EXCLUSIVO: Afinal ainda moram na antiga casa. Ricardo Salgado e a mulher vivem inferno à porta, com as obras no Palácio que foi símbolo máximo de poder na família
Ricardo Salgado e a mulher têm autorização para continuar a residir na moradia de Cascais, mas sempre que passam a porta de casa são confrontados com aquilo que lhes pertencia e perderam: o imponente Palácio Cor-de-Rosa, que estava nas mãos da família há gerações e foi vendido por 14 milhões. A mansão está agora em obras totais e já nada resta do que era a propriedade mais famosa dos Espírito Santo, que se encontra entre o abandono e a reabilitação, à espera dos novos proprietários, todos poderosos. A The Mag by FLASH! foi ver como decorrem as obras de recuperação.
Os muitos turistas que passam, do outro lado do passeio, de olhos postos no mar de Cascais, não param duas vezes para apreciar as obras totais que decorrem mesmo em frente, num edifício imponente, ignorando que este também conta um bocadinho da história do país que visitam, e que durante várias gerações esteve nas mãos de uma das famílias mais importantes de Portugal, que construiu fortuna no setor da banca, ao mesmo tempo que via o seu status distanciar-se do do comum dos mortais: os Espírito Santo.
A casa dos Pórticos, ou Palácio Cor-de-rosa, na primeira linha do mar, era a mansão que confirmava o estatuto:dificilmente a família reunida poderia ocupar as suas 45 divisões, contemplar todas as obras de arte espalhadas pelos quatro pisos, entretanto arrestadas, e as crianças do clã poderiam facilmente jogar às escondidas no jardim durante um dia inteiro sem que alguma vez fossem encontradas, tal era a dimensão da propriedade, que entretanto já não está nas mãos de Ricardo Salgado e da mulher, e foi vendida por 14 milhões a uma empresa norte-americana.
A casa está agora em obras e só a fachada ornamentada recorda que em tempos aquele foi um símbolo de poder: os portões estão enferrujados, as palmeiras foram atacadas por uma qualquer praga e a placa que diz 'cuidado com o cão' já mal se lê, até porque há muito que os únicos animais que lá habitam são os passarinhos que atenuam o barulho infernal das obras, que dificilmente passará despercebido a Ricardo Espírito Santo e a mulher, Maria João Salgado, apesar dos vidros duplos da casa onde moram, que antes era uma continuação de todo este património faustoso e agora é apenas o último reduto dos tempos de luxo e opulência. Todos os dias, quando saem da moradia (ou quando saem) eles são confrontados, ao virar da esquina, com tudo aquilo que lhes pertencia e que entretanto perderam.
Para que quem não conhece a zona tenha uma noção, a propriedade é uma coisa a perder de vista, que ocupa um quarteirão inteiro: de frente para o mar, a famosa casa dos Pórticos, com piscina e um jardim elegante, com uma estrutura com colunas trabalhadas, que deverão manter-se. De um dos lados, na Rua da Nau a casa de Ricardo Salgado, no seguimento da propriedade, e do outro uma zona arborizada e um mais pequeno anexo, que provavelmente servia de guarida aos empregados, nos tempos áureos um pelotão.
Na zona traseira, a Capela do Sagrado Coração de Jesus, onde todos os domingos Ricardo Salgado mandava rezar uma missa e convidava família, amigos e todos aqueles que se quisessem juntar para assistirem à celebração. A capela está agora ao abandono e no site da Paróquia de Cascais anunciado que as missas estão suspensas, sem data de regresso, um grande ponto de interrogação à frente, assim como tudo o que, na prática, envolve a família que já foi a famosa 'dona disto tudo' e agora enfrenta os dias por que nunca imaginou passar, com Ricardo Salgado a ser julgado, dez anos depois do colapso do BES.
De lá para cá, já quase nada é a mesma coisa. A mansão de Cascais, antes tão movimentada, está agora numa pasmaceira, o portão quase sempre fechado a anunciar que as visitas são escassas. Apesar de a moradia da Rua da Nau também ter sido arrestada no âmbito do processo, Ricardo Salgado e a mulher têm autorização para continuarem a habitar na morada de família. Dos tempos áureos, mantêm agora os empregados mínimos, o essencial para deixar a casa em ordem, arranjar o jardim, que continua milimetricamente aparado, e prestar também cuidados a Ricardo Salgado, que padece da doença de Alzheimer. Em tribunal, Maria João já admitiu que o marido tem mais momentos de ausência do que de total consciência da realidade, perdendo-se, inclusivamente, na própria casa.
Apesar de o diagnóstico continuar a gerar tanto burburinho entre aqueles que dizem que agora dá jeito a Ricardo Salgado se esquecer, a imagem do antigo banqueiro na chegada ao Tribunal, no arranque do caso BES, era o de um homem visivelmente fragilizado, uma sombra da pose reta que conhecemos noutros tempos, o olhar perdido, os passinhos hesitantes de quem não sabe muito bem o que está a fazer. Face ao diagnóstico, ao facto de não conseguir responder a perguntas tão básicas como a morada de residência, e àquilo que já atestaram os peritos, Salgado não terá mais de marcar presença em tribunal porque, embora os problemas de saúde não apaguem o que está para trás, a presença de Salgado no julgamento levantaria questões éticas e morais, face tudo aquilo a que o neurologista do antigo 'dono disto tudo' já atestou.
"Nesta fase, precisa de um cuidador de 24 horas por dia durante o dia e noite. Não tem autonomia para as atividades básicas da vida diária", disse à SIC Notícias o neurologista que o acompanha, Joaquim Ferreira, acrescentando que, três anos após o diagnóstico da doença de Alzheimer, esta tem progredido, o que justificaria também o facto de Ricardo Salgado ter marcado presença no Campus da Justiça com um aspeto muito mais fragilizado do que da última vez que tinha aparecido em público, no início do ano, e com um dos olhos negros.
"As pessoas com demência ficam mais esquecidas, baralham-se, fazem confusões, passam a andar de forma diferente, caem e têm alterações de comportamento."
UMA PRISÃO DOURADA PARA RICARDO E MARIA JOÃO SALGADO
A doença do antigo banqueiro obrigou a mudanças profundas na vida de Ricardo Salgado e, principalmente, da mulher, Maria João, que se assume como a cuidadora de todas as horas. A progressão do Alzheimer levou a que muitas alterações tivessem de ser feitas na moradia onde o casal vive, até porque a casa é grande, os quartos ficam no piso superior e, nesta fase da doença, isso gerava motivo de preocupação.
Assim, a própria Maria João Salgado já assumiu perante o tribunal a necessidade de alojar o marido no piso inferior para evitar acidentes nas escadas e outras questões que poderiam colocar em causa a segurança do antigo banqueiro, que tem atualmente 80 anos.
"Está doente, a doença infelizmente tem progredido. O Ricardo tem dificuldade em fazer tudo sozinho... Eu tenho de estar com ele para ele ir à casa de banho. Durmo com ele e tenho de estar com atenção porque ele levanta-se de noite e não acende a luz. Custa-me dizer isto do meu marido, mas ele não tem independência nenhuma hoje em dia", explicou em tribunal, acrescentando que se reveza nos cuidados ao marido com outra funcionária especializada.
"A cuidadora dele sou eu e serei sempre, mas às vezes preciso de descansar. Fico sem dormir e já tenho recorrido a uma cuidadora em casa. O nosso quarto é no primeiro andar e arranjei-lhe um quarto cá em baixo para ele não ter de descer escadas e ir à casa de banho, porque tenho medo... Quando eu estou muito cansada, ele fica lá em baixo. Não tem nada a ver... Tinha um marido fantástico e hoje tenho um bebé grande para tratar."
Face à doença e às mudanças que se operaram na sua vida, os dias de Maria João Salgado são agora bastante diferentes daquilo que eram no passado. Não é que a sua vida social fosse de ostentação ou de festa em festa, uma vez que o casal sempre primou pela discrição, mas a companheira do antigo banqueiro sempre gostou de fazer alguns trabalhos solidários e preservava uma rotina que agora evita cada vez mais para não ser exposta aos olhares indiscretos.
No fundo, toda a dinâmica da família se alterou e pouco depois do colapso do BES até os filhos do banqueiro sentiram necessidade de se afastar da polémica, emigrando para outros países para não serem atingidos com estilhaços do caso, que dez anos depois ainda não está resolvido.
Atualmente, Ricardo Salgado e a mulher, Maria João, vivem, já o afirmaram, com uma mesada de 40 mil euros da filha Catarina, que é casada com Philippe Amon e vive na Suíça. Uma vez por ano, com autorização do Tribunal, é para o castelo do genro milionário que fogem para um período de férias em que, por uma semana, a mulher do antigo banqueiro terá alguma sensação de normalidade, certamente o mais próximo que pode encontrar dos tempos em que vivia em Cascais rodeada de filhos e netos e o Palácio cor-de-rosa ainda estava à distância de um curto passeio e não entaipado numas obras totais que em breve o deixarão nas mãos de um novo todo poderoso.