
Não foi assim há tanto tempo que a vida de Nininho Vaz Maia (Avelino é o nome de batismo) mudou. A história é amplamente conhecida, mas vale a pena ser recordada. Há 11 anos, ele estava a cumprir pena com pulseira eletrónica em casa, depois de se ter envolvido em desacatos, quando, para espurgar a dor e matar o tédio, se agarrou à guitarra e começou a cantar. Os vídeos, divulgados nas redes sociais, e se tornariam virais, acabariam por ser uma porta aberta para o mundo que lhe mudaria a vida: o da músico.
Nascido na Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa, Nininho cresceu no bairro da Picheleira, em Lisboa, onde cedo começaria a ver coisas normalmente vetadas aos olhos de uma criança. Aos 16 anos, já não estudava, tendo começado a trabalhar, mas foi muito antes disso que se apercebeu que a realidade podia ser muito dolorosa e difícil, principalmente quando, aos 10 anos, viu o pai ser preso, literalmente. Estava presente quando isso aconteceu e, por mais que se esforce, há memórias que não consegue tirar da cabeça. "O mais duro era o nosso pilar ir preso, neste caso o meu pai. Tinha 10 ou 11 anos e vi-me sem o meu pai. Vi o meu pai ser preso e em tribunal lembro-me de correr atrás da carrinha. Gritei pelo nome dele... É a vida, é a vida, é assim que se calhar eu alivio, a repetir esta frase", disse em entrevista ao 'Alta Definição', da SIC.
Nos anos seguintes, a sua realidade passaria a incluir visitas à cadeia para ver o pai, enquanto a mãe se desdobrava em casa para garantir que nada lhe faltava e aos seus irmãos. O passado foi duro o suficiente para que hoje não o queira repetir, ainda que, volvidos tantos anos, as notícias desta terça-feira, dia 6, o coloquem como arguido num processo de branqueamento e tráfico, com rusgas a terem sido feitas à sua casa. É como que um assombro de um passado que prometeu não seguir. "Estou muito focado em ser um exemplo para os meus filhos. Assisti a coisas que não quero que eles assistam, vi pessoas mortas, caídas porque assim foi a vida que escolheram. Fiquei mais frio ao ver partir muita gente que eu amo, família", afirmaria.
Por ser oriundo de um bairro carenciado e de uma família de etnia cigana, diz que sempre se teve de esforçar o dobro para provar o seu lugar no mundo, que tinha talento e, tantas outras vezes, não se achou merecedor de toda a atenção que recebia. Tiveram de passar muitos anos para que Nininho se acostumasse à ideia de que, sim, o seu sucesso era merecido. "No meu bairro não se falava em sucesso, não acreditávamos que era para nós, era muito difícil chegarmos lá. O futuro era incerto", diz, quem sempre, no entanto, acreditou, ter uma espécie de estrelinha a guiá-lo. "Para mim não há outra forma de ver as coisas. Acredito que há algo alguém que me protege, pelos riscos que corri quando não era tão maduro. Fui protegido e sou um abençoado."
A BÊNÇÃO DO AMOR DE TRIANA
Nininho Vaz Maia, de 37 anos, é pai de três filhos, sendo que a estreia aconteceu quando tinha apenas 19 anos. Hoje, é um pai orgulhoso, presente e dedicado para todos, mas à distância admite que quando o primeiro filho nasceu não estava preparado para o desafio que lhe cairia nos braços.
Já numa idade mais avançada, acabaria por conhecer a mulher que lhe abriria portas a um novo entendimento da vida sentimental, Triana Marin, com quem está junto no amor e nos negócios. "Quando nos conhecemos, ela disse-me: 'Tu não sabes ser feliz'. E era verdade", assume, reconhecendo que desde então fez um esforço por deixar para trás a pesada carapaça de vivências do bairro.
Quando o terceiro filho nasceu, acabaria por compensar com ele o pai que não tinha sido para os primeiros e hoje não podia estar mais orgulhoso da prole que construiu e a quem pôde proporcionar uma vida diferente.
O percurso de Nininho foi, para muitos, considerado inspirador. Cantor de sucesso, tornou-se mentor em programas de talentos e incentivou muitos jovens a saírem das amarras do estigma. No entanto, este volta a recair sobre si no momento em que é constituído arguido num processo, cujos contornos só agora começam a ser conhecidos, e que, no limite, pode representar um volte face na carreira do artista.