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É português e impactante! Helena Magalhães está de volta com 'Atos de Desobediência', o seu romance mais maduro e revolucionário

Publicou o seu primeiro livro em 2017, numa altura em que a sua juventude a impelia a contar outro tipo de histórias, e desde então foi trilhando o seu percurso, tornando-se numa das vozes contemporâneas da literatura nacional. Sob a alçada de uma nova editora, Helena Magalhães traz-nos agora 'Atos de Desobediência', o seu quinto livro, que nos mostra a sua versão mais madura, numa narrativa que satiriza o próprio mercado dos livros onde a autora se move, mas que é muito mais do que isso. "É o romance que mais acompanhou as minhas próprias mudanças pessoais, acabei de fazer 40 anos e sinto-me tão ambígua e defasada como a personagem", disse à FLASH, numa conversa em que o convida a entrar no universo de Glória, a grande estrela do seu novo romance.
Por Rute Lourenço | 17 de setembro de 2025 às 20:05
Helena Magalhães lança o seu quinto livro 'Atos de Desobediência' Foto: Flash

Durante meses a fio, 'Atos de Desobediência' ainda não tinha nome e era apenas um documento perdido no portátil de Helena Magalhães, onde a escritora depositava pensamentos soltos e considerações. Estava a trabalhar naquele que julgava ser o sucessor de 'A Devastação', o seu último romance, quando percebeu que era, afinal, a história de Glória Brito que mais urgia ver a luz do dia. Mergulhou a fundo no universo da personagem, leu mais sobre filosofia e psicanálise para "dar mais corpo" à história e, às tantas, assume, deixou de saber onde terminava a vida de Glória e começava a sua.  O livro - o quinto da escritora portuguesa - chegou esta semanas às livrarias, debaixo do selo de uma nova editora, a Asa, e mostra a versão mais madura de Helena Magalhães que, pela voz da sua nova personagem, mergulha numa reflexão profunda sobre o nosso lugar no mundo, ao mesmo tempo que narra a jornada de Glória, uma escritora a entrar nos seus 40 anos, que depois de ter saboreado o sucesso, se deparou com dois fracassos literários e tem à sua frente consecutivas páginas em branco, nas quais não faz ideia sobre qual a história que deve escrever a seguir.

"Atos de Desobediência", o novo romance de Helena Magalhães, já nas bancas Foto: Flash
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"É um livro sobre crescimento pessoal, o impacto do trauma infantil na vida adulta e queria fazer uma dicotomia com a vítima perfeita / vítima questionável aos olhos do leitor, cada pessoa reage ao trauma de forma diferente (...) E depois há a forma como as mulheres se debatem com todos os papéis que temos de desempenhar e as minhas próprias questões existencialistas sobre o meu lugar enquanto mulher na escrita e no mundo. Talvez seja, por isso, o romance que mais acompanhou as minhas próprias mudanças pessoais, acabei de fazer 40 anos e sinto-me tão ambígua e defasada como a personagem", conta à FLASH! Helena Magalhães, que na obra lança um olhar acutilante sobre o mercado editorial português, nomeadamente o seu ainda "elitismo", sempre com um toque de humor apurado.

"Entrámos numa nova era em que o mercado e o digital permitiram esta brecha para uma mudança sem igual com a publicação de novas vozes, novas perspetivas, novos géneros literários, o que é uma lufada de ar fresco na nossa literatura tão encerrada em si mesma e que continua a ser marcada por uma forte elitização. Mas o panorama continua ainda muito obsoleto e estagnado, o que talvez seja o maior problema, não há espaço para que autores/as sem nome firmado e fora das chancelas mais consideradas consigam penetrar", considera.

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Recorrendo ao tal humor, à hipérbole e ao exagero, Helena analisa de forma mordaz as mudanças de paradigma no mercado editorial, os sucessos instantâneos e a difícil jornada de um autor em Portugal. No entanto, confrontada sobre qual a forma que acha que o livro pode ser acolhido no segmento, não teme ferir susceptibilidades. 

Helena Magalhães lança "Atos de Desobediência", um livro sobre crescimento pessoal Flash
"Atos de Desobediência", novo romance de Helena Magalhães, já nas bancas Flash

"Para mim a arte, nas suas diversas formas, tem de refletir, questionar e também criticar as estruturas sociais, políticas e culturais do seu tempo e já o fiz noutros livros, quer no 'Ferozes', quer no 'A Devastação', se neste último em que expus e critiquei os abusos sexuais nos lares católicos de raparigas, ninguém se sentiu incomodado ou se interessou assim tanto pelo assunto, não creio que uma sátira à hipocrisia do mercado literário português vá ferir suscetibilidades, não quando acho que está feita com humor, ironia e exagero."

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No entanto, e apesar de a crítica ao meio ser um dos motores da nova publicação de Helena Magalhães, este é, por vezes, um parêntesis num livro tão duro quanto comovente, em que a personagem Glória nos mostra como tenta entender o seu caminho, que começou num bairro humilde, numa família com as suas lacunas, que marcaria para sempre a forma como se relacionaria com o outro. E, ponto chave, como é que os traumas do passado nos perseguem, até nos dispormos a enfrentá-los, compreendê-los e a viver com eles. Um livro que se lê num trago, mas com profundidade e que marca também uma mudança no perfil da autora, que começou com dois romances definidos como mais 'leves', como por exemplo 'Raparigas como Nós', e foi trilhando uma mudança, que acompanha as suas próprias leituras, maneira de estar na vida e gostos pessoais. Um caminho nem sempre fácil e no qual um dos grandes obstáculos que encontra é o preconceito.

Helena Magalhães lança "Atos de Desobediência", um romance sobre traumas e hipocrisia no mercado literário Flash
Helena Magalhães lança "Atos de Desobediência", um romance sobre amadurecimento e os desafios da escrita Flash
Helena Magalhães lança "Atos de Desobediência", livro sobre crescimento pessoal Flash
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"Continua a haver muito preconceito no nosso meio literário, os autores/as são engavetados e é muito difícil sair dessas gavetas onde somos encaixados e com as quais muitas vezes não nos identificamos porque nos castram. Claro que esta é a minha experiência, eu mudei de editora porque precisava insanamente de mudar de gaveta para manter viva a minha vontade de escrever, mas outros autores/as em circunstâncias iguais poderão não sentir na pele o mesmo preconceito. Mas isso também não me desanima, não escrevo para provar nada a ninguém nem com o objetivo de desafiar rótulos, se o fizesse corria o risco de tornar a minha escrita artificial e presa na sua missão."

Helena Magalhães Flash
Helena Magalhães é fundadora do Bookgang Flash
Autora faz curadoria literária Flash
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Apesar de todos os 'ses', Helena Magalhães - que além de escritora é fundadora do maior clube do livro em Portugal, o Bookgang - admite que esta é a grande paixão que dá fôlego à sua vida, numa altura, em que, tal como a própria Glória, de 'Atos de Desobediência', questiona muitas vezes o seu lugar no mundo, na sociedade, e o seu papel enquanto mulher e escritora.

" O meu maior medo é um dia perder esta obsessão que me mantém viva porque ser escritor não é algo que se queira ser, acredito que é algo que não se pode evitar ser, que nos controla, nos estrangula, mas que no meu caso também me salva porque quando escrevo e penso e imagino, liberto-me do meu próprio corpo e das minhas limitações (...) Eu escrevo porque estou viva, mas também estou viva porque escrevo, é o que me move, às vezes escrevo movida pela raiva, outras pelo tesão, pela felicidade, pela tristeza, também pelo aborrecimento e pelo tédio, ou pela solidão, é a minha metralhadora, noutras vezes é o meu ventilador mecânico, o meu desfibrilhador, o meu ansiolítico, noutras é apenas algo que me deixa simplesmente animada e feliz, que me diverte."

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O percurso tem as suas pedras e nem sempre para a autora é fácil encontrar motivação para o trilhar. "Houve momentos em que estava tão desiludida e me sentia tão fracassada que foi muito difícil manter a motivação, a sanidade e sair da cama todas as manhãs". No entanto, a tal força que a move faz com que não desista e que, no final, vença sempre o desejo de escrever uma próxima história. A próxima já está em curso, mas por agora é tempo de saborear os sucessos de 'Atos de Desobediência'.

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