Mãe de Noori assume atritos com a filha, que vivia na rua depois de "ultimato" do pai e tentou tirar a própria vida
Cristiana Gaspar falou abertamente sobre os desafios que os pais, separados, enfrentaram nos últimos anos com a adolescente, que sofre de transtorno borderline. A enfermeira tem sido criticada por permitir que a jovem de 18 anos vivesse na rua.Carolina Torres, que gostava de ser chamada de Noori, está desaparecida há quase um mês. Agora, a sua mãe, Cristiana Gaspar, deu a sua primeira entrevista, depois dos muitos apelos desesperados que tem feito nas redes sociais por informações sobre o paradeiro da jovem de 18 anos.
Em conversa com Júlia Pinheiro, esta terça-feira à tarde, a enfermeira assumiu a relação problemática que ela e o ex-companheiro, que é militar da Marinha, têm com a adolescente há vários anos e que culminou com Noori a viver nas ruas da Margem Sul.
"A Carolina era uma menina muito doce. Muito insegura dela própria, sempre foi. Com uma auto-estima sempre fragilizada", começou por contar.
Cristiana Gaspar admite que a jovem teve dificuldades em lidar com a separação dos pais e que, aos 12 anos, "deu o primeiro sinal de rebeldia", embora nunca explicando o que aconteceu nesse "episódio pontual". Assumiu no entanto que foi a "falta de diálogo" entre ela e o ex que terá provocado parte dos problemas, que começaram quando Noori vivia em regime de guarda partilhada.
Cristiana relatou depois um episódio em que a filha "se recusou a ajudá-la" quando foi operada e que, mais tarde, decidiu fazer-lhe o mesmo. "Ela disse-me que não ia fazer esse sacrifício por mim", contou, revelando que ficou depois seis meses de 'relações cortadas' com a filha, que passou a viver só com o pai. Mais tarde, quando a jovem lhe pediu dinheiro para ir a um festival de música, Cristiana Gaspar respondeu "que não ia fazer esse sacrifício" por ela. "Respondeu na mesma formulação", disse Júlia Pinheiro.
Terá sido durante esse período em que Cristiana Gaspar não tinha contacto com a filha, que Noori se envolveu num confronto físico com o pai e que decidiu mesmo apresentar uma queixa de violência doméstica contra ele, acabando por desistir da acusação mais tarde, já depois de uma audiência em tribunal.
Depois deste episódio, e já depois de retomar a guarda partilhada, Cristiana Gaspar revela que começa a suspeitar que a filha está a consumir drogas, seguindo-se um confronto físico, desta vez entre mãe e filha. A enfermeira decide então ir deixá-la em casa do pai e ficaram "quase dois anos" praticamente "sem comunicarem".
"Ela disse-me que não queria que eu fizesse parte da vida dela, era como se eu não existisse para ela, que a tinha abandonado em casa do pai", lamentou.
"Durante este ano e meio, quase dois anos, eu perdi o contacto do percurso da Carolina. Aliás, quando eu perguntava algumas coisas, era-me dito que o pai era o responsável pela Carolina", explicou.
Entretanto, o consumo de drogas e álcool continuava - segundo o que dizia ver nas redes sociais - e Noori estava a ser medicada e seguida em pedopsiquiatria.
Foi então que Noori, depois de fazer 18 anos, em junho, voltou a entrar em conflito com o pai e acabou a viver na rua. Cristiana diz que estava de férias quando recebe uma mensagem do pai de Noori que dizia: "A Carolina acabou de sair de casa, não leva cartão de telemóvel nem a chave de casa. Eu fiz-lhe um ultimato e como ela não respeitou, foi embora".
"Fiquei em pânico, porque não conseguia contactá-la", revelou. "Percebi que ela tinha ido para Setúbal, para casa de uma suposta amiga", acrescentou. Mais tarde, viria a dizer que a filha dormia "num parque" e numa casa que ela chamava de 'ocupa' e que ficava nos Anjos e que "não tinha medo".
Emocionada, Cristiana revela ainda que Noori foi diagnosticada com transtorno borderline e que, em setembro, lhe enviou uma mensagem a dizer "Mãe desculpa, mas eu vou-me matar". A adolescente foi então internada no hospital Garcia de Orta depois da tentativa de suicídio.
OS DIAS ANTES DO DESAPARECIMENTO
Depois deste episódio dramático, Cristiana tentou impôr "regras normais de uma família normal", mas como Noori disse que queria ir sair para o Bairro Alto, a mãe respondeu: "Isso para mim não funciona, isso não é assim. E ela disse 'ok, então não quero ir'. E voltou para a rua". No entanto, acabou por pedir à mãe para a ir buscar e voltou mesmo para casa.
Contudo, depois de ser apanhada na escola a consumir álcool, Noori enviou uma mensagem à mãe a pedir-lhe desculpa "por a ter desiludido" e que ia voltar para a rua. Cristiana Gaspar combinou então um encontro com a filha para ela ir "lá a casa buscar roupa e produtos de higiene para levar".
"Eu fiquei à espera dela para vir buscar as coisas mas ela não chegou", contou.
Foi então que Cristiana Gaspar disse: "O pai, aquilo que me manifestou na altura, foi que não queria saber o que estava a acontecer com a Carolina. Se calhar foi só um desabafo dele, mas...".
Cristiana Gaspar acredita que a filha está a ser "retida por alguém" porque nunca quereria preocupar assim a irmã mais nova.
"Às vezes passa-me pela cabeça que tenha acontecido alguma coisa e que a Carolina já não esteja cá, mas não sinto isso. (...) Eu sinto que ela ainda cá está connosco", afirmou ainda, em lágrimas.