A Gaiola Dourada que o ex-banqueiro Ricardo Salgado montou para se proteger
Recebe uma pensão dourada de 23 mil euros por mês. Vive num casarão de 20 milhões de euros em frente ao mar em Cascais. Não aparece em tribunal com a desculpa dos perigos da Covid-19, mas aparece a gozar férias, sem máscara, num resort na ilha Sardenha. Tudo isto numa altura em que os seus advogados o querem dar como demente e sem memória. As incríveis histórias do "Dono Disto Tudo".
Tudo aconteceu há sete anos. Era verão.
O dia 3 de agosto 2014 foi a data em que o Banco de Portugal (BdP) decretou o óbito do Banco Espírito Santos (BES), uma instituição familiar centenária que não resistiu a uma sucessão de escândalos financeiros e acabou de forma abrupta.
Dias depois de o regulador ter afastado o banqueiro Ricardo Salgado da presidência do banco, e de lá ter colocado o gestor Vítor Bento, o então governador do BdP, Carlos Costa, anunciou um resgate no valor de 4.900 milhões de euros à instituição; comunicou o fim da marca BES enquanto banco privado; e apresentou o seu sucessor, supostamente livre de ativos tóxicos: o Novo Banco. Só que toda esta operação, veio a confirmar-se, ao longos últimos sete anos, ter sido uma suposição… pueril. Tão pueril que a fatura já vai no dobro do valor inicialmente estimado.
Para trás neste processo ficou um protagonista que não se livra da fama de ser "o mau da fita" - Ricardo do Espírito Santo Silva Salgado -, hoje com 77 anos, o empresário que ficou conhecido do grande público como "O Dono Disto Tudo", epíteto pelo qual era tratado pelos colaboradores mais próximos no extinto BES. E sobre quem vamos saber falar neste artigo.
Saiu de cena do piso do Conselho de Administração do antigo banco, na avenida da Liberdade, em Lisboa, mas nunca deixou de ser notícia. Tanto que, há poucos dias, foi fotografado em férias, passeando na luxuosa ilha italiana da Sardenha, depois de não ter comparecido em tribunal, onde está a ser acusado de vários crimes, em processos onde é acusado de ser o cérebro de uma associação criminosa, com fraudes internacionais, pagamentos ocultos e supostos desvios de dinheiros, tendo desnatado o banco em mais de mil milhões de euros.
MANSÃO À VENDA
Nas semanas a seguir ao seu "despedimento" (a 13 de julho de 2014) do BES, Ricardo Salgado refugiou-se na sua mansão de Cascais, com vista direta para o oceano Atlântico e capela privada, para rezar aos santos ou confessar pecados. Quatro anos e meio, quando as autoridades iam apertando cada vez mais o cerco ao património do casal Salgado, Ricardo e a mulher, Maria João, decidiram pôr à venda, por 20 milhões de euros, o casarão cor de rosa, junto à Boca do Inferno, que estava em nome da Sociedade Casa dos Pórticos.
A casa que tinha sido a residência oficial de Maria da Conceição Cohen do Espírito Santo Silva, a anciã matriarca do clã Espírito Santo, à época uma das famílias mais poderosas de Portugal, foi implantada num terreno com quase 9 mil metros quadrados, tem 1.400 m2 de área construída mesmo em frente ao mar e foi um dos poucos bens do "Dono Disto Tudo" que escapou ao arresto judicial. Vários sítios referem que ainda tentou baixar o preço do imóvel, mas a venda caiu por terra e a mansão continua a ser a residência oficial do arguido mais famoso de Portugal.
PENSÃO DOURADA
Na posse de uma gaiola dourada, com muros altos e câmaras de se segurança onde se refugiou, Ricardo Salgado garantiu meios para pagar as suas despesas e assegurar que não lhe faltava pão na mesa.
Inicialmente conseguiu, através do Fundo de Pensões do BES, que passou para o Novo Banco, uma reforma ilíquida de 90 mil euros mês. Só que, quando o valor auferido pelo banqueiro despedido se tornou notícia, o fundo de pensões do Novo Banco mexeu-se e avançou para tribunal para lhe cortar a pensão. E conseguiu.
Ricardo Salgado, e os outros nove ex-gestores do BES que tinham os mesmos benefícios (incluindo o denunciante primo do banqueiro, o polémico José Maria Ricciardi e o ex-ministro socialista da Economia Manuel Pinho), viram a justiça fazer-lhes um corte radical nos rendimentos. Primeiro passaram-lhe a reforma para 11.500 euros brutos por mês, depois para 29 mil e por fim os gestores do fundo de pensões juraram que não podiam pagar mais de 23.542 euros. E assim ficou, até hoje.
DEMÊNCIA? "CHECK!"
Esse valor, e mais um dinheiro que tem guardado no seu pé-de-meia, terão servido agora, seis anos depois, para as férias que o ex-"Dono Disto Tudo" está a gozar num resort na ilha mediterrânica da Sardenha. Mas a isso já lá voltamos.
As férias de luxo do banqueiro, com fotografias recolhidas à socapa, por um compatriota que o reconheceu, estão a incendiar as redes sociais, as mesmas onde se espelha a estupefação em relação aos argumentos que os advogados de defesa do ex-banqueiro agora apresentam para ele não comparecer nos julgamentos dos vários processos em que é arguido: "Demência!" É verdade: Demência, na sua variante Alzheimer.
Com o cliente a gozar umas memoráveis férias em Porto Cervo, a localidade da Sardenha que é o refúgio predileto de descanso de vários bilionários de todo o mundo, os advogados Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squillace pedem que a justiça diligencie no sentido de submeter Salgado a perícias de foro neurológico, "estritamente necessária e obrigatória" devido a "lapsos de memória" e que confirmarão "um quadro clínico de síndroma demencial, nomeadamente uma Doença de Alzheimer".
Exames médicosa que o arguido acusado de três crimes na famosa Operação Marquês já fez em clínicas privadas, como o Centro Neurológico Sénior e no Centro clínico da Fundação Champalimaud, e que, supostamente com uma segunda opinião, demonstrarão que padece de uma grave deterioração do seu estado mental.
NO RELAX, SEM MÁSCARA
A prova de que Ricardo Salgado poderá estar, de facto, "baralhado", é que a desculpa que deu para não comparecer em tribunal, para responder perante a justiça em Lisboa, se devia à pandemia de COVID-19, com receio de contágio viral.
Livre de um possível contágio de Covid-19 nos corredores e salas super povoados de todo o tipo de pessoas de classes sociais variadas no Campus a Justiça, em Lisboa, o ex-banqueiro deu uma escapadinha com Maria João, a convite do genro, Phillippe Amon, para gozar umas férias na "segura" ilha de Sardenha e sem a obrigação de se submeter às audiências, de forma a salvaguardar-se dos riscos associados à COVID-19, a que são submetidos todos os turistas que ali aterram com idade inferior a 70 primaveras.
Longe de Portugal e dos olhares da justiça nacional, Ricardo Salgado esqueceu-se dos perigos do maldito vírus que tanto teme e foi "caçado" por um turista português que o fotografou a passear na Piazzeta de Porto Cervo, com uma loja Prada de fundo… e sem máscara.