Os cemitérios contam, na maioria das vezes, histórias tristes, acolhem lágrimas sofridas e devastação, mas seria redutor vê-los apenas dessa maneira. Poderiam ser também, se tivéssemos de lhe dar um título, os 'últimos românticos da história', aquele sítio onde para falarmos com alguém (que já cá não está) não podemos usar memes, stories e em que os smartphones de nada nos valem. É um local onde somos obrigados a parar e ser confrontado com as nossas mais doces ou duras memórias, onde nos permitimos chorar ou rir sem preocupações em pôr um filtro que nos deixe com melhor ar. E, acima de tudo, pode parecer contraditório, mas há mais vida lá do que alguma vez nos permitimos a pensar.
É este o ponto de partida do magnifico romance 'A Breve Vida das Flores', de Valerie Perrin, que nos leva a conhecer Violette Toussaint, uma mulher que, depois de muitas - e difíceis - voltas da vida vai trabalhar (e viver) num cemitério de Borgonha, em França, onde se ocupa de manter as campas bonitas, receber os que vão ali procurar consolo, respostas, alguma memória mais vivida de quem já cá não está.
Violette leva-nos, por isso, a conhecer outras personagens maravilhosas, faz-nos rir da própria morte, tira o peso associado aos cemitérios e mostra-nos que este também pode ser palco de coisas bonitas que acontecem por lá todos os dias. Com o passar do tempo, a mulher dá por si a tratar as campas por tu, em falar com os que aprendeu a conhecer através das memórias dos familiares que os visitam e a calar o que, mesmo depois da morte, é um segredo que não deve ser revelado.
Ao conhecer os que já partiram e conversar com os que ficaram, Violette leva-nos a viajar por histórias marcantes como a de Julien Seul, um chefe de polícia, que quer deixar as cinzas da mãe na campa de um desconhecido. Ao descobrir a história de amor entre os dois falecidos, a guardiã do cemitério acaba, ela própria, por permitir abrir uma janela que lhe permita descobrir o que aconteceu para justificar a maior perda da sua vida, que continua envolta em mistério.
O livro é comovente, tocante - preparem as lágrimas e os lenços - e faz-nos pensar, no fundo, sobre o quão breve é a vida (como a das flores) e em como há tanto que não conhecemos sobre as pessoas que estão ao nosso lado, os mundos aos quais não temos acesso, e nas mil histórias de vida que deixam a sua marca na terra, cada uma à sua maneira.
Como estamos a assinalar o Dia de Todos os Santos, o livro de Valerie Perrin é uma bonita forma de olharmos para os mortos e para honrarmos a vida, lembrando-nos de que só quando já cá não estivermos é que é tarde. Até lá...