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"Vítima de bárbaras agressões" e de um "casamento abusivo": a espiral de desencanto em que Teresa Caeiro mergulhou e que é agora denunciada

'Tegui' terá sido foi vítima de "montanha russa de abusos" e desejava formalizar queixa na Justiça por violência doméstica, revela Armando Esteves Pereira, diretor geral adjunto no jornal Correio da Manhã. Teresa Caeiro morreu atormentada pelos fantasmas do passado que os mais próximos sempre lhe conheceram e dos quais a tentavam puxar. Com um percurso profícuo na política, onde começou pela mão de Paulo Portas, partiu desencantada com o CDS que tanto amou. "Sou mulher, sou loura, de direita, advogada, política... Faço um pleno", chegou a admitir em entrevista.
Rute Lourenço
Rute Lourenço
16 de agosto de 2025 às 20:11
Teresa caeiro
Teresa caeiro

Se é certo que no luto, as palavras elogiosas são quase uma formalidade, as despedidas a Teresa Caeiro, a antiga deputada do CDS, encontrada morta em casa, na última quinta-feira, dia 14, aos 56 anos, mostram bem o quanto era acarinhada, e não só no meio político. As palavras sentidas chegaram de todo o lado porque 'Tegui', descrita como empática, generosa e com um coração puro, conseguia encaixar entre aqueles com quem partilhava o 'bom sangue' burguês ou simplesmente a pessoa da porta ao lado, num ecletismo de que tanto se orgulhava quanto, por vezes, receava.

"Muitas vezes, não me sinto encaixada em lado nenhum. O que também contribui para a insegurança. Gostava de saber catalogar-me, de saber onde pertenço. Também se vê nos grupos de amigos que tenho. São pessoas do espectáculo, são pessoas da política, são pessoas da advocacia, os chamados betos [risos]... É um mosaico", confidenciou, numa das grandes entrevistas de vida que deu, a Anabela Mota Ribeiro, em que abriu o coração para falar do seu percurso, a começar pela família - era sobrinha-neta de Cesariny - que lhe estabeleceu limites demasiado rígidos e fazia com que nem sempre conseguisse viver com a leveza que desejava.

"A educação, rígida, junta-se à genética. Foi-me exigido o máximo, nunca houve complacências, nunca fui a Teresinha... E se me perguntasse o que é que gostaria agora de receber... O que é que gostaria que se abatesse sobre mim? A irresponsabilidade. Receber cada dia como ele é. Não pensar nem no dia de ontem, nem no de amanhã, mas, por uma vez, no de hoje. Seria uma dádiva."

Teresa Caeiro foi casada com Vasco Rato, de quem teve um filho
Teresa Caeiro foi casada com Vasco Rato, de quem teve um filho

Foi, talvez, no amor que 'Tegui' mais tenha transposto essas fronteiras, ainda que não tivesse sido feliz como esperava. Viveu duas relações conhecidas: a primeira com Vasco Rato, com quem teve um filho, e depois com Miguel Sousa Tavares com quem se casaria, em 2011, no monte alentejano do comentador. Porém, fugiu das convenções. Separou-se de Rato, decidindo ser mãe solteira do único filho, Pedro, hoje com 19 anos, até que ao lado de Miguel Sousa Tavares voltaria a encontrar o amor que viveu durante seis anos, com a história entre os dois a culminar num divórcio magoado. Nunca acreditaria em contos de fadas. 

"Só posso dizer que não gosto de posturas dogmáticas. A vida não é como vem nos livros. É como a conseguimos tecer. Há um enorme desfasamento entre o nosso imaginário e a realidade. É verdade que há pessoas que moldam as suas vidas a uma aparência que vem nos livros, mas acho que pagam um preço demasiado elevado. Eu prefiro pagar este preço", disse, referindo-se à liberdade.

Mais do que não ter conseguido ser feliz neste campo, a antiga deputada terá ficado marcada por abusos no casamento. Ponderava mesmo, tantos anos depois, denunciar o seu agressor na Justiça, conforme revelou este sábado, num longo artigo, o Diretor-Geral Editorial Adjunto do Correio da Manhã, Armando Esteves Pereira, amigo pessoal de 'Tegui' que, de alguma forma, reporia a 'verdade' da deputada através das palavras.

"Teresa Caeiro tinha tudo, era inteligente, bonita, empática, íntegra, tinha valores, podia ser tudo o que quisesse neste País. Mas houve uma decisão que a afastou dessa trajetória, um casamento abusivo, em que foi vítima de bárbaras agressões. Nesse casamento perdeu grande parte da exuberância exterior, mas o mais grave foram as feridas interiores e o sofrimento que nunca mais acabou", começou por escrever no Correio da Manhã de sábado, 16, acrescentando que a antiga deputada foi uma "vítima não contabilizada nas estatísticas" de violência doméstica.

"Há pouco tempo falou-me da intenção de abrir um processo contra o agressor", confidenciou, adiantando, ao saber da  morte de Teresa Caeiro, ter sentido remorsos por, de alguma forma, a ter tentado demover, não só porque, tantos anos depois, as agressões seriam difíceis de provar, como por toda a exposição mediática que um processo desta natureza iria trazer para a sua vida. "Dissuadi-a, falei-lhe da distância temporal em relação ao momento das agressões, que tornavam a prova em tribunal mais complicada, mas principalmente alertei para o risco de exposição pública num tema tão sensível. Quando soube da morte da Teresa, fiquei com remorsos desse meu conselho", lamentou.

No entanto, os 'demónios' do passado nunca a terão deixado. Helena Sacadura Cabral, mãe de Paulo Portas - o grande responsável pelo início da carreira política de 'Tegui' - falaria disso num texto de despedida que deixou nas redes sociais: em como a deputada, embora rodeada de afeto dos muitos amigos, não conseguiu encontrar forças para fintar as adversidades da vida. "Choro por isso, por saber que, com tantos amigos a protegê-la, ela não tivesse tido a capacidade e a vontade, de sublimar as pedras que a vida, por vezes, põe no nosso caminho para nos testar!"

DA CARREIRA CONSTRUÍDA A PULSO AO DESENCANTAMENTO COM O PARTIDO

Teresa Caeiro conheceu Paulo Portas quando este era diretor do 'Independente'. Advogada, aconselhava-o nos processos que se acumulavam na sua secretária, até que, no final dos anos 90, o político a chamaria para assessora jurídica do Grupo Parlamentar do CDS-PP. Era o início de uma longa e profícua carreira política em que, muitas vezes, foi colada a estereótipos, tida como 'faz-tudo' de Portas, num rótulo que, assume, nunca se esforçou particularmente por se descolar. "Essa imagem que me colam, e que é absolutamente errada, resulta de nunca ter feito um esforço para me descolar dela. Eu poderia ter vincado a minha autonomia em relação ao Paulo Portas ou ao que quer que fosse. Agora, corro o risco de parecer, com estas minhas posições, que estou a dar o Grito do Ipiranga. Para mostrar que afinal existo", afirmou quem, três semanas antes da morte, se desvincularia do CDS completamente desencantada com o rumo que tomava o partido.

Paulo Portas sofre perdas de familiares num mês
Paulo Portas sofre perdas de familiares num mês

Disse ainda ter noção de que a sua aparência era, muitas vezes, mais um empecilho do que outra coisa, numa geração em que as mulheres tinham de batalhar o triplo para se afirmar em determinados meios.

"Há preconceitos difíceis de ultrapassar. Sou mulher, sou loura, de direita, advogada, política... Faço um pleno. (...) Se pusesse uma carantonha, cortasse o cabelo à escovinha, tivesse uns óculos rectangulares e fizesse mais o género Bairro Alto, não seria assim. Tudo isto se presta muito ao comentário: 'É loura burra, é o adereço do Paulo Portas'. Não tive a lucidez ou vontade ou paciência para contrariar isso."

Teria também a ver com o seu feitio. Descrevia-se como "tímida, insegura domesticada", e pouco habituada a receber elogios, o que, assume, já vinha de uma família que nunca demonstraria grande orgulho nos seus feitos. "No dia em que tomei posse como Secretária de Estado da Segurança Social, telefonei à minha mãe: 'Olhe, mãe, logo à tarde vou tomar posse...'; e a minha mãe: 'Ah. Mas olha, não te esqueças de mesmo assim passar no correio e pôr aquela carta que te pedi...'. Nunca há grandes manifestações... Estou a tentar lembrar-me... Não, é mais: 'Ah, muito bem, muito bem, mas não te esqueças de deixar o lixo quando saíres'. De toda a gente."

Miguel Sousa Tavares, Teresa Caeiro, separação
Miguel Sousa Tavares, Teresa Caeiro, separação Foto: Cofina Media

Há quem diga que, provavelmente, 'Tegui' não tinha consciência do quanto era amada. Por todos. Mulher de causas, foi a favor da despenalização do aborto e daria a cara pelo flagelo da violência doméstica, o mesmo que a atiraria para um lugar escuro, num final de vida atormentado, chorado agora por muitos, o principal o filho, o homem que mais amou. "Sabe a sensação de estar apaixonada, de ter o coração aos pulos? Mas, ao contrário das relações amorosas, com o filho isso vai crescendo, e queremos estar mais e mais com essa pessoa."



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