa do mundo não conhecer as qualidades do país é essa mesma humildade.
PELO ALENTEJO DE HARLEY DAVIDSON
O embaixador Robert A. Sherman tem uma forma de estar na política muito próxima das pessoas. De alguma forma faz lembrar o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Estar junto das pessoas é a forma correta de fazer política?
Primeiro que tudo, agradeço a comparação ao Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Sinto-me lisonjeado ao ser mencionado na mesma frase que ele. Considero-o um líder extraordinário e uma voz muito importante dentro da Europa neste momento particular. Só é possível empenharmo-nos como embaixadores se nos empenharmos com as pessoas. Se nos concentrarmos apenas nas relações com os governos perdemos o que é realmente importante. Concluí que a melhor forma de conhecer o país e o seu povo era pegar numa Harley Davidson e conduzir estradas fora com a Kim [Sawyer] na parte de trás.
Imagino que tenho sido um problema para os serviços de segurança?
Foi um desafio. O meu chefe de segurança não estava bem a ver no que se estava a meter (risos).E eu nunca tinha conduzido uma Harley, aliás nunca tinha conduzido uma mota antes de chegar a Portugal. Foi uma surpresa também para mim. Com 60 anos de idade, achei que a melhor forma de promover um acordo comercial entre Portugal e os Estados Unidos não era através de conferências – que considero ineficazes –, mas antes através de uma forma mais eficaz e mais visível para os projetos a desenvolver. Então decidi pegar numa Harley Davidson e conduzi-la através do Alentejo.
Qual é a sua maior conquista enquanto embaixador em Portugal?
Aquilo que nos estabelecemos fazer, e conseguimos, foi encontrar as áreas de excelência que existem em Portugal e ligá-las com os interesses norte-americanos, seja na área militar com a Força Aérea portuguesa e fuzileiros, seja no setor económico com a inovação. O programa que iniciámos em conjunto, uma ideia da Kim [Sawyer], ‘Ligando o Sucesso’, será o nosso legado porque faz a ligação de todos esses setores, e vai ajudar mulheres empreendedoras em Portugal a alcançarem o sucesso. Queremos levar este projeto aos países africanos de língua portuguesa. A ligação das indústrias de biotecnologia aqui em Portugal e as existentes nos EUA irá continuar. Os novos proprietários da TAP, com forte ligação aos EUA, e o plano de criar dez novas rotas para os Estados Unidos, vão trazer mais turistas norte-americanos, mais investidores, mais negócios, mais estudantes. Ou seja vamos ver a continuação daquilo que começámos aqui depois de deixarmos o cargo.
Ou seja, a ligação e a cooperação entre os Estados Unidos e Portugal não será afetada com a nova administração de Donald Trump? O trabalho irá continuar. A relação entre os Estados Unidos e Portugal continuará forte, não acho que seja afetada com o novo pre
CAMPANHA AO LADO DE BARACK OBAMAGostaria de ter visto mais política e menos ataques pessoais durante a campanha presidencial entre Hillary Clinton e Donald Trump?
Penso que o caminho e a linguagem utilizados durante a campanha foram infelizes. A argumentação esteve abaixo da dignidade do cargo para o qual ambos os candidatos se estavam a candidatar. Mas assim que a campanha terminou, virou-se uma página no caminho da governação. Se Donald Trump, tal como disse durante a campanha, estiver empenhado em fazer uma América forte, isso será bom não só para os Estados Unidos mas também para a Europa e para o mundo.
Como foi fazer a campanha com Barack Obama e, posteriormente, fazer parte da administração Obama como Embaixador?
Foi uma grande honra, não só ter sido escolhido para trabalhar na campanha, como ter tido a oportunidade de servir como embaixador. Ambas as situações exigiram muito trabalho e uma dedicação completa. Durante a campanha, tive a oportunidade de interagir com o eleitorado norte-americano para explicar como o senador Obama era a pessoa certa para liderar os EUA numa altura difícil e de transformação. Fiquei muito honrado quando o presidente Obama me disse que ia nomear-me como embaixador em Portugal. Já conhecia a diáspora Portuguesa dos tempos da minha infância, conhecia os valores que são importantes para os Portugueses e queria vir para um país onde pudesse realmente ter impacto. Ser embaixador dos EUA em Portugal tem sido a experiência de uma vida.
De que forma, hoje, os EUA são um país diferente?
O Presidente Obama deixa um legado incrível, que inclui ter tirado o nosso país de uma enorme crise económica, ter traçado um novo rumo para a nossa relação com Cuba, ter alcançado um acordo histórico sobre as capacidades nucleares do Irão, ter promovido o empreendedorismo a nível global, e ter fortalecido as nossas relações bilaterais com aliados importantes como Portugal. Tenho muito orgulho de ter feito parte deste legado.
Quais são os planos para janeiro, no pós-mandato? Ainda não sabemos mas com a certeza de que será um regresso a Portugal. Posso garantir com toda a certeza que teremos Portugal nos nossos corações. Este não foi um trabalho de uma vida, este foi o trabalho de mil vidas.