
No último domingo, dia 27 de outubro, Pinto da Costa lançou, na Alfândega do Porto, o seu livro de memórias, 'Azul até ao Fim', e os cânticos dos adeptos, a sala à pinha, o apoio dos amigos emocionaram-no mais do que nunca numa altura em que o antigo presidente azul-e-branco, de 86 anos, se depara, de uma forma mais consciente, com a sua própria finitude, depois de ter recebido o diagnóstico de cancro na próstata.
E são, na verdade, os pensamentos de alguém que é confrontado com a própria morte que podemos ler no seu livro em que, aleatoriamente, Pinto da Costa traz à tona um conjunto de memórias, sentimentos e relatos mais pessoais e, também, pedidos sobre o dia em que já cá não estiver.
Muito debatida tem sido a lista das pessoas que podem ou não marcar presença no seu funeral – que está pago e a mulher, Cláudia Campo, sabe extamente como pode colocar em prática – mas há outros pedidos que Pinto da Costa tem para fazer, usando o livro para os elencar. O principal prende-se com a divisão da sua fortuna entre os dois filhos, Alexandre e Joana Pinto da Costa, quando chegar ao momento das partilhas.
O antigo presidente do FC Porto antevê uma guerra entre os irmãos – fruto de dois casamentos diferentes: Manuela Carmona e Filomena Morais – e deixa um conselho aos dois. "Neste momento, duas preocupações enchem a minha cabeça e o meu coração. Na minha falta, como será o relacionamento dos meus filhos? Como se vão entender na divisão dos meus bens?", questionou, deixando-lhes o mesmo conselho que a própria mãe lhe deu na sua despedida. "Já lhes lembrei o que a minha querida Mãe nos dizia, a mim e aos meus irmãos: 'Entendam-se, senão metade do que vos deixo será para os Tribunais e advogados. Sábias palavras, que todos seguimos, e tudo dividimos sem o mínimo atrito."
Pinto da Costa aproveitou ainda o momento para reforçar que não tem fortunas escondidas em paraísos fiscais. "Já disse aos meus filhos que não tenho qualquer conta no estrangeiro, nem qualquer sociedade", escreve no livro 'Azul Até ao Fim'.
Na mesma obra de memórias, Pinto da Costa confirma ainda, em determinados momentos, a notícia avançada pela FLASH! do distanciamento do filho Alexandre, ainda que no final a ideia que fica é de que o antigo dirigente desportivo não lhe guarda rancor na fase final da vida. "Por discrepâncias com o meu filho Alexandre, não passámos o Natal em conjunto com os restantes familiares, nem sequer nos encontrámos. TRISTE. Por essas ausências senti-me triste", escreveu, numa ocasião sobre o Natal de 2023", reforçando, mais tarde, essa ideia. "O Natal deste ano foi muito triste para mim porque faltou o meu filho, que por motivos de 'lana-caprina' (insignificância) se afastou de mim. Foi uma mágoa sempre presente."
A DOR PELA MORTE DOS IRMÃOS E AMIGOS
Se há coisa que se sente ao ler as memórias de Pinto da Costa é a solidão de quem vai perdendo a sua família mais próxima e os melhores amigos. No livro, o antigo presidente dos dragões fala com grande mágoa da morte de Reinaldo Telles, seu melhor amigo e braço-direito no FC Porto, de Fernando Gomes, mais conhecido por Bibota, mas particularmente de dois dos seus quatro irmãos, que perdeu no espaço de um mês, em 2021.
Primeiro foi a irmã Alice, que o deixou verdadeiramente de rastos. "A minha querida irmã faleceu. Que duro golpe, meu Deus! Mais de 80 anos de verdadeiro amor fraterno! Foi irmã, conselheira, amiga, sempre compreendendo as minhas decisões, ainda que não concordasse. À frente do seu corpo, já sem vida, pedi-lhe que desse um beijo à Mãezinha e pedisse a Deus para abençoar os meus filhos, netos e amigos. Mas pedi para que não se esquecesse de me puxar para junto delas", escreveu.
A dor iria ser exacerbada um mês depois com a morte do irmão José Eduardo, a quem chamava carinhosamente de Zidá. "O Zidá morreu, o José Eduardo, o Zé, meu companheiro de uma longa vida deixou-me. Foste sempre o meu melhor amigo", partilhou com tristeza para concluir. "Também estou ansioso por te reencontrar."
UM AMOR CHAMADO CLÁUDIA
Todo o livro de Pinto da Costa acaba por ter uma toada muito triste: do diagnóstico duro de ouvir, que lhe foi dado pelos médicos, às perdas, ao afastamento do FC Porto, Pinto da Costa é um homem que se debate com aquilo que já teve e lhe fugiu por entre os dedos, com a dureza de uma doença em estado avançado, que o deixa com a sensação de que o que lhe resta de tempo de vida é para desfrutar.
Mas a verdade é que há também muita raiva escondida nos desabafos de Pinto da Costa, que volta e meia perde tempo a falar dos inimigos, dos que não quer no seu funeral, daquilo que acha que a imprensa lhe fez quando, na verdade, estava apenas a cumprir a sua missão de informar os portugueses. Do trabalho do Ministério Público, que ataca com sete pedras.
É nesta dualidade de sentimentos entre o não nos devemos desgastar com o que não nos faz bem e o não conseguir esquecer o mal que lhe fizeram que se debate Pinto da Costa, com algumas, poucas, exceções: os netos, uma das suas grandes alegrias de viver nos dias que correm, o amor da família e uma mulher que, assume, trouxe muita alegria à sua vida quando o próprio achava que já não ia voltar a apaixonar-se. "Fruto de más escolhas, vivia um período infeliz sentimentalmente", disse, ao recordar como se encontrava no dia em que conheceu Cláudia Campo no banco onde esta trabalhava.
A partir de então, admite ter passado a ir com frequência à instituição bancária sem que tivesse necessidade disso, até que a convidou para sair. "Estava admirado comigo! Tinha-me divorciado e decidido (penava eu) que nunca mais teria um relacionamento com quem quer que fosse", escreveu para se referir ao divórcio de Fernanda Miranda.
No entanto, nunca fala em nomes de outras mulheres que passaram pela sua vida, apenas de Cláudia e da forma que o seu último casamento foi aquele que teve, por fim, o condão de deixar toda a sua família feliz.
Os dois casaram-se em agosto de 2023 numa conservatória do Registo Civil, marcada pela simplicidade. "Na mesa estava um lindo bolo, uma garrafa de champanhe e uma imagem de Nossa Senhora de Fátima, que a Cláudia me ofereceu como prenda de casamento e que eu adorei."
A TRISTEZA POR DEIXAR ESTE MUNDO
Escrito em tom de diário, o livro de Pinto da Costa assume, a páginas tantas, quase um tom fúnebre de quem se está a despedir.
Agradece aos médicos do IPO do Porto pelo tanto que zelaram por ele, chamando-o de anjos da guarda e refere que gostaria de ter mais tempo para aqueles que mais ama, ainda que não saiba quanto (assusme a incerteza de se chegará aos 87 anos, que assinala no fim de dezembro).
"Espero que sejam cumpridas as minhas últimas vontades, mas acredito que, com a bênção de Deus e Nossa Senhora de Fátima, ainda vou poder desfrutar da companhia da minha querida Cláudia, dos meus filhos, dos meus netos e dos meus 'amigos/irmãos' algum tempo mais. Mas quando chegar a hora, quero que aceitem isso com naturalidade e saibam que o meu amor por vós é eterno."