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Mudar o molho do bife da cervejaria mais tradicional de Lisboa? É preciso coragem! Por isso nós fomos à Trindade experimentar

As obras demoraram mais de um ano e não é apenas o espaço que está diferente. A carta também sofreu alterações. O autor é Alexandre Silva, o aplaudido chef "estrelado" do Loco e do Fogo, que fez uma revolução num local centenário. Quisemos confirmar se valeu a pena.
Hélder Ramalho
Hélder Ramalho
28 de setembro de 2022 às 22:20
Cervejaria Trindade, Lisboa
Cervejaria Trindade, Lisboa Foto: David Cabral Santos/Sábado

Já reabriu a Trindade. A mais antiga cervejaria do País, com quase duzentos anos de história – nasceu em 1836 –, modernizou-se, está mais cosmopolita depois de 13 meses fechada para obras. Atenção que a nova arquitetura ‘clean’ da fachada pode surpreender os mais distraídos, como este incauto escriba que de passo apressado – porque atrasado para um almoço tardio – só reparou já ter ultrapassado o número 20C da Rua Nova da Trindade, quando estava a chegar ao Bairro do Avillez, um pouco mais abaixo – o aparato das obras que continua à porta do antigo Convento da Santíssima Trindade dos Frades Trinos também não ajudou.

Entremos pois sem mais demoras, porque é de extrema deselegância fazer esperar uma senhora. Portas dentro, apresentam-se duas salas, restauradas pelo projeto da arquiteta Ana Costa que devolveu ao espaço a grandiosidade e elegância de outros tempos. Logo à entrada a 'Petiscaria' a que se segue a mais sumptuosa 'Sala Maria Keil'. Paredes e tetos desbastados deram nova vida às abóbadas originais, ao espaço do claustro e aos detalhes das cantarias, agora recuperados. Os frescos, azulejos e obras de arte de Keil do Amaral brilham com luz renovada. No caso do ar condicionado estar regulado para a mesma temperatura da tarde da nossa visita, recomenda-se um agasalho leve.

Cervejaria Trindade, Lisboa
Cervejaria Trindade, Lisboa Foto: David Cabral Santos/Sábado

Já sentados à mesa, sejamos inequívocos nos pedidos. A tratar de nós tivemos um dos históricos da casa, um dos poucos que permanece após a renovação. A idade ainda é um posto, neste caso de bem servir e simpatia, com a cortesia descontraída na boa tradição das cervejarias. O que foge da tradição são os preços da nova carta, mais a pensar na avalanche turística que invade a capital por estes dias. Recuperemos então o foco à mesa.

Os clássicos croquetes de chambão de vitela para aconchegar o estômago, que já reclamava, abriram as hostilidades, acompanhados por uma imperial e uma Aurea, uma das cervejas artesanais da Trindade. Os croquetes estavam estaladiços por fora e cremosos por dentro, de bom tempero. Começa bem o chef Alexandre Silva, autor da nova carta.

Cervejaria Trindade, Lisboa
Cervejaria Trindade, Lisboa Foto: David Cabral Santos/Sábado

Para os mais distraídos, é igualmente o chef do Fogo e do Loco, premiado com Estrela Michelin. Ao fim de vários anos a tentar contratá-lo, o Grupo Portugália, proprietário da Trindade, conseguiu convencê-lo a embarcar nesta nova vida da "primeira cervejaria do País". Uma responsabilidade com peso, embora à frente da cozinha permaneça Domingos Rodas.

E para tomar o pulso a esta dictomia entre a modernidade e a tradição, o melhor é provar um histórico: o brás de bacalhau. O fiel amigo surge bem envolvido nos ovos, cozinhados no ponto, com a humidade correta. A novidade está na batata palha, a cobrir o preparado, para misturar na hora. Mais crocante ou mais embebida fica à vontade do freguês, literalmente.

Cervejaria Trindade, Lisboa
Cervejaria Trindade, Lisboa Foto: David Cabral Santos/Sábado

No entanto, os nossos sentidos estavam apontados para o momento que veio a seguir. Podemos chamar-lhe o momento alto da refeição, uma vez que iria ser degustado o bife do lombo à Trindade com o novo molho da autoria de Alexandre Silva. O molho será pois a "prova dos nove" do sucesso da nova carta. Há várias gerações de comensais, apreciadores do bom bife, cujo palato foi educado com o sabor do tradicional molho da Trindade. Alterar a receita é seguramente um risco calculado.

Ao primeiro olhar, apresenta-se mais escuro. Na degustação sente-se o travo amargo do caldo de carne e o sabor mais forte daquele que a memória guarda. Mas, como em tudo o que é novidade, entranha-se depois da estranheza e acaba por casar bem tanto com a carne como com as batatas fritas. O melhor ponto do bife é o "mal passado", pois claro.

Cervejaria Trindade, molho, bife do lombo
Cervejaria Trindade, molho, bife do lombo Foto: Cervejaria Trindade

Nas sobremesas, o nosso anfitrião sugeriu o arroz-doce queimado com compota de limão, com o ácido do citrino a cortar bem a doçura. Preferíamos que tivesse sido servido um pouco mais para o morno. Ficámos com pena de não conseguir aconchegar o toucinho do céu do convento de Santa Clara, um dos ex-líbris do receituário conventual, nem provar o pudim de cerveja preta, esse por já não haver para servir. Ressalve-se que já íamos para além do meio da tarde.

A Trindade continua a ser um dos locais obrigatórios de Lisboa. A remodelação não lhe roubou nem o carisma nem o ambiente de cervejaria e a carta, apesar de renovada com uma pitada de sofistificação, continua a servir-nos a comida de conforto a que nos habituámos... desde 1836.

Cervejaria Trindade, Lisboa, Francisco Carvalho Martins, Ana Costa, chef Alexandre Silva
Cervejaria Trindade, Lisboa, Francisco Carvalho Martins, Ana Costa, chef Alexandre Silva Foto: David Cabral Santos/Sábado

Cervejaria Trindade

Rua Nova da Trindade, 20C, Lisboa.

Tel.: 213423506.

Aberta de domingo a quinta-feira das 12h00 às 24h00. Sextas-feiras, sábados e vésperas de feriados, das 12h00 à 01h00.

Instagram da Cervejaria Trindade

Rua Nova da Trindade, 20C, Lisboa.

Tel.: 213423506.

Aberta de domingo a quinta-feira das 12h00 às 24h00. Sextas-feiras, sábados e vésperas de feriados, das 12h00 à 01h00.

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