
As viagens dos reis de Espanha, Felipe VI e Letizia, são sempre programadas ao pormenor. Estudadas até ao ínfimo detalhe. E os cuidados são redobrados quando se trata de momentos mais sensíveis, como é o caso de atentados [como o da estação da Atocha em Madrid, em 2004], catástrofes naturais [a erupção vulcânica da La Palma, em 2021] ou acidentes. E é assim mesmo que tem de ser!
Não se compreende, portanto, a razão pela qual a ida dos monarcas à zona devastada pela depressão DANA correu tão mal. Como é que Felipe VI e Letizia passaram pelo que passaram à vista do mundo inteiro? Como é que foram sujeitos à ira da população atingida pela tragédia? Como é que ninguém precaveu a situação? Tudo o que havia para dar errado, deu mesmo muito errado. Mas será que foi mesmo isso que aconteceu?
VISITA A VALÊNCIA TRANSFORMA-SE EM TRUNFO
À primeira vista e no imediato parece que sim. Só que conforme as imagens dos reis de Espanha, sujos e no meio de uma população irada, começaram a correr mundo o "jogo" virou a favor dos monarcas. Certamente que se estará a questionar como é que Felipe e Letizia acabaram por tirar dividendos de uma situação que, aparentemente, não lhes foi nada favorável. Passamos a explicar.
Nem um nem outro virou costas às vítimas. Não se amedrontaram com a lama, com as pedras e com os ovos que lhes foram lançados. Não recuaram quando lhes gritaram "assassinos" ou "filhos da p***". Não vacilaram quando avançaram ameaçadoramente em direção a si. Optaram por ficar. Escolheram ouvir as queixas, consolar os que choravam por terem perdido tudo. E este "tudo" não são apenas as roupas, os móveis, as casas, os carros e as recordações de um passado feliz. Este "tudo" engloba também a perda das pessoas que mais amavam… pais, filhos, maridos, mulheres, irmãos e avós. Felipe e Letizia ouviram e acolheram. Felipe e Letizia confortaram e apoiaram. Felipe e Letizia abriram os braços às vítimas e choraram com elas.
POSTURA DE FELIPE E LETIZIA ALOGIADA
Contra todas as recomendações das autoridades e sobretudo do corpo de segurança que os acompanhava nesta visita, os reis recusaram fugir. Recusaram refugiar-se atrás da polícia e dos seguranças. Recusaram entrar no carro e abandonar a população à sua sorte. Felipe VI foi ainda mais longe. Mandou fechar os guarda-chuvas que os seguranças insistiam em abrir em redor deles para os proteger dos arremessos.
Letizia, por sua vez, só repetia a quem se acercava: "Sinto muito, sinto muito...". E não hesitou em dar-lhes razão por se sentirem tão sofridos e com a impressão de terem sido abandonados por todos nas horas que se seguiram à devastadora passagem da DANA: "Tenéis razón [Têm razão]." Os reis, naquele momento, foram mais rei e rainha do que alguma vez haviam sido até aqui. Os elogios começaram a chegar de todo a Espanha e até da comunidade internacional.
ESTA É A RAINHA QUE ESPANHA QUER E PRECISA
Mas se Felipe viu o seu prestígio ser reforçado, já Letizia foi a que conseguiu angariar mais pontos a seu favor. Se pudéssemos falar em vencedores teríamos, forçosamente, de referir o nome da rainha. Como assim, perguntarão alguns. Explicamos. A antiga jornalista da TVE nunca conseguiu ser muito consensual. Há, entre os espanhóis, quem goste muito dela e os que não gostam absolutamente nada. Não se pode negar que desde que chegou ao Palácio da Zarzuela, Letizia esforçou-se para desempenhar o seu papel de forma exemplar. Não se sabe se essa obsessão – sim, a exigência que impôs a si própria tornou-se numa obsessão – lhe tirou a espontaneidade. Se foi essa autoimposição que a fez parecer altiva e distante. Até a sua permanente preocupação com a imagem [sempre pugnou por se apresentar de forma irrepreensível e nenhum pormenor era deixado ao acaso] afastou a rainha dos súbitos.
Desde o seu casamento com Felipe que se ficou com a ideia de que a plebeia que protagonizou um autêntico conto de fadas era, afinal, uma mulher inalcançável, fria e calculista. Só que a Letizia que se viu em Paiporta, a zona zero da depressão Dana [quer isto dizer que a localidade mais atingida e mártire] é diametralmente oposta à imagem que construiu – ou que dela se construiu – ao longo dos anos. As lágrimas que correram na cara suja de lama surpreenderam. Emocionaram. É esta a rainha que os espanhóis querem. É esta a rainha pela qual se esperava. E é esta a rainha que a Espanha precisa.
PAIPORTA, A MAIOR ALIADA DE LETIZIA
Mas ainda há um outro aspeto que é essencial trazer para "cima da mesa". Letizia estava a precisar desta visita a Valência [a correr mal como correu] como "pão para a boca", como diz a voz do povo. Não podemos esquecer que nunca a popularidade da mulher de Felipe VI esteve tão baixa quanto estava antes da tragédia da depressão DANA. A sua reputação estava passar pela "rua da amargura" desde que a sua dignidade e honra foram postas em causa pelo ‘escândalo Jaime del Burgo’. Recorde-se que sobre Letizia recaíram [e continuam a recair] duras e pesadas suspeitas após as revelações feitas por Jaime del Burgo, ex-cunhado e suposto amante.
Na sequência das acusações de adultério, Letizia viu o seu casamento com Felipe ser fortemente abalado. Ainda se fala que a ex-jornalista poderá deixar o Palácio da Zarzuela quando a filha, a princesa Leonor, estiver em condições de assumir um lugar de maior destaque na monarquia. Mas depois de Paiporta, Letizia conseguiu reverter o jogo a seu favor. Transformou-se num membro essencial para a coroa de Espanha. Bastou "descer do salto" e ser uma mulher como todas as outras para ganhar o respeito e a consideração de um país. Doravante, Letizia só precisa agir como agiu em Paiporta: ser empática e próxima.