
Foi já há dois anos, completados esta quarta-feira, que Juan Carlos de Borbón abandonou o país que regia, numa situação potenciada pela investigação de que fora alvo acerca dos seus negócios na Arábia Saudita.
Desde então, o rei emérito de Espanha tem vivido à grande nos Emirados Árabes Unidos, mais concretamente na capital do país, Abu Dhabi, numa mansão avaliada em mais de 11 milhões de euros, com vista para o mar e uma piscina infinita. O local foi eleito muito devido à privacidade de que pode gozar, mas também à sua relação muito próxima com o xeque Mohamed bin Zayed Al Nahyan, presidente dos Emirados Árabes Unidos.
É ali Juan Carlos tem feito a sua vida no Médio Oriente, longe de quaisquer incómodos, e com condições de vida extraordinárias. Mas afinal quem é Mohamed bin Zayed e qual o motivo da confiança que o antecessor de Felipe VI tem consigo?
CARISMA E PODER
Para chegar à resposta é necessário recuar até à década de 1980 quando Juan Carlos conheceu o seu pai, Zayed bin Sultan, o primeiro presidente dos EAU, devido a uma viagem oficial àquele país, que fez juntamente com a rainha Sofia.
Estabeleceu com ele uma relação de cordialidade que se estenderia a outros membros da família como o seu filho, Khalifa bin Zayed, o seu sucessor até à morte em maio passado, e o meio-irmão que se seguiria, Mohamed bin Zayed. Na verdade, já desde 2014 que Mohamed bin Zayed controlava muitos dos destinos do país, dado que nesse ano, Khalifa bin Zayed sofreu um AVC que o deixou debilitado, tendo imediatamente posto em prática algumas das suas ideias.
Os apoiantes de Mohamed encaram-no como uma figura de poder modernista e com visão para o futuro e como alguém dotado de qualidades inegociáveis para o cargo que ocupa. Como exemplo, é possível ler numa coluna de opinião no ‘Gulf News’, onde é descrevido como um homem "talentoso e carismático" que em pouco tempo demonstrou "liderança e sagacidade."
Mohamed bin Zayed é, como é apanágio dos líderes daquela região do globo, um homem muito poderoso e extremamente rico: controla 6% das reservas de crude do mundo, de acordo com a ‘Bloomberg’, tal como o quarto maior fundo de riqueza. Para além da riqueza, tem-se esforçado para criar uma imagem para o exterior que seja contrastante com o conservadorismo habitualmente associado aos líderes do Golfo.
PROGRESSIVO… MAS SÓ PARA ESTRANGEIRO VER
Ainda que os EAU sejam ainda considerados um país extremamente conservador com o Observatório dos Direitos Humanos a apontar falhas na liberdade de expressão, no tratamento de trabalhadores migrantes e na discriminação contra a comunidade LGBT, com penas de prisão previstas para indivíduos que pratiquem relações sexuais fora do casamento, ou para mulheres transgénero, que entrem em zonas reservadas a homens, Mohamed bin Zayed tem sido um dos atores que mais tem tentado transparecer um discurso de modernização em relação aos direitos das mulheres, tendo já sido adjetivado como um líder "feminista."
Efetivamente, por exemplo, nos Dia Internacional da Mulher de 2018, o líder dos EAU apontou num tweet que "a liderança e o empoderamento femininos são cruciais a qualquer sucesso nacional", sendo que a percentagem de mulheres no Parlamento está atualmente nos 50%, apenas atrás de quatro países.
Convém, todavia, assinalar que, ainda que a Constituição garanta direitos iguais entre homens e mulheres e a existência de algumas alterações constitucionais recentes neste sentido, a situação será algo distinta em termos práticos: quando a britânica Caitlin McNamara foi vítima de agressão sexual por parte de um representante do governo, foi advertida para que abandonasse o país e desistisse da acusação sob ameaça de ser presa.
Independentemente disto, a imagem que Mohamed bin Zayed tenta fazer transparecer dos EAU é exatamente de que se trata de um país que se pretende aproximar, a nível de mentalidades, das nações do Ocidente. Também aqui, ajudam as boas relações com figuras ocidentais, como é exemplo Juan Carlos.