O que é feito de Tiago Dores, o 'Gato Fedorento' que ficou pelo caminho? Humorista 'virou à direita', deixou a televisão e distanciou-se dos colegas
Os icónicos 'Gato Fedorento' regressaram em versão podcast, mas o outrora quarteto fantástico está espartilhado, com Tiago Dores a não fazer parte da nova aposta. O grupo dividiu-se em 2015, altura em que o humorista alegou "razões familiares" para não integrar o projeto para o qual eram convidados na TVI. Desde então, ficaram três, sempre a trabalhar a par e passo, embora apenas Ricardo Araújo Pereira tivesse o lado mais exposto. Da cisão aos dias de hoje, entenda o que aconteceu ao grupo que marcou a história do humor em Portugal.O sucesso foi estrondoso e marcou uma era do humor em Portugal. Os Gato Fedorento estabeleceram-se em 2003 com um estilo muito próprio e um registo diferente do que até então era feito por cá. Eram quatro, Ricardo Araújo Pereira, José Diogo Quintela, Miguel Góis e Tiago Dores, e as suas piadas transformaram-se numa espécie de um mantra da Nação, repetidas até não se poder mais, arrancando gargalhadas dos mais diversos quadrantes da sociedade. A coisa era mais ou menos unânime: eles era jovens e tinham piada, o que rapidamente resultou num fenómeno de popularidade.
Foram anos de ouro para os humoristas, que acabariam por passar pelos principais canais televisivos com as suas séries a registarem sucessos de audiências. No entanto, quando em 2015, depois de alguns anos de ausência, assinaram pela TVI para fazer um remake de 'Esmiúça os Sufrágios' durante as Legislativas desse ano, o grupo já estava espartilhado: Tiago Dores apenas aparecia num episódio e anunciava, assim, a sua saída do grupo.
Não foi por isso surpresa para quem sempre seguiu os 'Gato' que ''Assim Vamos Ter de Falar de Outra Maneira', o podcast que agora traz o icónico grupo novamente para a ribalta, não conte com Tiago Dores, que se foi distanciando dos colegas.
À laia de piada, o assunto seria abordado, em 2021, na Renascença, quando Ricardo Araújo Pereira era questionado se estava, afinal, zangado com Tiago Dores. A resposta, ainda assim, foi peremptória. "Não. Nunca foi a nossa vocação aparecer à frente das câmaras, basicamente foi mais um acidente. No caso do Tiago ele tem mais que fazer, mas falamo-nos na mesma. Ele já recusou fazer isto em 2015 quando estávamos na TVI, portanto esta pergunta chegou com um atraso tão grande", respondeu.
Na verdade, apenas Ricardo o continuou a fazer, transformando-se numa estrela por si só, mas o brilho nunca foi a solo, com os três 'Gatos' a continuarem a trabalhar juntos: Araújo Pereira à frente das câmaras e Miguel Góis e José Diogo Quintela, como guionistas, nos bastidores.
Tiago Dores assume que o distanciamento foi apenas circunstancial e que nada teve a ver com ódios ou guerras de bastidores, justificando, numa entrevista à 'Maag', razões familiares para não ter seguido o mesmo percurso que os colegas. "Quando se pôs a hipótese concreta de voltarmos a fazer um programa em 2015, na TVI, depois de já não fazermos nada desde 2009, foi meramente circunstancial. Por motivos familiares, foi-me absolutamente impossível aceitar esse desafio na altura. Era um formato diário, que abrangia as semanas antes e depois das eleições legislativas. E eu não tive hipótese de aceitar esse convite, de me comprometer com o volume de trabalho e exigência de um programa daqueles. A partir daí, e nos dois anos logo a seguir, mantive-me entretido com outras coisas que não tinham nada que ver com televisão, nem sequer com a escrita de conteúdos para outros meios, e isso coincidiu mais ou menos com a altura em que eu me confrontei mais com estas outras perspectivas sobre a política", disse para explicar o que muitos acreditam que também foi um fator distanciador entre o grupo: o facto de Tiago Dores, até então assumidamente de esquerda, ter 'virado à direita' e replicar esse ideais políticos de uma forma mais enfática.
" Sempre me considerei de esquerda. No entanto, e à medida que nos últimos anos comecei a ouvir opiniões diferentes, hoje vejo-me como de direita — no sentido em que o que mais valorizo em termos políticos é a liberdade individual. São um bocadinho os preceitos da fundação dos EUA: a liberdade e perseguir a felicidade", explicaria mais tarde à Nit.
Os caminhos, como o próprio explica, distanciaram-se naturalmente para não mais se cruzou. Tiago Dores começaria então a colaborar com o 'Observador', enquanto os três amigos foram sempre crescendo em uníssono no panorama televisivo. "Mais tarde, vim a fazer rádio no Observador e o caminho acabou por ser esse. O Ricardo, o Zé e o Miguel também se organizaram de outra forma, com uma equipa diferente e maior. Não houve esse momento em que eu tenha decidido em definitivo não fazermos mais nada juntos, mas também não se prestou depois uma oportunidade, enquanto Gato Fedorento, para fazermos alguma coisa juntos", explicou à 'Maag'.
Num polo oposto ao dos antigos colegas, Tiago Dores acredita que dificilmente haverá espaço para um reencontro futuro entre os quatro. "Neste momento, não. Talvez quando formos muito velhinhos e for preciso pagar lares e assim, e os filhos já se tiverem borrifado em nós e tiverem ido todos trabalhar para o estrangeiro porque não há trabalho em Portugal", brincou, acrescentando, no entanto, que se continua a nortear pelos mesmos princípios de quando os Gato eram um quarteto fantástico. "É manter o mesmo princípio que nos norteava nas coisas que fizemos para o Gato Fedorento: fazermos aquilo de que gostamos e depois logo se vê se há mais gente que gosta. Se houver muita gente que gosta, ótimo. Se não houver e isto não tiver pernas para andar, vamos tentar fazer outra coisa. Não vale a pena tentar racionalizar muito mais a coisa porque é infrutífero."