O crime está a chocar a América e particularmente Portugal, de onde Cláudio Valente e Nuno Loureiro eram naturais. Na última quinta-feira, dia 18, as autoridades norte-americanas encontraram o corpo do atirador português num armazém em New Hampshire, dias depois de este ter, alegadamente, matado dois estudantes e ferir outros nove na Universidade de Brown, onde esteve a tirar uma pós-graduação durante em 2000. Aconteceu no sábado, 13, esteve fugido durante dois dias e na segunda-feira seguinte acabaria por atirar contra Loureiro à porta de casa deste. O físico, considerado uma mente brilhante, ainda foi levado para o hospital, mas acabaria por falecer no dia seguinte, a mesma data em que Cláudio Valente, que se escondera desde o crime, colocaria fim à vida, com a autópsia a revelar que este já estaria morto há dois dias quando o seu corpo foi descoberto.
Um desfecho trágico para um crime onde ainda há muito por explicar, sendo que as questões são inúmeras. Porque razão disparou Cláudio Valente, de 48 anos, sobre os alunos de Brown e o que o levou a matar Nuno Loureiro, de quem tinha sido colega no curso de Engenharia Física Tecnológica, no Instituto Superior Técnico, em Lisboa?
As respostas são ainda escassas, mas parte delas começaram a ser escritas há 25 anos, quando os dois se cruzaram na universidade. Os testemunhos são agora muitos de colegas que recordam como tudo começou.
Cláudio Valente, natural do Entrocamento, e Nuno, de 47 anos, cruzaram-se no Técnico onde eram considerados dois pequenos génios da Física. No entanto, os seus percursos não podiam ser mais díspares e enquanto Loureiro teria um sucesso sem precedentes que o levaria a ser uma referência na área, Cláudio não concluiu o doutoramento, não passaria de uma promessa.
Os antigos professores indignam-se agora e quem privou com os dois fala de uma raiva contida da parte de Cláudio pelo sucesso do rival, que ele poderia ter alcançado e nunca teve. Filipe Moura, professor de Matemática no ISCTE, que foi assistente de Análise Matemática III no segundo ano de faculdade de Cláudio, recorda-se perfeitamente da personalidade do aluno. “Ele era conflituoso com os colegas. Achava-se mais inteligente do que os colegas e gostava de mostrar isso. Devia estar habituado a ser o melhor do secundário", escreveu numa publicação do Facebook, onde acrescenta que o homicida tinha a necessidade de sentir aprovação por parte dos seus pares. “O Cláudio evidentemente era um dos melhores, mas nas aulas tinha uma necessidade muito grande de se fazer notar e de mostrar que era melhor do que os outros. Em princípio gosta-se de dar aulas a bons alunos, mas a atitude do Cláudio era desagradável, envolvendo-se frequentemente em quezílias com colegas que ele não considerava tão brilhantes como ele (e que provavelmente não eram — mas eram seus colegas e tinham todo o direito de estarem ali). Eram quezílias totalmente desnecessárias, que não adiantavam nada à aula e que faz com que a recordação de dar aulas ao Cláudio nem seja das melhores.”
Depois da universidade, Cláudio seguiu para Brown, mas não terminou a formação a que se propôs sendo que Nuno continuaria o percurso primeiro em Londres, depois nos Estados Unidos. Já o homicida, regressaria mais tarde a Portugal, tendo trabalhado vários anos na Sapo, numa altura em que, de acordo com o 'The New York Times', cortaria relações com a família. “[Os pais] Estão devastados”, disse uma amiga, Mirita Domingues, à publicação. “A mãe dele disse esta manhã que se preocupava com que da próxima vez que ouvisse falar sobre ele, ele estivesse morto.”
Depois da passagem pela Sapo, de onde saiu por vontade própria, com colegas a descreverem-no como efetivamente brilhante, mas com poucas aptidões sociais, regressaria aos Estados Unidos em 2017, tendo conseguido o estatuto de residente permanente legal. Residia desde então em Miami, numa moradia, não era casado nem tinha filhos e algo que pode ajudar a compreender alguma premeditação no crime foi o facto de há apenas um mês ter deixado essa mesma residência para se mudar para Boston, onde é o principal suspeito dos crimes sobre os estudantes e Nuno Loureiro, sendo que as autoridades tentam agora escrutinar o passado e a relação entre os dois Físicos no sentido de tentar perceber o que motivou o homicídio.
“Todas as hipóteses podem estar em cima da mesa”, disse um ex-colega do Sapo ao 'Observador'. "Pode tratar-se de alguma competição académica por resolver, algum assunto inacabado que não conseguiu ultrapassar, ou de cair numa espiral descendente de ressentimentos em relação ao mundo académico. Decidiu atirar não só sobre o Nuno, mas também sobre o auditório da Universidade de Brown.”