Que se faça Justiça! Tony Carreira aguardam por decisão final para poderem começar o luto da filha Sara
O ano que agora se encerra foi de dor profunda para Tony e Fernanda, que em tribunal foram obrigados a reviver os testemunhos do dia mais fatídico das suas vidas. Foi um ano de perdão, de mágoa e agora segue-se o processo de luto.
Sara Carreira morreu há três anos e se o tempo não acalma a dor para esta família destroçoada, 2023 foi um ano particularmente penoso para os Carreira. Atiçou a revolta, fê-los regressar a fundo ao dia fatídico que mudaria as suas vidas para sempre. Em tribunal, Tony Carreira e Fernanda Antunes ouviram aquilo que nenhum pai e mãe deviam, reviveram as horas de dor e, longe de isso lhes trazer tranquilidade, respostas, magoou-os ainda mais. "Não há esperança para a última audiência, não há nada. Não estou à espera de nenhuma resposta. Aquilo que disse mantenho e não há nada a acrescentar", disse Tony Carreira recentemente à revista 'Vidas', não acreditando que se faça justiça na Leitura da Sentença, marcada para dia 12 de janeiro.
Até lá, segue-se uma altura particularmente difícil para Tony e para a família, que se prepara para mais um Natal duro, uma data que deixaram de celebrar desde a partida prematura de Sara, aos 21 anos, num fatídico acidente de automóvel, e que agora se assume penosa e de recordações difíceis.
"Se havia um dia do ano que para mim era sagrado, era o Natal. Infelizmente, eu deixei de ter Natal", afirmou.
Apesar dos dias difíceis e da falta de confiança na Justiça portuguesa, a verdade é que, de alguma forma, o desfecho do processo significa que Tony e Fernanda poderão iniciar o processo de luto, que nunca foi concluído por causa da ausência de respostas às muitas perguntas sobre o dia 5 de dezembro.
Em tribunal, ouviram algumas, difíceis de digerir, pela voz dos vários arguidos no processo, com quem pouco ou nada contactaram nos meses que se seguiram à morte de Sara.
"Só peço humanidade. Não quero vinganças, não quero que vão para a cadeia. Quero que se ponham no meu lugar", afirmou Tony após uma das primeiras audiências em tribunal lamentando o facto de os arguidos não terem procurado a família para uma coisa tão simples como um pedido de desculpa.
"Quando isto acabar quero que sigam a sua vida. Não estarei em sede de recurso novamente aqui. Não há nada que possa fazer para que a minha filha volta, mas procurava a verdade. E não a tenho, porque preferiram as estratégias de advogados. O 'não me lembro'", acrescentou, referindo-se ao testemunho de Cristina Branco, que garante ter uma amnésia temporal desde o momento em que embateu no carro de Paulo Neves e ficou parada no meio da via, originando a sequência de acidentes qu se seguiram.
O DRAMÁTICO RELATO EM TRIBUNAL
O dia 5 de dezembro de 2020 fica gravado de forma dramática na história da família Carreira. Até aí eram felizes, com problemas comuns, e não imaginariam como um telefonema alteraria a sua vida por completo. A mais nova do clã, Sara, de apenas 21 anos, regressava do Porto, onde tinha ido buscar a roupa da sua marca. Estávamos em confinamento e o tempo aconselhava prudência na condução: havia nevoeiro e uma chuva traiçoeira que não parava de cair, ao mesmo tempo que escurecia já muito, fruto do horário de inverno.
Em tribunal, os arguidos Cristina Branco, Ivo Lucas, Paulo Neves e Tiago Pacheco regressaram à sucessão trágica acontecimentos, que começam com o arguido Paulo Neves que seguia na A1 a uma velocidade abaixo da lei, em torno dos 30 km/h, de acordo com as perícias e alcoolizado.
É neste carro, que seguia então em marcha lenta e sem sinalização, que a fadista Cristina Branco viria a embater, desencadeando toda a sequência dos acontecimentos. "Tenho um lapso temporal. A minha memória imediatamente a seguir de sair da portagem é de pôr a mão no peito da minha filha e de travar e avisar: vamos bater", reiterou em tribunal.
A cantora deixou o carro imobilizado no meio da A1 e foi para a berma com a filha, onde acionou os meios de socorro, altura em que o carro conduzido por Ivo Lucas viria a embater contra o seu.
"Eu estava ao telefone com o 112, abraçada à minha filha, foi a minha filha que viu esse momento e não eu. A minha filha começa a gritar e eu olho e vejo um carro a sobrevoar as nossas cabeças".
O relato da colega Cristina Branco deixou Tony Carreira visivelmente perturbado e até hoje o cantor não perdoa aquilo que considera uma estratégia de "amnésia" elaborada pelos advogados e que nada honra a memória da filha.
O MOMENTO MAIS DOLOROSO
Se os principais arguidos acabaram por alegar lapsos de memória para não detalharem em tribunal o que aconteceu, Marco Baptista e a namorada, a veterinária Margarida Costa, que foram as primeiras pessoas a chegar ao pé de Sara, já sem vida, no jipe acidentado, recordaram, toldados pela emoção, esses momentos que jamais irão esquecer.
Margarida Costa e o namorado estavam a regressar de uma viagem à Serra da Estrela quando se depararam com os acidentes, que conseguiram contornar, parando o carro na berma para prestar auxílio. É quando a veterinária se aparecebe da presença de Ivo Lucas, em tronco nu, a deambular completamente desorientado.
"O rapaz estava muito desorientado a chamar pela namorada. Eu disse que vou ajudar, não levei o telemóvel, estava muito escuro, olhei para dentro do carro, não estava nada, e continuei à procura no meio dos destroços. Eu quando estacionei o Ivo estava mais perto da berma, estava muito desorientado", recordou a testemunha, que se depara então com Sara Carreira no interior do jipe. "O meu instinto foi espreitar para dentro do carro e não a vi, quando fui ver mais perto é que vi. Foi nessa altura que chegou um senhor que era bombeiro e o meu namorado, o bombeiro estava ao telefone com o 112 e eu estava a descrever a vítima. Fui logo ver se tinha pulso e não tinha. O senhor ao telefone estava a receber instruções e nós fazíamos conforme ele nos dizia. Ela estava muito presa ao cinto, não conseguíamos ver muito mais. Eu estava a tentar ver na carótida se tinha pulso, mas o corpo já estava frio".
Nessa altura, Margarida e o bombeiro recebiam indicações por parte dos meios de socorro, com quem estavam ao telemóvel, para cortar o cinto de segurança de Sara e colocar o seu corpo numa posição lateral de segurança.
"Vimos novamente o pulso e depois cortámos a camisola o suficiente para chegar ao pescoço para ver se tinha pulso, e não tinha. Ficamos lá ao pé dela, até alguém dizer algo em contrário e até chegar auxílio", descreve a médica.
Este foi talvez um dos momentos mais difíceis de ouvir em tribunal, e que fez Fernanda deixar a audiência antes do final. De tudo o que levou à morte prematura de Sara, não consegue perdoar que Ivo Lucas não estivesse a seu lado no fatídico.
"O Ivo pediu-me desculpa, como é evidente, mas não se lembra de nada e não consegue explicar o último dia da minha filha. Não quero mal a ninguém. A única coisa que queria era que eles pedissem desculpa à minha filha e que lhe tivessem dado assistência, que estivessem perto dela. Era a única coisa que eu queria. Ninguém está a ter respeito pela minha filha. Abandonaram-na, deixaram-na. Para mim, acabaram com a minha vida, mas o que é que posso fazer?", lamentou uma mãe destroçada.
Agora, os Carreira aguardam pelo início do ano para que o julgamento chegue ao fim para, de alguma forma, poderem começar a fazer o doloroso luto da filha.