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Margarida Rebelo Pinto
Margarida Rebelo Pinto Pessoas Como Nós

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O número mágico

A ideia de viver debaixo do mesmo teto com alguém que não ame e que não me faça feliz é-me tao absurda como atirar-me de um penhasco com asas compradas na loja do chinês.
10 de maio de 2019 às 07:00
Balões, balões de ar, capadócia, turquia
Balões, balões de ar, capadócia, turquia

Os casais felizes inspiram-me. Adolescentes aos beijos nos transportes públicos, velhinhos em banco de jardins, pinguins em vídeos no Facebook, tanto faz, gosto sempre de olhar para o mundo aos pares. Na verdade, nem o imagino organizado de outra forma que não seja baseada na fórmula do número mágico. O dia e a noite, o sol e a lua, a luz e a sombra, duas mãos, dois corações, dois olhos, duas pernas, duas asas para cada ave que cruza os céus.

Os casais felizes inspiram-me porque sou filha de um casal unido A ideia de viver debaixo do mesmo teto com alguém que não ame e que não me faça feliz é-me tao absurda como atirar-me de um penhasco com asas compradas na loja do chinês. e feliz há 60 anos. Casaram cedo, foram pais cedo, foram avós com energia, dançavam para os filhos e ainda hoje é quase visível um véu de amor e de ternura e que é uma coisa só deles. Existe uma grande diferença entre ser filha de um pai e de uma mãe e ser filha de um casal apaixonado e feliz.

Uma diferença que, só quem tem ou teve pais assim, sabe do que estou a falar. Os casais felizes são antes de mais, unidos. Unidos de corpo e alma, de sonhos e de projetos. Podem nem sempre querer as mesmas coisas ao mesmo tempo, mas conseguem quase sempre perceber o que o outro quer, o que é importante para o outro e depois agir em função disso.

Conheço vários casais felizes. Já todos tiveram crises, arrufos, zangas, momentos de tensão. Quase todos equacionaram em algum momento uma possível separação. E, no entanto, não se separaram. Aguentaram embates e tempestades, deixaram que o tempo resolvesse o que a vontade não conseguia. Os casais que se separam são casais infelizes. Casais que já não conseguem fazer bem um ao outro. O que não percebo são os casais infelizes que continuam juntos, mas isso é lá com eles. Antes a morte do que tal falta de sorte.

A ideia de viver debaixo do mesmo teto com alguém que não ame e que não me faça feliz é-me tao absurda como atirar-me de um penhasco com asas compradas na loja do chinês. Prefiro sonhar com o pleno rodeada de livros à lareira ou dar um passeio na praia de fones do que aturar a presença de alguém que não me traz aquele je ne sais quoi que me faz nascer borboletas pela casa e em empresta alegria aos dias. Um casal não se constrói sem emoção profunda, sem abraços que duram minutos, sem uma festa na cara e a certeza de que quando se ouve a frase, "não te preocupes, estou aqui, vai ficar tudo bem", é mesmo verdade.

Estar aqui, de corpo e alma, presente mesmo na ausência física, ir construindo uma vida a dois, tijolinho a tijolinho, saber esperar, saber ouvir, saber estar, saber ajudar, saber dar tempos ao tempo e espaço ao corpo, saber não cobrar, é tudo uma questão de treino e de vontade. E não chega gostar do outro. Se os dois não quiserem as mesmas coisas ao mesmo tempo, não há paixão que resista. Tem de existir uma alquimia que nos transcende quando gostamos de alguém porque tem muitas coisas que gostamos, mas, e sobretudo, porque não conseguimos explicar porque gostamos. Quando nos imaginamos a fazer tudo com aquela pessoa, desde andar de balão na Capadócia ou a experimentar uma receita de soufflé de peixe, então é porque olhamos para o outro como um par. E o mundo torna-se um lugar mais fácil.

Eu acredito no poder do número mágico. Acredito que a todo é maior do que soma das partes. Acredito na longevidade dos casais sensacionais. E acredito que todas as pessoas que a isso ambicionam e se isso merecerem, chegarão a esse lugar de paz e de harmonia. Entre gostar de estar com alguém e gostar de alguém existe um rio. Se sobre esse rio se construir uma ponte, esse caminho pode conduzir ao número mágico.

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