Perigosa traição: "Cozinheiro" de Putin "cospe no prato da sopa" e nega ligação ao presidente russo. Conheça o homem que quer mandar na guerra através do sanguinário Grupo Wagner
Yevgeny Prigozhin, o fundador do Grupo Wagner, sempre aproveitou as histórias da sua relação com Putin para lucrar mas agora tenta calar tudo. O que está por trás dos planos do "cozinheiro" que se transformou num poderoso oligarca e que já cumpriu nove anos de pena de prisão por fraude, roubo e ligação a uma rede de prostituição de menores?
É um dos nomes que mais fazem barulho na Rússia e ninguém sabe bem se ele quer promover os negócios, investir numa carreira política ou obedecer às supostas ordens misteriosas do Kremlin. Yevgeny Prigozhin, fundador do Grupo Wagner - do qual todas as semanas ouvimos falar, como estando a controlar partes do território ucraniano -, surpreendeu esta semana ao tentar demarcar-se de Vladimir Putin, isto depois de décadas a alimentar a reputação de "cozinheiro de Putin".
Numa entrevista recente ao site sul-africano 'Defence Web', que também é citado pela agência de notícias russa TASS, Prigozhin nega pela primeira vez ter uma relação de proximidade com o presidente russo. "Dir-vos-ei que as histórias sobre o meu conhecimento do presidente Putin são muito, muito exageradas. Certamente, comuniquei com ele, mas os rumores do nosso conhecimento são apenas isso - rumores", afirmou, negando ser um braço do Kremlin.
MAS QUEM É ELE?
As histórias dos dois homens de São Petersburgo remontam aos anos 1990, quando Prigozhin abriu um restaurante de luxo na cidade, visitado pela elite política, incluindo o então vice-presidente da câmara, Vladimir Putin.
Mas na entrevista mais recente, o empresário garante que só conheceu Putin quando já era presidente, não negando que ele era cliente dos seus restaurantes antes disso. "Eu não tinha qualquer interesse em falar com ele".
"Não tenho a oportunidade de visitá-lo quando quero, nem de ligar para ele", continuou.
"AS ORDENS VÊM DO PAPÁ"
No entanto, o 'The Guardian' noticiou no início deste ano que antes da invasão russa à Ucrânia o empresário pediu ao ministério da Defesa russo um terreno onde pudesse treinar "voluntários" sem qualquer ligação às forças armadas. O pedido não terá sido recebido com simpatia, ao que Prigozhin terá respondido: "As ordens vêm do papá".
Prigozhin, de 61 anos, tem um passado misterioso, cheio de lacunas por explicar. Muito antes de conquistar a elite russa com os seus cozinhados, o empresário polémico cumpriu nove anos de pena de prisão por fraude, roubo e ligação a uma rede de prostituição de menores.
Ao sair em liberdade, começou a trabalhar num carrinho de venda de cachorros quentes e pouco depois investiu em restaurantes, um negócio que logo evoluiu para outro ramo, o catering, através da empresa Concord - este serviço é que deu a ele a alcunha de "cozinheiro de Putin", por ter sido o escolhido para eventos oficiais com membros do governo russo.
Em 2014, o nome de Prigozhin começou a surgir associado a outro negócio, o Grupo Wagner, uma empresa paramilitar que recruta criminosos presos russos e militares. O grupo já serviu na Crimeia e continua a atuar em alguns países de África, ao mesmo tempo que está no combate por Bakhmut, no leste da Ucrânia.
O empresário russo negou durante anos ser o fundador do grupo de mercenários, tendo admitido só no ano passado.
A empresa de mercenários é alvo de uma série de acusações de violações de direitos humanos, com relatos de violência, tortura e execuções extrajudiciais. A Human Rights Watch cita abusos graves na República Centro Africana e no Mali, ao que Prigozhin reagiu na nova entrevista.
"Cem por cento falso. Isso está a ser feito pelos franceses e americanos, que estão a falhar em destruir militantes e terroristas globalmente, porque são preguiçosos e, francamente, inúteis. Eles estãohabituados a ficar sentados nas suas bases, apenas protegendo-se enquanto nós patrulhamos a selva destruindo terroristas. As autoridades locais realizaram investigações que desmentiram as farsas que foram feitas sobre a suposta violência contra civis".
Em fevereiro, a União Europeia declarou que "as atividades do grupo Wagner são uma ameaça para os povos dos países onde opera e para a União Europeia. Coloca em causa a segurança e paz internacional, porque não opera ao abrigo da lei", disse o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, citado pela imprensa nacional.
O ministro dos Negócios Estrangeiros português, João Gomes Cravinho, explicou em março, em declarações aos jornalistas, que o Grupo Wagner "desenvolveu um modelo de negócio de guerra compensado por acesso a matérias-primas, minas, e leva este modelo de negócio para várias partes do continente africano e, por todo o lado onde está a Wagner há violações de direitos humanos, há instabilidade".
Além de tentar esconder a ligação à Wagner durante anos, Prigozhin também negava estar ligado à "fábrica de trolls" que influenciou o resultado das eleições dos Estados Unidos, de 2016, chamada Internet Research Agency (IRA). Mas em fevereiro deste ano deixou tudo às claras com uma declaração no seu principal canal, a rede social Telegram: "Nunca fui apenas o financiador da Internet Research Agency. Inventei, criei, geri por muito tempo. Foi fundada para proteger o espaço de informação russo da propaganda grosseira e agressiva da narrativa anti-russa do Ocidente".
A IRA é o principal motivo para Prigozhin ser atualmente procurado pelo FBI, depois de ter sido sancionado em 2018 pelo Departamento do Tesouro dos EUA, acusado de conspiração para fraudar as eleições presidenciais.
Prigozhin parece pouco preocupado com a sua reputação internacional e trava quase diariamente uma batalha com o Ministério da Defesa russo. Esta semana, o empresário chegou mesmo a desafiar Vladimir Putin e o argumento de invasão à Ucrânia por causa do suposto movimento nazi que ameaça a paz e a segurança da Rússia. Para Prigozhin há dúvidas sobre a presença de "nazis" na Ucrânia.
AS AMBIÇÕES POLÍTICAS
Recentemente, o investigador francês Maxime Audinet explicou ao 'France 24' que Prigozhin quer aproveitar a recente fama para ocupar o lugar de líder dos ultranacionalistas, posição que ficou vazia no ano passado após a morte de Vladimir Zhirinovsky. "Esta parte do espectro político russo é uma grande promessa para a era pós-Putin". Mas Prigozhin faz o que fez com os outros negócios: nega qualquer ambição política.