
Até ao final da próxima semana estará decidido o que fazer com os restos mortais do antigo Presidente de Angola José Eduardo dos Santos, que morreu na passada sexta-feira, dia 8 de julho, aos 79 anos, numa clínica da cidade de Barcelona, na Catalunha, em Espanha, garante à The Mag fonte próxima do Governo de Angola. Neste momento estão em território espanhol, a negociar com as várias facções da família Dos Santos e representantes do governo de Madrid, Téte António, ministro das Relações Exteriores de Angola, e o General Fernando Garcia Miala, chefe do Serviço de Inteligência e de Segurança de Estado deste país africano.
Até à hora de fecho desta edição, contudo, ainda não havia acordo formal à vista. A mesma fonte ligada ao Governo de Angola garante à The Mag que muito ainda será discutido e acrescenta que caberá à lei espanhola determinar quem terá a palavra final sobre as exéquias fúnebres do antigo estadista.
Sobre a mesa estão várias teorias sobre qual a melhor forma de a família e também de os cidadãos angolanos se despedirem do homem que governou o país durante 38 anos consecutivos, em tempos de guerra e depois de paz. E sobre a mesma mesa estão também uma imensidão de posições distintas, brigas e quezílias antigas entre alguns filhos do Presidente e a atual mulher legítima, Ana Paula dos Santos, que nos últimos quatro anos estava separada do ex-Chefe de Estado, mas que regressou a casa nos últimos dois meses e meio antes da sua morte.
A VIÚVA PODE TER A PALAVRA FINAL, MAS...
Se o direito civil espanhol não variar muito do português, e também do angolano, que no da antiga metrópole bebeu boa parte da sua inspiração, será Ana Paula dos Santos quem dirá como ocorrerá o funeral do marido e ex-Chefe de Estado da nação africana. Mas tal não é completamente liquído e muito menos linear.
A mesma fonte próxima do Governo de Angola garante-nos que "as negociações são complexas, pois a viúva tem direitos, apesar de não viver com o defunto há vários anos. Os filhos podem sempre interpor providências cautelares na Justiça espanhola e isso atrasará o processo. E pesará também, à mesa das negociações em Espanha, o estatuto de antigo Chefe de Estado de José Eduardo dos Santos. Os espanhóis terão sempre em consideração o papel importante do próprio Estado angolano na decisão final".
O nosso interlocutor assegura ser fundamental, nesta fase das negociações que haja "muita serenidade pois ainda há muito por decidir", diz, rematando com uma frase irónica que se usa muito na gíria dos tribunais e que se poderá aplicar a este momento: "Mais vale um mau acordo, do que uma boa demanda".
FILHOS COM MEDO DE CAÍREM NUMA RATOEIRA
Um dos receios de alguns filhos de José Eduardo dos Santos, nomeadamente da primogénita, Isabel dos Santos, de 49 anos, é que a Justiça angolana execute alguns mandados de detenção que pendem sobre si no exato momento em que pise solo de Angola. O atual Presidente da República João Lourenço já veio afirmar publicamente que, durante os três dias de luto pela morte de José Eduardo dos Santo nenhum dos filhos acusados ou suspeitos de crimes serão detidos, atribuindo-lhe uma imunidade temporal.
Contudo, alguns dos herdeiros de Dos Santos envolvidos em investigações policiais e acusados de desvios de milhares de milhões de dólares de dinheiros públicos temem cair numa ratoeira ao porem o pé na terra onde nasceram ou cresceram.
Isabel é uma das herdeiras de José Eduardo dos Santos que mais perigo corre por se deslocar a Angola. Primeiro pelo volume de crimes de que é acusada, e depois porque a sua presença, assim como a de outros irmãos, obrigará o Governo angolano a montar um fortíssimo dispositivo de segurança para evitar a uma revolta ou ataque popular que fuja ao controlo durante as cerimónias fúnebres.
Seja qual for a decisão tomada pela primogénita do ex-Presidente da República, a sua deslocação será sempre de alto risco, em matéria de segurança.
Além disso, também Tchizé dos Santos, a segunda filha mais mediática de José Eduardo dos Santos, já avisou que considerará a irmã "uma traidora" caso negoceie com o Presidente João Lourenço e o seu Governo a sua ida a Angola para assistir ao funeral do pai.
TCHIZÉ JURA QUE POR MEDO NÃO METE O PÉ EM NADA DE ANGOLA
Nas suas redes sociais - e numa entrevista que concedeu à CNN Portugal - Tchizé dos Santos dispara em todas as direções e afirma não acreditar em ninguém. "Não irei pôr o pé em nenhuma instituição angola, nem sequer um consulado, nem sequer um carro de matrícula diplomática angolana, enquanto o João Lourenço for Presidente", diz, explicando: "Eu corro perigo de vida em qualquer sítio onde ele tenha controlo".
Ainda segundo Tchizé, "Os filhos de Ana Paula dos Santos até podem ir. A Isabel de certeza absoluta que não vai, a menos que cometa o grande erro de chegar a algum tipo de acordo. Se ela for, vai ser vista como uma grande traidora", disparou. A mesma Tchizé dos Santos, numa conturbada entrevista à CNN Portugal garantiu que não vai "vender o corpo" do pai e que não se importa de esperar os anos que forem precisos até que João Lourenço saia do poder e, desta forma, possam ser realizadas as cerimónias fúnebres do ex-Presidente em Angola.
A jornalista Ana Sofia Cardoso da CNN perguntou-lhe se "não será esta uma atitude egoísta para com o povo que gostava de se despedir uma última vez?". E Tchizé ripostou: "O povo está a pedir que os filhos não entreguem o corpo. A maioria dos angolanos prefere esperar para viver este luto e este enterro sem João Lourenço."
O REENCONTRO DO PRESIDENTE COM A PRIMEIRA EX-MULHER
Se os filhos do falecido Presidente da República não se entenderam ainda sobre o funeral do pai, a verdade é que as ex-mulheres do antigo Chefe de Estado gerem bem as suas "divergências" e até convivem pacificamente.
Segundo adiantou, dias antes da morte do pai, a empresária Tchizé dos Santos, a mãe de Isabel dos Santos, a geóloga e campeã de xadrez russa Tatiana Kukanova, voltou a encontrar o ex-marido quando este já estava fragilizado em Barcelona. "A primeira esposa, mãe de Isabel, apareceu como amiga. Esteve lá, a dar apoio", revelou a ex-deputada num direto no Instagram, enquanto criticava ferozmente a atual madrasta, Ana Paula dos Santos.
Esta é uma rara declaração sobre a mãe de Isabel, que foi casada durante 13 anos com José Eduardo dos Santos. Sabe-se, no entanto, que Tatiana é um grande apoio da filha e é presença constante na vida dos netos, segundo o livro 'Segredos e Poder do Dinheiro', de Filipe S. Fernandes.
Dois dias depois da morte do pai, Tchizé revelou uma declaração privada da mãe, Maria Luísa Abrantes, que foi guerrilheira do MPLA ao lado de José Eduardo dos Santos: "Tarde concluímos que éramos felizes e não sabíamos. Só se atinge a felicidade pessoal quando a família está unida, mas priorizaste sempre a unidade nacional. Que Deus te dê o eterno descanso que te tinha sido negado temporariamente pelos homens".
UMA FAMÍLIA MUITO NUMEROSA: SEIS MÃES E DEZ FILHOS
Recorde-se que José Eduardo dos Santos tem 10 filhos legítimos de seis mulheres, mas foi casado apenas duas vezes: com a mãe de Isabel e com Ana Paula - de quem supostamente estava separado há quatro anos, mas de quem nunca se divorciou.
Tchizé e o irmão José Filomeno nasceram no mesmo ano, de mães diferentes, mas isso não parece ter abalado a relação do ex-presidente com Maria Luísa. Os dois tiveram mais um filho antes de a relação acabar, José Eduardo Paulino (Coréon Dú).