
Polémico e sarcástico em vida, Pinto da Costa continua a surpreender mesmo após a sua morte, sendo que o derradeiro capítulo se prende com as questões relacionadas com a sua herança. De acordo com a edição desta segunda-feira do Correio da Manhã, numa reviravolta inesperada, o antigo dirigente portista decidiu fazer, em dezembro do ano passado, uma alteração ao seu testamento para deserdar o filho mais velho, com quem só fez as pazes no fim de vida. Na última versão do documento, redigida em outubro, o nome de Alexandre ainda lá constava, mas o testamento final deixa-o sem nada, o que torna Joana, a filha mais nova, na sua legítima herdeira, assim como a mulher, Cláudia Campo, que também tem direito a uma parte da fortuna.
A questão é que, oficialmente, essa fortuna não existe, com Pinto da Costa a deixar à filha um cofre cheio de nada. Em seu nome, no momento da sua morte, o ex-presidente do FC Porto tinha apenas um apartamento T1. Também as muitas ações de que era detentor dos dragões foram vendidas meses antes da sua partida, sendo que os milhares de euros desapareceram sem deixar rasto. "Oficialmente, a verdade é que não há nada, zero, só uma casinha, que vale meia dúzia de tostões", diz uma fonte, reforçando que estamos a analisar as coisas de uma perspetiva meramente oficial, uma vez que conhecidos são também os jogos de bastidores levados a cabo pelo portista, e que deixam agora todos a questionar onde pára, afinal, o dinheiro que amealhou ao longo dos anos, sendo certo que, na última década, recebia entre 800 mil euros e 1 milhão de euros anuais, declarados, da parte do clube. "Nunca lhe vimos grandes luxos e um estilo de vida acima da média, nem viagens nem nada. Ora, se não investiu em imobiliário, é legítimo que se questione onde pára o dinheiro."
O testamento pode ser, apenas, uma migalha entre a fortuna escondida de Pinto da Costa, sendo que neste documento oficial quem se fica a rir é o neto Nuno. Era conhecida a relação de grande cumplicidade entre o jovem e o avô, e o carinho que o jovem lhe dedicou ao longo dos últimos anos, ao contrário do seu próprio pai, Alexandre, que virava costas a Pinto da Costa quando este mais precisava. Por isso, o legado mais valioso fica agora nas mãos de Nuno: os direitos da utilização do nome do avô, que se podem traduzir numa espécie de pensão vitalícia, se tivermos em conta a figura histórica que foi o presidente do FC Porto e a forma como o seu nome será sempre perpetuado ao longo dos anos. Esta terá sido também uma forma de premiar o jovem pela entrega genuína e isenta de interesses com que pautou a relação com o avô, que tinha como um ídolo, e também de garantir que o seu nome perdura no tempo. "Pinto da Costa conhecia os filhos, com todas as qualidades e defeitos. E se há pessoa que iria sempre zelar pelo legado dele, com orgulho e carinho, essa pessoa é o Nuno", diz uma fonte.
MANOBRAS PREPARADAS EM VIDA
No meio de tudo o que se possa dizer, uma coisa é certa: Pinto da Costa tinha plena consciência da sua condição de saúde e do tempo de vida que lhe restava, tendo tido muito tempo para se aconselhar juridicamente em relação ao que havia de fazer acerca do que deixava em testamento.
Além disso, publicamente com ele as coisas nunca foram muito claras. Enquanto a fortuna de futebolistas ou caras conhecidas é mais fácil de medir, sendo muitas vezes elencada em sites como a 'Forbes' ou semelhantes, com Pinto da Costa nada foi nunca preto no branco. Sabia-se o que era obrigado a declarar, ou seja, o que recebia oficialmente do FC Porto, mas ainda há pouco tempo, por exemplo, auditorias levadas a cabo por André Villas-Boas nos Dragões revelavam um buraco de milhões deixado por Pinto da Costa e outros administradores da SAD, que usariam os cofres do clube para pagar despesas de cariz pessoal, como férias, compra de joias, contas do supermercado e até obras em casa, pelo que o buraco pode ser mais fundo do que isso. O caso foi endereçado ao Ministério Público e a verdade é que estas, assim como outras investigações que decorrem, poderiam ainda comprometer a herança oficial do portista. "Para já, há muita cautela nesta análise ao testamento. Não vamos acreditar que, de repente, Pinto da Costa era uma espécie de pobrezinho que tinha apenas um T1", desmistifica a fonte, assegurando que dinheiro sempre foi um tema ao qual o antigo líder azul e branco fugiu em vida.
Numa das grandes entrevistas que deu, ao 'Expresso', em 2010, foi questionado sobre o facto de ter recebido 700 mil euros de ordenados da SAD e se, por isso, se considerava uma pessoa bem paga. Perante a questão contornou o assunto.
"Não faço ideia se isso é verdade. Sinceramente. Sei é que de impostos pago uma loucura. Este ano, vou ter de pagar 70 mil euros - e não tenho dinheiro no banco para o pagar, mas hei-de pagar, porque não quero notícias a dizer que o presidente do FC Porto foge ao fisco. E sei que certamente pago mais impostos que os Gato Fedorento, que, li, no contrato com a PT receberam mais de dois milhões de euros num ano. Não tenho nenhum jogador a ganhar metade disso".
Questionado, de seguida, sobre se sabia ao certo quanto dinheiro tinha no banco, Pinto da Costa seria peremtório. "Tenho sempre pouco."
No entanto, tudo aponta para um outro sentido. Conhecida é a investigação do Ministério Público que tenta seguir o rasto a perto de 40 milhões de euros em comissões na transferência de jogadores do FC Porto, num esquema que terá sido levado a cabo pelo filho de Pinto da Costa, e com a conivência do pai. Depois disso, os dois acabariam por cortar relações, sendo que a questão se mantém: onde está este dinheiro. No seu livro, 'Azul Até ao Fim', o portista deixou o recado: de nada valia que se procurassem contas em seu nome fora do país, pois não tinha dinheiro escondido em paraísos fiscais. Mas ninguém fará caso do aviso: começou oficialmente a caça à fortuna!