Pedro Chagas Freitas, Dicionário do Amor, crónica, amor, escritor
Quando chegam os problemas normalmente atiro-lhes prazer para cima, e os problemas deixam de ser problemas e passam a ser prazer.
E quando o prazer acaba?
Voltam os problemas.
Isso é um problema.
É. Mas passa.
Passa?
Com o prazer.
...
Já te tinha dito.
...
Somos então problemas ou prazer, é isso?
É mau?
Há coisas piores.
Não haver prazer.
E não haver problemas. A existência de problemas é o que motiva o prazer. O prazer pode até ser, em muitos casos, prazer apenas porque resolve problemas.
...
Faço-me entender?
A perfeição é uma seca. Quando tudo corre bem alguma coisa está mal. Não suporto quando tudo corre bem.
O tédio é um problema.
O tédio nem problema é. Se fosse problema seria a antecâmara do prazer. Assim é a antecâmara de nada. Um não-acontecimento.
A ausência de problemas é o tédio.
A ausência de problemas é a morte. Quem nada tem para resolver nada tem para viver.
O tédio é a morte.
O tédio é pior do que a morte. A morte chega e acaba com tudo. O tédio chega e acaba connosco e deixa tudo o resto a continuar à nossa volta. Ficamos parados a ver o movimento dos outros.
Entedio-te?
Mexes comigo.
O amor é mexer. É movimento. O amor é então o contrário do tédio, o contrário do nada. Não é por acaso que se diz que o amor é tudo. Porque o é.
Saíste. E nem um beijo. Simplesmente foste. Tinhas certamente muito em que pensar, a empresa, as preocupações, as contas para pagar, os desafios que te esperam, mas foste sem um beijo. Deixaste um até logo distante, que quando foi falado já não estava aqui.
Eu sei: a culpa é minha. A culpa é minha e desta minha cabeça que não pára de pensar. Que não pára de questionar. Que não pára de querer entender tudo e mais alguma coisa.
CARTA AO PREGUIÇOSO ARREPENDIDO: Meu grandessíssimo burro, como querias tu que a paixão resistisse, que a nossa vida, tal qual a sonhámos resistisse, se simplesmente te deixaste cair na preguiça? Como?
Somos do tamanho do que impedimos em nós para magoar quem amamos. Em mim impeço tudo. Se sei que te pode magoar, paro. Se sei que te pode magoar, respiro, acalmo. E não faço.