
A persistência e resiliência de Cristiano Ronaldo, de 36 anos, são características que espantam fãs e críticos. O que eles não sabem é que CR7 é feito de uma massa muito especial, com um segredo que só os madeirenses conhecem e compreendem. Tal como o nosso craque maior em matéria de futebol, também o restaurateur Manuel Fernandes, de 69, é feito da mesma farinha de resistência e tenacidade.
São essas características que ditam os vencedores e que fizeram de Manuel Fernandes, o dono e mentor do 'Restaurante Típico O Madeirense', e de duas dezenas de espaços que entretanto foi abrindo, um dos maiores sucessos no campo da restauração em Lisboa.
Manuel ousou, arriscou e venceu a contenda. O rapazinho que nasceu pobre na localidade de Canhas, na Ponta do Sol, numa família de sete irmãos, que só teve os primeiros sapatos aos dez anos, tentou a sorte no continente há 53 e conquistou - anos mais tarde, depois de muitas horas a trabalhar e cruzando-se as pessoas certas – o palato dos comensais da capital e também os forasteiros.
O PERCURSO DE UM LUTADOR
O madeirense começou a trabalhar na capital no restaurante Baleeiro, depois saltou para o Convés, um espaço de restauração ligado ao empresário de teatro e restauração Vasco Morgado, um dos grandes senhores do Parque Mayer no final do regime do Estado Novo, que viria a falecer em 1978 vítima de doença prolongada.
O rapaz de Canhas chega à cidade grande do continente e é apanhado poucos anos depois no turbilhão da mudança política, acusado pelos colegas de ser amigo do patrão. Foi saneado e esteve semanas sem conseguir arranjar trabalho. Ah, e com uma filha bebé nos braços.
A política acaba então por não lhe interessar. Ele queria era trabalhar. E pode gabar-se de nunca ter pedido subsídios ao Governo Regional da região que tão bem representa no prato.
LIGADO ÀS ARTES
Manuel tinha trunfos e não alinhava em modas revolucionárias: A sua simpatia contagiante e o facto de ser um trabalhador incansável levaram Vasco Morgado a conceder-lhe a gestão dos bares do teatro Maria Matos e do Villaret, mas não se ficou por aí. Manuel queria sempre mais.
É nesta última sala de espetáculos que ganha fôlego para começar, ao lado da mulher, Paula Cabral, por quem se apaixonou aos 17 anos numa viagem de comboio na linha de Sintra, uma caminhada rumo ao sucesso, no qual nunca descansa.
No teatro Villaret a RTP gravava o popular concurso 'A Visita da Cornélia', e é aqui que Manuel e a mulher conhecem várias figuras púbicas da televisão e ganham élan para se aventurarem num pequeno espaço entre Sete Rios e as Laranjeiras, na Calçada da Palma de Baixo, com apenas 40 cadeiras, a que chamam 'O Madeirense', marca Âncora do negócio familiar que até hoje perdura.
Perdura e transformou-se, ao longo de décadas, graças a apoios de amigos famosos do teatro, da televisão, do futebol e da política em sinónimo de embaixada oficiosa da maravilhosa ilha conhecida como Pérola do Atlântico.
OS SEGREDOS DO SUCESSO
E o segredo do sucesso? Manuel Fernandes explica ao site FLASH!: "Sabia que tinha de dar aos clientes o que de mais genuíno havia na ilha da Madeira. Não queria servir pratos típicos da Madeira adaptados ao gosto do continente e por isso fui ter com a minha mãe a Canhas e pedi-lhe que me ensinasse os segredos das receitas dos pratos típicos madeirenses. Que me revelasse o segredo dos condimentos. Acredito que foi esse o segredo do nosso sucesso".
Aos poucos, em Sete Rios, pelas mesas de 'O Madeirense' começaram a passar ministros, sindicalistas, artistas, futebolistas, banqueiros e homens de negócios.
APOSTAS E DESAFIOS
No pequeno espaço inaugurado em 1979 havia tertúlias de amigos, exposições e até apostas – algo querido para um homem que ganhou 35 contos (175 euros) num Totobola – que envolvia a oferta de uma refeição grátis ao primeiro jogador do Sporting (uma das paixões clubísticas de Manuel Fernandes) que marcasse o golo da semana da jornada.
Em 1985, quando abre o restaurante no Centro Comercial das Amoreiras, Manuel e Paula foram honrados com a presença de Alberto João Jardim, à época presidente do Governo Regional do arquipélago, e ainda de todo o executivo madeirense.
"A nossa casa é, acima de tudo, uma casa de amigos, muito familiar. Um espaço onde os nossos amigos e os amigos deles podem vir e sentir-se à vontade. Quem entrar aqui tem que se sentir na Madeira. Faz de conta que estou aqui a receber os amigos e ainda pagam", declara o empreendedor madeirense, com um sorriso.
COMO TRATAR CLIENTES
Manuel assume ainda que gosta de marcar a diferença no atendimento: "Eu também sou cliente de outros restaurantes e gosto de chegar a um espaço e que deixem à vontade. Aqui, tentamos que os clientes quase não deem por nós. Podem estar a fechar um negócio, que acontece aqui muito. Um casal pode estar num momento íntimo a namorar e por isso não queremos incomodar".
E depois à mesa é um desfile de iguarias da Madeira, de comer e chorar por mais: do milho frito ao bolo do caco com manteiguinha; do lombo de atum com batata doce às gambas panadas com arroz de legumes; das lapas grelhadas com limão às populares espetadas de lombo à Madeirense em pau de louro ou em ferro. Todas elas iguarias saídas do livro de receitas da mãe de Manuel Fernandes. A bíblia sagrada da cozinha deste templo da gastronomia regional.