
Quero que me protejas do que me ataca
mas também quero que me deixes saber como me defendo do que ataca.
Olha-se para a vida como se olha para um filho: sem saber o que fazer para que o tempo pare para sempre, para que para sempre possamos viver aquele momento, aquele exacto instante em que somos felizes. Sem saber quando devemos deixar ir, deixar voar, deixar até cair, para que chegar mais longe seja possível, para que crescer seja possível. Queremos tanto ver um filho crescer como queremos que não cresça, que fique assim, o nosso menino, o nosso bebé, à nossa procura pela casa, agarrado às nossas pernas para se manter feliz.
Olha-se para a vida como se olha para um filho.
Quero que me desejes como um louco
mas também quero que me acarinhes como um louco.
O equilíbrio é banha da cobra, um conto de fadas que nem sequer tem um final feliz. Para que interessa estar sempre certinho se a euforia acontece depois das regras, no final da curva — e nunca no meio da recta? Eu quero a curva e a recta, o precipício e a várzea, acalmar aqui e excitar ali, não saber o que esconde a porta que vem a seguir e mesmo assim saber que não trará a dor absurda, a dor incomportável. Só o fim da esperança não se comporta, e é também quem não se comporta que nunca perde a esperança.
Olha-se para a vida como se olha para um louco.
Quero ser aquela a quem apontam o dedo
mas também serei sobretudo a que nunca um dedo apontou.
O juízo dá trabalho e é oco. Somos de uma moralidade volátil, de uma dignidade interesseira: defendemos como certo o que nos faz bem, e é basicamente tudo. E é mesmo. É claro que magoar não pode ser o caminho. Nem desrespeitar. Muito menos mentir. Mas quando a nossa sobrevivência depende de uma fuga ao correcto, talvez aí percebamos que o correcto é o que pode salvar-nos, e que a salvação às vezes pode magoar — mas esperemos que não, esperemos que não. Justo é ser feliz. Ponto. Não falta quem seja capaz de ajuizar quem ama; o que falta é quem saiba amar independentemente de todos os juízos.
Olha-se para a vida como se olha para a lei.
(não é por acaso que ela é cega).
Zelar: v. O mesmo que amar: quem ama protege quem ama, pois é essa a mais eficaz forma de se proteger.