
2024 é, certamente, um ano que Sérgio Conceição terá pressa de virar. Para memória futura, ficará guardado como aquele ano em que se despediu do FC Porto, viu o seu braço-direito atraiçoá-lo e ficar-lhe com o lugar e, consequentemente, ainda assistiria a um dos filhos, Francisco, ser atingido por estilhaços relacionados com a sua vida profissional, sendo obrigado a mudar de clube, de país e a iniciar uma nova vida na Juventus porque no FC Porto as relações familiares faziam com que fosse uma 'persona non grata'.
Tempos duros que, inicialmente, fizeram até com que Sérgio Conceição se desencantasse do futebol, ponderando mesmo terminar a sua carreira como treinador. "Ainda não tracei uma meta (sobre o fim da carreira), sou assim enquanto treinador e já era assim enquanto jogador... Vivo muito aquilo que é o dia a dia, tudo de uma forma muito intensa. E não penso nisso. Não sei. Isto é uma profissão de um desgaste incrível. Mas não sei. Se me perguntassem isso há quatro meses, ali na fase final da minha 7.ª época no FC Porto, dir-te-ia que brevemente. Estava num momento... Agora, depois de uns meses em casa, já não penso e a minha mulher agradece", disse, em conversa com o poadcast Bitates D'Ouro, revelando algumas saudades de voltar ao trabalho.
Enquanto o dia não chega, Conceição - que assinalou os seus 50 anos de vida em novembro - aproveita aquilo que o futebol lhe veta na maior parte do tempo: ser um marido e um pai mais presente, o que o leva, necessariamente, a viajar mais vezes para Itália. Todos os cinco filhos são futebolistas, o que quer dizer que precisam como ninguém dos conselhos profissionais do pai. E Francisco, a braços com um novo desafio na Juventus, tem merecido uma atenção especial.
Tem sido, de resto, aos meios de comunicação social italianos que Conceição tem dado as únicas entrevistas desde que saiu do FC Porto, em algumas das quais falou sobre o alívio que sente por já não ser treinador do filho.
"Treinei o Francisco e o Rodrigo, que agora joga na Suíça. Tinha de ser justo com a equipa. O Francisco não jogou muito durante seis meses comigo no FC Porto. Precisava de entender o trabalho com a equipa. Quando chegava a casa, o meu filho mais novo, de 10 anos, perguntava-me porque não punha o irmão a jogar", confessou.
Neste momento, Sérgio Conceição tem os filhos espalhados a jogar futebol pelo mundo, razão pelo qual pouco acaba por manter-se durante muito tempo no mesmo lugar.
"Um joga no Chipre [Sérgio], outro em Zurique [Rodrigo], depois há o Moisés que está na segunda divisão em Portugal. O Francisco [Juventus] é diferente de mim, é forte, tem facilidade em mudar de direção, é bom no um contra um. Tem muita vontade, quer sempre ganhar, é muito ambicioso".
UMA INFÂNCIA DE DIFICULDADES E UMA GRANDE RESILIÊNCIA
Os anos mais difíceis de Sérgio Conceição têm o condão de o fazer regressar a uma das fases mais difíceis da sua vida para se recordar que já passou por muito pior e que resiliência é coisa que não lhe falta. Entre os 16 e os 18 anos, o treinador viveria a fase mais dura da sua existência ao perder os pais nesse período. Uma dor nunca completamente superada e que o marcaria para sempre.
"Tive uma infância muito difícil. Perdi os meus pais muito jovem. Tinha 16 anos quando perdi o meu pai e 18 quando perdi a minha mãe. Foi um golpe duro porque sou de famílias extremamente humildes. Era como todos os jovens adolescentes, cheio de sonhos. Foi toda essa dificuldade que fez com me revoltasse com a própria vida. Não foi um momento nada fácil", contou no passado, em entrevista à 'FLASH'.
Agora, a propósito dos 50 anos do técnico, o sobrinho Bruno Conceição recordaria ao jornal 'A Bola' esses tempos marcados pelas dificuldades, mas também por um espírito de união acima da média.
"Vivíamos todos na casa dos meus avós (pais de Sérgio Conceição). Foi assim desde que me lembro e até o Sérgio ir para o FC Porto, quando tinha 15 anos. Fazíamos tudo juntos, dormíamos no mesmo quarto e na mesma cama, uns com pés para um lado, outros com as cabeças para o outro. Era a nossa realidade. Eram tempos muito difíceis. Mas todos seguimos um rumo certo na vida, com valores e princípios de que nunca abdicámos. O Sérgio, por ser o mais velho, era o nosso chefe. E nós acatávamos sempre as ordens dele", contou o sobrinho, recordando outros tempos, que tinham tanto de amor e dor.
Em casa de Sérgio, viviam oito irmãos, numa realidade muito diferente daquela que vive atualmente. Cedo, Sérgio Conceição se agarraria à fé para o ajudar a encontrar uma luz de esperança nos momentos mais difíceis.
"Os meus pais eram pessoas bastante humildes que trabalhavam para sustentar uma família numerosa. Éramos oito irmãos e houve momentos muito complicados. Sou crente, a religião para mim foi extremamente importante naquilo que foi o meu equilíbrio, o meu crescimento e tudo aquilo que foi a educação dos meus pais, à maneira deles", disse para de seguida referir que continua a ser um homem de fé.
"Todos os dias me agarro a Deus. Ao domingo vou à missa, sou praticante com muito orgulho. A religião faz parte da minha vida e da dos meus filhos. Incuto-lhes esse meu estado de espírito. Sentimo-nos preenchidos com aquilo que é a nossa fé. Respeito toda a gente que não tem a mesma opinião e que acham que há outro caminho a percorrer. Para mim é essencial."