
Voltei ao banco de jardim há uma semana, sem imaginar que voltaria a vê-lo, não naquele banco de jardim, mas num lugar ainda mais mágico, onde as borboletas se multiplicam no ar com golpes de magia. É um esconderijo claro e arrumado, longe da cidade e perto do mar. Nos dias de vento ouvem-se as ondas, embora a playlist seja tão boa que só me apetece fechar os olhos e deixar-me ir. Ele adivinha tudo o que gosto, como se há muito me conhecesse. A sua voz é tão certa que me acalma assim que oiço e os seus abraços são muito longos e muito perfeitos. Eu sei que não é comum ligar o advérbio muito com adjectivos tão fortes como perfeito ou maravilhoso, mas é isso mesmo que sinto. E quando ele me explica os caminhos do seu coração eu digo-lhe, estás muito certo, porque está mesmo.
No Brasil diz-se de um homem complicado que esse cara é todo errado. O meu rapaz da play-list é, por oposição, bastante certo, porque acerta muito. Ele acerta quando estou triste e sabe como me animar. Ele acerta nos beijos, nas mãos, com o corpo todo. Ele acerta quando me desmancha os argumentos ingénuos que atiro para o ar. E ainda acerta quando lhe peço uma opinião. Acerta no café forte que faz de manhã e nos iogurtes com morangos, cortados em pedaços, sempre do tamanho certo, suficientemente pequenos para não transbordarem da taça, mas não tão pequenos que não se possam trincar com prazer. Ele acerta porque me ouve. Quando eu falo, ele ouve tudo. E ouve as pausas, o riso, e adivinha nos desenhos que faço no ar com os meus braços de espantalho empolgado o que lhe quero mostrar. Ele adivinha no meu sorriso se preciso de um elogio, de um beliscão ou apenas de silêncio.
Os homens que conhecem bem as mulheres são aqueles que sabem cuidar delas. Se um homem não cuida, se descuida e destrata, é porque ainda não percebeu o que é uma mulher e como funciona. As mulheres são seres complexos. A nossa cabeça tem novelos infinitos que se embrulham uns nos outros quando nos sentimos inseguras ou tristes. Nunca somos fáceis, mesmo quando somos leves. Nunca somos simples, mesmo quando não temos complicómetro. Um cara todo errado não tem empatia, portanto nem pensa nisso. Em algum momento poderá tentar entender-nos mas se estiver mais preocupado com o seu bem- estar e prazer, vai achar que tudo o que lhe der trabalho é uma chatice. Um homem que está bastante certo, já acertou o passo com os seus defeitos, tem calma consigo mesmo e ainda mais calma com os outros. E tem sempre calma com as mulheres de quem gosta, mesmo que nunca faça promessas inflamadas, declarações rasgadas nem acrobacias de circo.
Fecho os olhos deitada na areia enquanto sinto os raios de sol a conversarem com a minha pele. Oiço a playlist num estado de sonho lúcido. É tão boa, tão certa. Quando voltar ao refúgio claro e arrumado, sei que vou receber todos os abraços que precisar naquele dia. Sei que quem me abrir a porta, está a abrir-me a sua vida, a sua casa, o seu lugar. Sempre sem agendas escondidas, nem segundos processadores ligados, porque a verdade é a forma mais elevada de intimidade. Sei que posso confiar, desabafar, rir, chorar, partilhar, agarrar, dormir, acordar, ficar ou partir sem medo de nada. Sei que naquele lugar o mundo é tranquilo. Sei que estou protegida. E sei que serei feliz.
Nunca percebi se a felicidade é feita de momentos dispersos no tempo ou o resultado da nossa capacidade de amar tudo o que a vida nos traz de bom e de deitar para o lixo aquilo que nos faz mal, mas agora também não me interessa. Cheguei a um lugar onde me sinto em casa. É uma grande paz, após tão longa espera. Uma paz na qual descanso e me retempero. Aceitar nunca foi um verbo tão fácil. Ouvir e aprender nunca me souberam tão bem. Estar tornou-se um estado de graça.
Voltarei quando a vida assim o entender, o rapaz todo certo vai estar sempre lá para mim, disso já tenho a certeza. E com isso já me acertei com a vida.