Onde está Zé do Pipo? Quatro anos depois, a Justiça ainda não fechou um dos processos mais misteriosos de Portugal
O mar nunca devolveu o corpo do cantor. A terra também não. Afinal onde está o artista pimba que desapareceu no dia em que as autoridades responsáveis cometeram erros sobre erros e depois tentaram tapar a trapalhada? Todos presumiram que, por ser bipolar, e ter ameaçado que se matava, atirando-se ao mar, que o fez. E se não fez? E se foi morto ou raptado? Eis um dos mistérios de Portugal...
Há uma frase muito recorrente entre os pescadores - e dita também por todos aqueles que residem junto aos oceanos: "O que o mar leva, o mar devolve". Só que essa verdade popular não foi a realidade para o cantor Nuno Batista, mais conhecido pela figura de Zé do Pipo, que, aos 40 anos, na madrugada de 6 de novembro de 2018, terá desaparecido misteriosamente de Peniche.
Quatro anos depois, nem autoridades de investigação, nem família, sabem exatamente o que aconteceu ao cantor pimba que se evaporou. O seu cadáver nunca fui localizado no mar. O seu corpo nunca foi encontrado em terra. Nenhuma autoridade rodoviária o viu a circular. Nenhuma pessoa o terá avistado.
Nuno Batista nunca mais foi visto: vivo ou morto. Este, a par do desaparecimento do menino Rui Pedro Teixeira Mendonça em 1998, da pequena Maddie McCann em 2007 ou do idoso João Marinho, que foi visto pela última vez a 19 de junho de 2019 em Brejos de Azeitão, são alguns dos mistérios que continuam por resolver em Portugal e para os quais a opinião púbica gostaria de ter uma explicação.
A TRAPALHADA QUE DEITOU POR TERRA QUALQUER INVESTIGAÇÃO
O sumiço de Nuno Batista nem consta na página dos desaparecidos em Portugal, aquela onde estão os casos bicudos que a Polícia Judiciária (PJ) não consegue resolver. E tudo porque, na manhã e tarde de 6 de novembro de 2018, as autoridades policiais (entenda-se PSP) e marítimas (capitania do porto de Peniche), com o apoio dos bombeiros locais, montaram a investigação mais trapalhona de que há memória em termos de busca de alguém desaparecido de forma misteriosa.
A PJ acabou por nunca entrar em ação ou sequer tomar conta da investigação. Também pouco havia a fazer no misterioso desaparecimento de Zé do Pipo, como ficou conhecido o episódio, tamanha a contaminação de provas que se gerou em poucas horas, às mãos dos vários agentes das várias autoridades intervenientes no processo. Todos, alegadamente, experientes. Tão experientes que até a viatura Opel Astra devolveram à mulher do desaparecido sem realizarem as obrigatórias perícias.
O que um procurador do Ministério Público do Tribunal de Peniche conseguiu apurar, num processo que ainda não foi encerrado, é que Nuno Batista saiu de sua casa, na aldeia do Vau, em Óbidos, pelas 14h de dia 5 de novembro. Terá dito à mulher que ia à Caixa Geral de Depósitos (CGD) de Óbidos, depois à farmácia e, a seguir, nunca mais alguém soube do seu paradeiro.
Duas horas depois, a mulher, Celeste Roberto, estranhando a demora, liga-lhe, mas o telemóvel do cantor já está desligado. A família começa então a procurá-lo: primeiro em Óbidos, onde vivia, depois em Peniche, na zona onde residem os pais.
SOFRIA DEPRESSÃO CRÓNICA, ERA BIPOLAR E AMEAÇAVA ATIRAR-SE AO MAR
O homem que dava vida ao popular cantor Zé do Pipo, que interpretava temas musicais marotos e era acompanhado por bailarinas semi despidas a que chamava 'Piponetes', tinha sido diagnosticado com "bipolaridade muito avançada". Nuno tinha deixado os palcos a 11 de outubro, dias antes do desaparecimento, por ordem expressa do médico. Sofrendo de uma depressão crónica, afirmava com frequência à família que se ia "atirar ao mar".
Nuno Batista terá chegado mesmo a dizer a Celeste que "se um dia o fizesse, era para ela o perdoar". "Deixou de ter intimidade com a família, deixou de lidar com a família. Dizia diretamente à família que não sentia nada por nós, nem pela vida", contaram os pais do cantor, Carlos e Rosa, no início de 2019, em lágrimas, numa entrevista televisiva ao apresentador Manuel Luís Goucha, da TVI.
Hoje, passados quatro anos, os pais de Nuno Batista estão mais conformados com o desaparecimento do filho. Mesmo sem terem tido acesso a um corpo para fazerem o luto. Quem o confirma à The Mag é Joaquim Valverde, vizinho e amigo do casal Carlos e Rosa, e pai de Sónia Pinho, concorrente do 'Big Brother', na TVI, lamentando a tragédia.
AS PERGUNTAS SEM RESPOSTA Ora, como é que nunca foi encontrado nenhum vestígio de Nuno Batista?
Porque é que o telemóvel, que esteve várias horas desligado, voltou a ligar-se pouco depois da meia noite do dia do desaparecimento e foi recebendo chamadas dos familiares até ficar sem bateria?
Como foi possível as autoridades terem dado o desaparecimento de Nuno como sendo um suicídio sem terem explorado outras hipóteses?
Por que razão a capitania do porto de Peniche entregou a viatura Opel Astra com a carteira, as chaves, o telemóvel e o casaco de Nuno Batista à família sem terem feito perícias?
E se Zé do Pipo foi vítima de um homicídio ou mesmo de um rapto No pontão junto à praia do Portinho da Areia Sul, o local onde o cantor aprendeu a nadar com a ajuda da mãe quando era criança?
Como se as trapalhadas não tivessem sido suficientes no dia oficial do desaparecimento de Nuno Batista, as autoridades de investigação destruiram qualquer possibilidade de investigar o que realmente se passou. Deixaram Celeste Batista vender primeiro o carro do marido no OLX, depois o computador do cantor, onde estavam ficheiros pessoais e muitas das letras que tinha composto para Zé do Pipo. Celeste mandou limpar o disco rigído do computador e com ele desapareceu o histórico dos últimos tempos de vida do artista.
Na altura, a revista 'TV Guia' falou com Celeste Roberto Batista, que defendeu acreditar na tese de suicídio e adiantou saber que terá de esperar muitos anos para reorganizar a sua vida. "É uma vida em suspenso. Tenho de aguardar dez anos até ser declarada morte presumida." Só depois de decorrido esse prazo Celeste poderá tratar das partilhas, fazer o registo de bens ou mesmo casar novamente, se assim entender. Faltam seis anos...
CANTOR, DESESPERADO, FEZ UM TRATAMENTO DE AUTOSANGUE QUE É PROIBIDO
A equipa de reportagem da 'TV Guia' apurou ainda, através de declarações proferidas pela mulher do artista, que este tinha melhorado significativamente desde que iniciou, em finais de 2017, um tratamento que tem tanto de revolucionário quanto de polémico, uma vez que a terapia alternativa não é bem vista pela classe médica. "O Nuno parou o tratamento com os químicos [para tratar a doença bipolar] em novembro de 2017, começou a fazer um tratamento de autosangue [ou auto-hemoterapia, uma terapia que consiste na aplicação intramuscular de 5 a 20 miligramas de sangue extraído do próprio paciente que é aplicado diretamente no músculo do braço ou da nádega e desperta a adrenalina no corpo] numa clínica da Marinha Grande", revelou então a mulher de Zé do Pipo.
Celeste Roberto Batista adiantou ainda que "o Nuno fez dez tratamentos de autosangue e, no fim, parecia outra pessoa", avançando informações precisas de como essa terapia, que não é bem aceite pela classe médica, mudou radicalmente a vida do músico.
"Em janeiro [de 2018] ia todos os dias ao ginásio. Nunca ia, com a doença às vezes mal se mexia, e, de repente, ia todos os dias fazer exercício. Avisei-o que era demais e até brinquei com ele, dizendo-lhe que qualquer dia, de tanto exercício, ficava invisível". Não ficou, mas decidiu desaparecer...