
A ferida começa por matar
a pele, à traição.
Depois vem o interior do sangue, o momento
em que a dor se cruza
com a veia.
Aos poucos a ferida transforma-se em nós, ou
nós na ferida, e acabámos por ser o que
a ferida é em nós, ou que somos nós
no espaço que ela ocupa.
A ferida maior não é a mais funda, só
a mais fina, a mais cirúrgica, a que quanto
mais pequena maior se sente.
A ferida não é um espaço
magoado; é um órgão.
Funcionamos, quando ela aparece, em função
do que ela é: do que ela pode não ser, do que
poderemos fazer para ela deixar de ser.
A ferida faz mover o mundo pela maneira
como faz parar: somos muito mais a
ferida do que a sua cura, e nada nos cura mais
do que uma ferida curada.
A ferida é uma felicidade
que deu errado. Como nós, sempre
que me dizes que não me queres,
e depois nos queremos a vida toda.
Rumo: s.m. Aquilo que só se encontra sem querer; nunca a felicidade foi combinada.