"Os portugueses não me deixavam esquecer da Olga": António Sala e a relação de colegas, amigos e compadres até ao fim
Trabalharam juntos durante anos nas manhãs da Renascença e desenvolveram uma relação de amizade até ao fim. Ainda há um par de dias tinham falado, mas o telefonema seguinte, marcado para esta quarta-feira, dia 3, já não chegou a acontecer. Fica um afeto que se estendeu às famílias e que António Sala recorda com uma profunda saudade. "Esteve sempre muito acompanhada pelos filhos e netos e teve o grande amor da sua vida, o Virgílio, que já morreu. Se calhar, é o momento de eles se reencontrarem", disse à 'FLASH!'Durante anos, a voz de Olga Cardoso era uma das primeiras que António Sala ouvia pela manhã, na Renascença. Ele estava em Lisboa, ela no Porto, mas isso não impediu que desenvolvessem, à distância, uma química ímpar no programa 'Despertar', e que cultivariam até ao final da vida da antiga radialista, que morreu esta quarta-feira, dia 3 de dezembro, aos 91 anos, no Hospital São João do Porto, após ter sofrido um AVC.
"Quando pego no programa da manhã, é-me indicado que no Norte havia uma locutora que, ao longo das três horas de emissão, tinha três intervenções, para falar do tempo e do trânsito no Porto. E uns dias antes de começar, falámos telefonicamente e lancei-lhe um desafio: disse-lhe que não ia só fazer três intervenções, para ter os auscultadores sempre postos e estar pronta a abrir o microfone para entrarmos em diálogo. Arriscámos fazer um programa intuitivo que acabou por resultar super bem", recorda à 'FLASH!' António Sala, que só conheceria pessoalmente Olga três meses depois de terem começado a parceria na rádio.
Olga Cardoso era, então, mais velha do que António Sala (hoje com 73 anos), mas nos anos de parceria nunca se negou a um desafio ou aventura. Espontânea e com vivacidade, alinhava nas propostas mais inusitadas, o que acabaria por ser, segundo o radialista, um pouco a sua imagem de marca. "Hoje em dia os programas são muito mais herméticos, há muitos horários a cumprir. Ali as pessoas ouviam o Sala e a Olga, não estávamos a representar papéis, era muito genuíno, e isso resulta. Ela arriscou muito sempre, chegando à televisão tardiamente. Ela apresentava espetáculos, fazia teatro, chegou a gravar um disco com canções de Tozé Brito, a idade dela não correspondia à vivacidade e ao espírito que ela tinha. Era muito jovem e mexida de cabeça."
Durante os anos em que trabalharam juntos, António Sala e a 'Amiga Olga' desenvolveram uma amizade especial, e que se viria a revelar à prova de tudo. Mesmo depois de pousarem os microfones, mantiveram-se sempre em contacto. Sala seria padrinho de uma das filhas de Olga, e mesmo que não conseguissem estar juntos sempre, os telefonemas eram frequentes. Por exemplo, tinham falado há alguns dias, antes de o radialista ter ido de férias, e o próximo telefonema estava precisamente previsto para o dia em que a ex-apresentadora viria a falecer. "Tivemos uma amizade muito boa, falávamos frequentemente telefonicamente, ainda agora eu fui de férias, e antes de ir falei com ela. Foi a ultima vez e ia-lhe ligar hoje para lhe fazer um convite porque no dia 12 o meu espetáculo dos 60 anos de carreira vai passar por Gaia e eu queria homenageá-la. Vou homenageá-la na mesma, de uma maneira diferente, infelizmente."
Com a amizade de António Sala e Olga Cardoso aconteceria, aliás, algo peculiar. É que mesmo que pudesse haver alguma tendência para o esquecimento ou ir adiando o próximo telefonema, os portugueses não deixavam que isso acontecesse. "Nós nunca perdemos laços, mas uma coisa eram laços diários, no mínimo três horas, depois seguimos as nossas vidas normais e às vezes há um esquecimento, mas da nossa parte nunca houve isso, houve sempre uma proximidade grande, até porque os portugueses não deixavam que fosse de outra forma, todos os dias há gente que vem ter comigo, simpaticamente, e é rara a pessoa que, ao fazer isso, não pergunta: 'e diga-me uma coisa: a amiga Olga ainda é viva?' Eu não quero estar a exagerar, mas nos restaurantes, e em todo o lado, é raro o dia em que uma pessoa não venha ter comigo e pergunte: 'Então e a Olga?' Só isso faz com que ela esteja muito presente. Eu às vezes telefonava-lhe, não tinha nada para dizer e só dizia: 'tenho uma catrefada de beijinhos para te dar'."
Olga Cardoso faleceria aos 91 anos, mas pese o AVC que lhe roubou a vida, teve uma existência feliz até ao final dos seus dias, com saúde e rodeada pelos três filhos e quatro netos, que tanto amava. "Ela estava bem, só tinha um problema numa perna, malandra, que lhe estava a dar muito trabalho, mas para além disso estava muito lúcida, viva, esperta, lia muito, e estava sempre muito bem, tinha uma senhora que a acompanhava em casa, mas é a vida... Esteve sempre muito acompanhada pelos filhos, tinha uma grande paixão pelos filhos e pelos quatro netos e teve o grande amor da sua vida, o Virgílio, que já morreu há bastante tempo, quase há duas décadas. Se calhar é o momento de eles se reencontrarem."