
Vivemos um tempo terrível que nos convida a desistir de pensar como é a nossa política, pondo o assunto de lado para não perdermos a nossa saúde mental para desejarmos acreditar que estamos dentro de um pesadelo que um destes dias terminará.
Este destrambelho começou há duas décadas quando, na câmara de Lisboa aconteceu um espetáculo tão degradante que agora vivemos foi desencadeado já não sei qual o motivo. A verdade é que o então Presidente da autarquia Carmona Rodrigues foi constituído arguido, no âmbito de um processo-crime, e toda a vereação se demitiu. Carmona Rodrigues viu-se obrigado a sair. Passados uns tempos, deu-se o julgamento e o pobre homem, depois de achincalhado pelos partidos da oposição e pelo seu próprio partido, foi considerado inocente pelo tribunal que apreciou as provas.
Desde então, basta uma ameaça de escândalo e instala-se a confusão. Há para todos os gostos. Na Madeira, o presidente do governo regional foi constituído arguido e marimbou-se para essa qualidade, percebendo o que a casa gasta. Acendeu-se um vendaval à sua volta. Tal como em relação aos governos os jornais fazem subir a temperatura, forçando pela algazarra que provocam, a demissões sucessivas. Arguido, no atual nível medíocre e destemperado do nosso conhecimento, é sinónimo de condenado, e os gritos de indignação sobem aos céus.
Depois de percorrermos este caminho de lamaçal perpétuo, em que os principais partidos levam boa parte do seu tempo insinuando terríveis crimes cometidos pelos seus adversários, entrámos num novo domínio que tem mais a ver com as rixas de feiras do que com o bom senso. Agora chegou-se aqui: Luís Montenegro cometeu a imprudência de não se explicar devidamente sobre uma sua empresa. Os jornais pularam de alegria. Os partidos excitados desataram em uivos de alcateia e passadas semanas de gritar muito e nada fazer pelo País, o governo já não governa, decidiu acudir a defesa do seu patrão. O que tem isto de original? Chegámos a um ponto em que já não importa ser arguido. Não se lhe conhecem crimes. Montenegro está a comer o pão que o diabo amassou por não ter dado respostas claras. Como se os outros partidos fossem exemplos de clareza. Sabe-se que não o são. Ou melhor, sabe-se que são farinha do mesmo saco.