
Não fazia parte dos meus interesses musicais. O breve tempo que esteve entre nós, não me suscitou particular atenção. Até que a sua morte, a bordo de um pequeno avião, obrigou a mais atenção. Marília Mendonça cantou para milhões de admiradores. E ao som dos seus versos cantaram, em coro, muitas dezenas de milhares de pessoas.
Tinha vinte e seis anos quando a morte a encontrou na passada semana. Muito cedo, tão cedo, que o Brasil inteiro a chorou. Assim, como em Portugal onde se encontravam muitos dos seus admiradores, predominantemente jovens.
Para tornar mais negra a tragédia, que Marília nem imaginava que lhe estava a bater à porta, minutos antes do acidente, publicou um vídeo no avião que a transportava para lugares onde ia realizar vários espetáculos. Parecia uma jovem aparentemente calma, a debicar arroz, óculos escuros, tranquila, à espera do momento de aterrar. Qual a razão de ser desta dor coletiva que atormentou tanta gente com o desaparecimento da cantora?
Em primeiro lugar a juventude. A morte, a única certeza que existe no nosso futuro, espera-se depois de uma vida comprida e vivida. Uma rutura radical que torna a existência num Nada insuportável. É paradoxal, não conhecendo nós o que é morrer, pois só conhecemos a morte do Outro, tenhamos tanta fome de imortalidade. Em cada um que parte, reconhecemos a impossibilidade desse sonho. Todos iremos morrer em dia e hora que desconhecemos. O trauma da separação é maior quanto mais jovem é aquele que falece. Como se a interrupção do processo de vida, não escolhesse idades, sexo, religião. Ficamos viúvos de vida. Só a memória redime tão irreversível separação. No caso de Marília, o processo é bem mais doloroso. Pelas suas qualidades artísticas, ascendeu ao panteão dos heróis onde se expõem aqueles admiramos. É este o psicodrama que perturba os seus seguidores. Afinal, a sua heroína, era tão frágil como qualquer deles. Que Descanse em Paz!