
Deixei de te amar quando comecei a ver-te.
Por vezes o amor precisa de uma cegueira temporária, e o amor é eterno quando a cegueira é eterna, verdade seja dita, ou mentira, não sei. Sei que te quis como um louco desde sempre, e pensei que para sempre, mas acabei por ver o que eras e não gostei do que era ao ver-te assim.
És capaz de ser a melhor pessoa do mundo, e a pior pessoa de mim.
Sou o que não quero ser quando estou contigo: o amor resiste a tudo menos a más pessoas no meio dele. Quando te tenho quero ter-te, e é só. E depois magoa tudo o que não sejas tu. Amo um amor doente, um amor sem meio-termo, e por isso terminado. Amo um amor perdido, e perco-me sem ti.
Agora quero a liberdade, a capacidade para deixar de te querer. Mas depois chegas tu e acabo eu. Que amor é este que me impede de amar?
A cegueira faz-nos ver, na verdade. Sou cego de ti e vejo-me completo. Magoa-me ver-me, e apenas tu me fazes ver-me. Quero a cegueira de um amor que tapa, não a transparência insuportável de um amor que faz ver.
Deixei de te amar quando comecei a ver-te.
Agora temo-te. Temo-te como se teme a felicidade. Nada assusta mais do que aquilo que nos faz felizes, porque apenas o que acaba nos faz começar.
Começo de novo quando te vejo de novo, vivo de novo quando te beijo de novo. O teu corpo é um santuário, um confessionário onde nada deixo por sentir, por mais que tanto deixe por dizer.
Digo-te que te temo quanto te amo, porque só se ama quando se teme.
Prometo temer.
Prometo recear a perda, a dor, os passos em falso. Prometo ter medo de ir inteiro, porque isso me magoará inteiro.
Prometo temer.
Prometo temer as palavras impulsivas, as frases malditas, as lágrimas com facas. Prometo ainda temer a queda, a saudade que não passa, o momento em que tudo faz sofrer.
Prometo temer.
Prometo as pernas trémulas, a voz a fraquejar. Prometo que não serei capaz de ser herói sem medo, porque tu e eu sabemos que nunca existiu um herói sem medo, e muito menos sem amor. Prometo tremer quando a decisão chegar, tremer quando o abraço tardar, tremer quando me estiveres a faltar.
Prometo temer.
Prometo não ser menos humano de cada vez que me desequilibrar, não ser menos pessoa de cada vez que a mágoa surgir, não desistir do que me faz balançar. Prometo que por mais que atemorize todos os momentos serão decisivos, que por mais que atemorize todos os prazeres serão explorados. Prometo ter medo do que amo, e ainda assim amar.
Prometo temer.
Porque o amor seguro pode ser seguro, sim, mas não é amor.
Oco: adj. Aquilo que nos deixa fartos, por mais que não nos deixe preenchidos. Só os apaixonados se completam — os outros apenas se ocupam.