
[a explicação dos tubarões]
Comido vivo, devorado sem misericórdia: é o que habitualmente acontece a quem, no meio dos tubarões, quer negociações de paz. Nenhum tubarão se alimenta de harmonia.
[a explicação da tentação]
Olhamo-nos como o lobo olhou para a avozinha: andamos aqui todos para nos comermos uns aos outros, temos de o dizer sem receios. Somos sujeitos susceptíveis à tentação, e é essa uma das melhores partes de sermos os sujeitos que somos.
A sedução é a imaginação de mini-saia, vestida para matar, a ocasião em que o cérebro assume que manda, e imagina, e vai atirando os dados. Criamos, aí, uma realidade por viver, e que no entanto já estamos, por inteiro, no mais profundo de nós, a viver: a sedução transporta-nos para dentro de uma bolha de tentação, uma micro-realidade, um espaço ao qual só nós, cá dentro, felizes, conseguimos aceder. Grande parte do interesse da vida depende do interesse das seduções que vivemos, e das tentações em que caímos. Não é à tentação que não se resiste; é à imaginação.
[a explicação da visão]
Os cegos ou os esperançosos: sei lá eu qual deles é o que menos vê.
[a explicação do provisório]
O sentimento de posse nem deveria ser classificado como sentimento; é, pelo contrário, um ressentimento, um rancor. Em todo o lado, a toda a hora, há pessoas invadidas por rancores destes, pessoas que crêem que algo lhes pertence, pacóvias. Nada nos pertence, nem a vida, vejam lá. Somos, isso sim, pertencentes: alguém é nosso dono e não sabemos quem é, ou o que é, andamos por aqui à procura de um caminho, de soluções, de respirações temporárias, de alojamentos provisórios. Somos isso: buscadores incansáveis, por vezes cansáveis, de respirações temporárias, de alojamentos provisórios. O material é uma vigarice, a banha da cobra que serve de motivação para as mais diversas decisões. Decidimos, em todas as instâncias, para sobreviver, e está decidido.
[a explicação da mentira]
Mentimos desde sempre e vamos mentir para sempre. Adão e Eva contaram a primeira mentira da história da Humanidade. Todo o ser humano ludibria, mente e engana. Fá-lo de forma corriqueira, resoluta, refinada e calculista. Não acreditam? Então respondam-me: conseguem dizer, com todas as letras, ao dono da casa que aquela festa que ele organizou e à qual vocês foram foi um tédio?
Saturação: s.f. Aquilo que define a existência de amor; quem ama, por mais que o amor o preencha, nunca fica farto.