
Depois de uma longa ausência da vida política, Pedro Passos Coelho voltou, na última segunda-feira, 26, à cena mediática para demonstrar o seu apoio firme ao líder da AD, Luís Montenegro. "Eu não venho cá criar desatenções, venho cá ajudar o PSD em campanha", disse quando todos os olhares convergiam para si no momento em que chegou à Escola de Hotelaria e Turismo do Algarve para participar num comício da Aliança Democrática.
A imagem do político, de 59 anos de idade, é praticamente a mesma a que os portugueses se habituaram: de estilo clássico, de óculos no nariz, ainda que agora de cabeça rapada, e um sorriso mais aberto, depois de nos últimos anos várias circunstâncias pessoais o terem apagado. No dedo, mantinha, como sempre, a aliança de casamento que continua a usar, mesmo depois da morte da mulher, Laura Ferreira, aos 54 anos, depois de uma longa e difícil batalha contra um tumor ósseo.
Não voltou a ter ninguém desde o fatídico ano de 2020, quando se despediu daquele que os amigos garantem ter sido o grande amor da sua vida. Foi em fevereiro, fez agora quatro anos. Por essa altura, e com o cancro espalhado, Laura há muito que tinha deixado os tratamentos, que já nada a podiam ajudar. Tinha passado o Natal em casa e Passos Coelho estava presente em todos os momentos, apoiando a mulher no seu final de vida. Já se dedicava, então, quase a tempo inteiro à família e, quem o conhece, assegura que as suas rotinas não se alteraram assim tanto desde essa época, muito por conta das mulheres que o rodeiam.
Pai de Joana e Catarina, filhas do primeiro casamento com Fátima Padinha, das Doce, o antigo primeiro-ministro acompanha firmemente a vida das mais velhas, mas tem em Júlia, da união com Laura, de 16 anos, a sua grande preocupação. Por isso, depois da partida de Laura, nunca mais colocou a profissão à frente da família. Aceitou o desafio de desempenhar o cargo de professor Catedrático, na Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, mas sempre com uma carga horária que lhe permitisse acompanhar Júlia nas rotinas escolares e levar a vida recatada que sempre fez questão de preservar.
Não mudou de casa. Continua a viver no mesmo apartamento, em Massamá, onde é frequentemente visto a passear o cão de família, Koda, e, ao longo dos últimos anos, esforçou-se por honrar a promessa que fez à mulher, pouco antes da sua morte: ficar longe dos grandes cargos políticos até a filha ser um pouco mais autónoma, o que na verdade é o que tem feito, desde que, em fevereiro de 2018, se despediu da liderança do PSD, dando, então, lugar a Rui Rio.
Nesta segunda-feira, abriu uma exceção para colocar a sua popularidade ao serviço de Montenegro. Uma sondagem realizada há cerca de um ano da Intercampus para o CM/CMTV e 'Jornal de Negócios' mostrava que Passos era o nome mais popular para candidato à Presidência da República (com 15,8%, à frente de Guterres, Costa e Gouveia e Melo).
Sempre rejeitou, no entanto, voltar à cena política, justificando que isso causava uma distração mediática. "Cada vez que apareço isso põe as pessoas a olhar para o passado e não para o futuro. Não quero de todo alimentar isso ou desviar a atenção do presente", fez saber, apesar de na aparição na campanha da AD, em Faro, ter dado o 'peito às balas' em nome dos ideais em que acredita. E a sua intervenção foi, em tudo, polémica. No púlpito, recordou a afirmação que fez em 2016, na festa do Pontal, no Algarve.
Declarações que estão a marcar a campanha eleitoral para as legislativas , com todos os partidos a aproveitarem a aparição de Passos Coelho, seja como arma de arremesso a Luís Montenegro ou como reforço na posição da aliança partidárias entre o PSD, o CDS e o PPM.
O LONGO E PENOSO CICLO DE DISSABORES DE PASSOS
Pedro Passos Coelho está hoje mais sereno, conformado, mas sem esquecer a dor que tem pautado a sua vida ao longo dos últimos anos. Numa reportagem feita pela revista 'Sábado' há cerca de um ano, os amigos garantiam que ele não se isolou depois dos infortúnios da vida, mas colocou, mais do que nunca, os olhos na família, até porque é aí que se sente bem.
Os desgostos aconteceram uns atrás dos outros e colocam em dúvida os dizeres populares que afirmam que um azar não bate sempre à mesma porta. No caso de Pedro Passos Coelho, a sua não parou de tocar. A mulher foi o mais duro embate e aquele de que dificilmente vai recuperar. Em 2015, a família susteve a respiração quando a fisioterapeuta foi diagnosticada com um tumor ósseo num dos joelhos. Na altura, o político estava no final do seu mandato como primeiro-ministro e, apesar de ter continuado na cena política, declarou guerra à doença com a mulher. Foram juntos a praticamente todas as consultas, tratamentos e, quando eram fotografados lado a lado, numa altura em que Laura já não tinha cabelo, Passos apertava-lhe a mão, enquanto ela sorria.
Foi neste espírito de união que celebraram os recuos da doença, mas também que enfrentaram o cenário cada vez mais dramático traçado pelos médicos que acompanhavam Laura no IPO, quando as metástases não davam tréguas, e que culminou com a sua morte, em 2020. Aconteceu um ano depois de Pedro Passos Coelho ter perdido o pai e a paz tardaria a chegar. Apenas oito meses depois de ter ficado sem a companheira, Passos Coelho deparou-se com a notícia da morte do irmão mais velho, Miguel, que tinha paralisia cerebral desde criança e faleceu no hospital onde estava internado, vítima de uma infeção. Dois anos mais tarde, perderia também a mãe.
Num ano negro que parecia não ter fim, o antigo político viu ainda a irmã ser diagnosticada com um cancro, assim como a antiga companheira, Fátima Padinha, que também continuava a braços com a doença. No meio deste cenário e com uma filha menor a seu encargo, era também o cuidador dos sogros.
No ano em que questionou se era possível suportar mais sofrimento, desceu ao fundo, mas, de acordo com os mais próximos, nunca se desviou do foco: a filha mais nova, que tinha sido privada da mãe em tão tenra idade e dependia inteiramente de si. Afastou-se da política, dedicou-se à família e honrou a promessa que fez a Laura. Agora com a filha já mais crescida, posiciona-se ao lado de Luís Montenegro e surge como uma espécie de cavaleiro branco para a AD, que pode agitar e baralhar as contas nesta campanha eleitoral. Para o bem ou para o mal.