
Começou o julgamento do ano. O material mobilizado pelo Ministério Público que, agora, apresenta em Tribunal, configura para quem não conhece a prova, e só tem dele conhecimento pelas notícias, uma das mais graves situações que pode acontecer num Estado de Direito.
É certo que não envolve tantos milhões como outros casos mediáticos, nomeadamente o caso BES, a Operação Marquês e outros mais. Porém, se a memória não me falha, é a primeira vez que estamos perante um caso onde se responsabiliza criminalmente a teia do poder do Estado.
Numa linguagem mais directa, em que se sentam no banco dos réus um conjunto de altos responsáveis da administração pública que, a crer na Acusação, actuam com o fim comum de lesar os interesses do Estado do qual eram serviços com cargos de direcção.
Foi com processos como este, onde o Estado foi de tal modo minado por criminosos, que em Itália, na década de oitenta, se desmoronou a organização política daquele país. Porém, neste caso, quem comandava esse ataque era a Máfia, cujo poder tentacular e o seu percurso histórico permitiam melhor compreender aquilo que aconteceu.
Por outro lado, a verdade apresentada pelo Ministério Público é a sua verdade e não a Verdade no sentido absoluto do termo. Não passa de uma perspetiva sobre factos que concluiu serem de natureza criminal. Vamos ver se são.
É o tempo da defesa questionar a prova recolhida, interpretá-la, submete-la á crítica para deste confronto contraditório, o colectivo de juízes que está a apreciar o caso possa ser iluminado e produzir uma decisão justa. A ser provado aquilo que o MP apresenta, não pode haver mão leve.
O tribunal terá de levar em conta que é a primeira ameaça de um tipo de conduta criminosa que pode destruir a nossa organização política e administrativa. Caso não seja provada a acusação, tendo em conta a exposição publica dos arguidos durante tanto tempo, é da natureza humanista do Direito, a necessidade dos juízes contribuírem para o renascimento do bom nome dos agora acusados. Veremos no que tudo isto vai dar.