'
THE MAG - THE WEEKLY MAGAZINE BY FLASH!

Sim Chef!, com Hugo Guerra – episódio 3, Temporada 2

Herdou o gosto pela cozinha das raízes alentejanas. Aos 7 anos já ajudava na preparação do cabrito durante as festas de família. Andou "meio perdido" até que a irmã lhe indicou o caminho a seguir. Passou quatro meses duros a estagiar com um dos chefs com mais Estrelas Michelin do País Basco e percebeu que esse é um caminho que não quer seguir. Abriu o Lobo Mau em plena pandemia. Uma "loucura" influenciada pela namorada e que o faz feliz. Venha daí conhecer o "hiperativo" chef Hugo Guerra.
Hélder Ramalho
Hélder Ramalho
30 de setembro de 2021 às 22:21
A carregar o vídeo ...

Quando liguei ao chef Hugo Guerra, 34 anos de idade, para agendarmos uma reportagem no Lobo Mau, na Estefânia, em Lisboa, percebi de imediato qual seria o tom da entrevista. O jovem chef tem uma energia inesgotável, boa disposição para dar e vender e fala pelos cotovelos. Diz que é "hiperativo". Tudo aquilo que viria a ser comprovado dias mais tarde, quando nos encontrámos para realizarmos o trabalho. Só podia correr bem.

O encontro ficou marcado para a Nãm Mushroom, uma quinta urbana em Braço de Prata, ou melhor, uma empresa baseada na economia circular que produz cogumelos ostra orgânicos através do aproveitamento da borra de café. "Um modelo de negócio inspirado na Natureza", como explica Natan Jacquemin, o empreendedor social belga mentor do projeto, numa parceria com a Delta. "Aqui não há desperdício", garante Natan que se apaixonou por Portugal após um mestrado na Católica Business School.

NÃM MUSHROOM, UMA QUINTA SUSTENTÁVEL DENTRO DA CIDADE

A Nãm, startup criada por Natan, começou numa cave com o objetivo de transformar todos os meses 500 kg de borras de café em 100 kg de cogumelos ostra. Neste momento cresceu para uma pequena quinta no meio da cidade e há projetos para se expandir para vários pontos da capital, de forma a ficar próxima da matéria prima – recolha da borra de café – e dos consumidores – na sua maioria chefs de restaurantes como Hugo Guerra. "Colhemos o cogumelo de manhã e tentamos sempre entregar ainda de manhã ou ao início da tarde, para manter a frescura", explica Natan.

Hugo Guerra, Natan Jacquemin, Nãm Mashroom
Hugo Guerra, Natan Jacquemin, Nãm Mashroom Foto: D.R.

"Se tiver um cogumelo destes exposto no balcão vai sempre chamar a atenção do cliente, que vai perguntar a história deste produto e nós contamos sempre, divulgamos o parceiro, ou seja a empresa produtora. Para além disso, este não é um cogumelo qualquer, é de qualidade superior e sustentável. O prato passa a ter uma história que ajuda o cliente a ter uma ligação com o que está a comer, com o produto e como ele chegou até nós", defende Hugo Guerra, ao mesmo tempo que segura um enorme cogumelo ostra.

Hugo Guerra, Natan Jacquemin, Nãm Mashroom
Hugo Guerra, Natan Jacquemin, Nãm Mashroom Foto: D.R.

O chef do Lobo Mau privilegia a relação com os pequenos produtores. "Aqui a comunicação é direta" justifica. "Mesmo em situações de urgência nunca houve falhas. Trabalho com um produto que é criado cá, com um produtor para quem a sustentabilidade é o mais importante e qualidade fala por si só", refere.

AS RAÍZES ALENTEJANAS E O DURO ESTÁGIO COM MARTÍN BERASATEGUI (12 ESTRELAS MICHELIN)

Mas, até chegar aqui, Hugo Guerra teve de batalhar bastante. Chegou a andar "meio perdido" até que a irmã lhe mostrou o caminho que haveria de percorrer com convicção e certeza. Os livros e a escola não era o forte do jovem Hugo, que quis deixar de estudar quando terminou o 12.º ano. Foi então que a irmã lhe sugeriu inscrever-se num curso de cozinha. Na memória estavam os tempos de criança, quando Hugo, com apenas 7 anos de idade, já gostava de ajudar a preparar o cabrito na altura das festas em família. As raízes alentejanas, de Évora, ajudam neste lado criativo da cozinha.

Chef Hugo Guerra, Lobo Mau
Chef Hugo Guerra, Lobo Mau Foto: D.R.

"Tenho uma família bastante grande e, nas festas, como o Natal, passávamos de um dia para o outro a cozinhar e eu sempre gostei de participar. Desde muito pequeno ajudava a descascar as cebolas. Depois também tínhamos uma quinta, alguma produção, forno a lenha. E todas essas coisas incutiram-me a paixão por isto", recorda.

"Havia muitos estagiários, muita pressão, estava fora do meu país e tinha acabado de sair da escola. Nesse aspeto foi duro."

Feito o curso de cozinha – inscrito pela irmã – era tempo de estagiar. Hugo Guerra e outros três colegas de formação enviaram um mail ao chef Martín Berasategui – tem atualmente 12 Estrelas Michelin –, de San Sebastián, no País Basco. A resposta chegou na mesma semana. O estágio durou quatro meses. Quatro meses muito duros: "Havia muitos estagiários, muita pressão, estava fora do meu país e tinha acabado de sair da escola. Nesse aspeto foi duro. Por outro lado, fiz muitas amizades, de toda a parte do mundo. Fiz grandes amigos. Muitos são chefs já conhecidos noutros pontos do mundo."

Chef Hugo Guerra, Lobo Mau
Chef Hugo Guerra, Lobo Mau Foto: D.R.

No regresso a Portugal começou a trabalhar no Penha Longa, em Sintra, onde esteve cerca de 2 anos e meio. Seguiu-se o Bica do Sapato, a Ordem dos Médicos, no Pátio Velho, e chefiou o El Clandestino, no Bairro Alto. "Entretanto a minha mãe morreu e eu parei de cozinhar. Estive um ano parado. Depois surgiu uma proposta para ir trabalhar como sous chef num restaurante em Alcântara. Foi um projeto engraçado que acabou por não ir para a frente. Ainda foram dois anos de preparações. Montámos um restaurante de raiz e no final ficámos com a sensação de missão cumprida", recorda.

A LOUCURA DE ABRIR UM RESTAURANTE EM TEMPO DE PANDEMIA

Por essa altura, a namorada Vanessa lança-lhe o desafio de abrirem um restaurante em nome próprio: o Lobo Mau. O nome tem uma ligação estreita à personalidade extrovertida e enérgica do chef. "Há quem me trate por lobo por eu defender a minha equipa contra tudo e contra todos. Sempre fui assim. Como se se tratasse de uma alcateia", explica Hugo Guerra.

"Há quem me trate por lobo por eu defender a minha equipa contra tudo e contra todos."

Abriram em tempo de pandemia. "Uma loucura", admite. "A Vanessa achou que estava na altura de abrirmos uma coisa nossa. Eu não tinha esse atrevimento. Ela deu um empurrãozinho e acabamos aqui, no Lobo Mau. Muitas pessoas chamaram-nos malucos, mas está a correr bem e está a ser positivo. Um dia de cada vez. Tem de haver sempre uma certa dose de loucura. Não estou nada arrependido, sinto-me bastante feliz e julgo que os clientes também. Quem vem acaba por voltar", congratula-se.

A LOUCURA DE ABRIR UM RESTAURANTE EM TEMPO DE PANDEMIA

Por essa altura, a namorada Vanessa lança-lhe o desafio de abrirem um restaurante em nome próprio: o Lobo Mau. O nome tem uma ligação estreita à personalidade extrovertida e enérgica do chef. "Há quem me trate por lobo por eu defender a minha equipa contra tudo e contra todos. Sempre fui assim. Como se se tratasse de uma alcateia", explica Hugo Guerra.

"Há quem me trate por lobo por eu defender a minha equipa contra tudo e contra todos."

Abriram em tempo de pandemia. "Uma loucura", admite. "A Vanessa achou que estava na altura de abrirmos uma coisa nossa. Eu não tinha esse atrevimento. Ela deu um empurrãozinho e acabamos aqui, no Lobo Mau. Muitas pessoas chamaram-nos malucos, mas está a correr bem e está a ser positivo. Um dia de cada vez. Tem de haver sempre uma certa dose de loucura. Não estou nada arrependido, sinto-me bastante feliz e julgo que os clientes também. Quem vem acaba por voltar", congratula-se.

Chef Hugo Guerra, Lobo Mau
Chef Hugo Guerra, Lobo Mau Foto: D.R.

A carta é curta e muda a cada três meses. "Duas pessoas que cá venham duas vezes conseguem provar os pratos todos." As bases são as da cozinha tradicional portuguesa com um "twist" de contemporaneidade. "Um cunho pessoal", avalia Hugo Guerra. O chef não gosta de receitas, ainda que existam fichas técnicas para os pratos. Prefere a criatividade do momento, sem descaracterizar o prato. "A cozinha é amor, um pouco mais de sal, um pouco mais disto e daquilo, isso é o mais importante e no final provar e achar que posso acrescentar mais alguma coisinha", justifica. Também por isso, chegar às famosas Estrelas Michelin nunca será um objetivo. "Para eles o rigor é que faz a perfeição. Gostei mas é um caminho que a mim, neste momento, não me interessa. O meu caminho é outro. É uma linha que não quero seguir."

JANTARES POP-UP E A PARTILHA NA COZINHA 

Para Hugo Guerra, cozinha também significa partilha. No Lobo Mau todos têm direito a participar na elaboração da carta. "Todas as ideias são bem vindas mesmo quando é de uma pessoa da sala. Tirar uma ideia é bom e ouvir as opiniões dos outros é importante."  Nos últimos dias, o chef Hugo Guerra tem estado a organizar jantares pop-up, com a participação de vários chefs. Esta sexta-feira, dia 1, é o último jantar da primeira temporada.

Para o derradeiro jantar, Hugo Guerra convidou Inga Martin, chef consultora & Food Stylist, João Bessa Correia, chef executivo do Rossio Gastro Bar, e João Diogo Mendes, head chef do restaurante Mãe, com vinhos da Lobo Wines (Casa Agrícola Assis Lobo). Será servido um menu de degustação exclusivo de oito momentos, composto por um amuse bouche com um welcome drink, três entradas, três pratos principais (vegetariano, peixe e carne), e sobremesa. O valor por pessoa, que inclui o jantar de oito momentos, bem como os vinhos que o acompanham, é de €55.

Chef Hugo Guerra, Lobo Mau, Arroz cremoso de cogumelos, algas e tapioca
Chef Hugo Guerra, Lobo Mau, Arroz cremoso de cogumelos, algas e tapioca Foto: D.R.

"É uma oportunidade de trabalhar com vários chefs. Alguns deles amigos, outros que admiro e é, acima de tudo, para nos divertirmos e conviver: abrir uma garrafa de vinho e estarmos na cozinha a cozinhar, não para nós mas para o cliente. Não é para vermos quem é o melhor na cozinha mas sim mostrar a nossa visão e o cliente, através do palato, dizer se está bem ou não. O objetivo é passar um bom bocado", define o chef Hugo Guerra. Bom apetite!

 

você vai gostar de...


Subscrever Subscreva a newsletter e receba diariamente todas as noticias de forma confortável