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Batalha contra o tempo. Tudo o que o Papa Francisco quer concluir em vida

Papa esteve entre a vida e a morte no hospital com uma pneumonia bilateral e continua agora a sua recuperação no Vaticano, o que se poderá estender por mais de dois meses. No entanto, a saúde frágil leva-o a reunir esforços para deixar tudo preparado e os seus conselhos acerca daquilo que acredita que deverá ser o futuro da Igreja.
Rute Lourenço
Rute Lourenço
27 de março de 2025 às 22:01
Tudo o que o Papa Francisco quer deixar feito em vida e como está a lutar pelas suas bandeiras
Papa Francisco
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Papa Francisco
Papa Francisco faz primeira aparição pública
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Papa Francisco
Papa Francisco faz primeira aparição pública

A batalha do Papa Francisco não acabou com o internamento de mais de um mês no hospital. Foram tempos sofridos, de muita angústia, que o chefe da Igreja Católica entregou sempre em duas mãos: na do Deus, em que tanto crê, e na do seu médico de sempre, Massimiliano Strappetti, que já lhe tinha salvado a vida uma vez, palavras do próprio Francisco, quando foi operado ao cólon, há alguns anos, e agora volta a repetir a proeza.

Massimiliano Strappetti e Francisco
Massimiliano Strappetti e Francisco

De acordo com a imprensa italiana, o médico, responsável pela saúde do Papa, esteve sempre presente no internamento hospitalar, pedindo aos colegas que não desistissem de Francisco e que fizessem de tudo e acreditassem que era possível dar-lhe vida, mesmo que tenha havido situações muito difíceis de gerir.

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Papa Francisco faz primeira aparição pública após internamento

"Tivemos de decidir entre deixá-lo ir ou forçá-lo a lutar com tudo. Durante dias, corremos o risco de causar danos nos rins e na medula óssea, mas seguimos em frente e assim que o tratamento foi administrado, o Papa começou a melhorar da pneumonia. Foi terrível. Houve alturas em que achámos que não íamos conseguir", partilhou o médico.

O tudo por tudo foi dado e agora o pior já passou. No entanto, de acordo com a imprensa italiana, Francisco não se ilude. Sabe que, aos 88 anos, a sua condição de saúde é frágil o suficiente e o internamento funcionou como um alerta de que não há tempo a perder e que este é o momento de olhar para a frente, para a sucessão. Não que pense em abdicar, apenas pretende deixar tudo pronto para que haja uma continuidade e, acima de tudo, para que quem vier a seguir entenda a importância de respeitar aquelas que foram as bandeiras.

Na verdade, antes mesmo de Francisco adoecer, o Papa, precavido, já tinha começado a trabalhar nesse caminho, sendo que, por exemplo, as suas cerimónias fúnebres já estão decididas desde 2017. Não por uma questão de vaidade, antes pelo contrário: o Papa quis simplificar o processo para colocar fim a endeusamentos. 

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D. Américo Aguiar diz que 'a recuperação do Papa Francisco exigirá paciência e tempo'

Aquando da reformulação, pediu ao Departamento para as Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice para alterar as regras das cerimónias fúnebres papais. A nova versão do Ordo exsequiarum Romani Pontificis foi apresentada em novembro de 2024 e é, na prática, uma versão simplificada daquela que foi colocada em prática com os seus antecessores, que tinham três caixões e ficavam num altar para que os fiéis os pudessem venerar. Com Francisco, por exemplo, haverá apenas um caixão, de zinco, e o seu corpo não irá permanecer em altar.

"Simplificámos muito as cerimónias. Tínhamos de o fazer. Eu serei o primeiro a protagonizá-lo", disse em 2017 em declarações à televisão mexicana.

PREOCUPAÇÃO EM RELAÇÃO AO FUTURO

No entanto, há muito mais a ocupar os pensamentos de Francisco, que provocou uma autêntica revolução na Igreja Católica ao colocar em cima da mesa temas que antes eram completamente tabu. É o chamado Papa de todos, que promulga o verdadeiro amor na diferença e não fecha a porta da Igreja a ninguém. 

Teve a coragem de colocar o dedo na ferida e falar de temas completamente disruptivos, e sobre os quais os seus antecessores não se atreviam a falar, como os abusos no seio da Instituição. "Com vergonha e arrependimento, a Igreja deve pedir perdão pelo terrível dano que aqueles religiosos causaram com os abusos sexuais de crianças", escreveu na sua biografia, recordando uma história que mostra que sempre agiu em conformidade com aquilo que pensa. "Quando era vigário em Flores, referiram-me um episódio relativo a um diácono, que tinha chegado do estrangeiro para fazer o sacerdócio. Aquele jovem tentara aproveitar-se de um rapaz paraplégico. Não aconteceu nada porque o rapaz, embora paraplégico, não era de modo algum submisso: reagiu com energia e deu ao diácono aquilo que merecia. E eu intervim de imediato, chamei o diácono e disse: 'vais-te embora imediatamente'. E informei o bispo do seu país do ocorrido."

E foi nessa mesma biografia, chamada 'Esperança', que Francisco quis passar para papel aquela que é a sua forma de encarar o mundo mostra, mostrando uma nova compreensão do mundo que marcou um antes e um depois na Igreja.

"As promessas que se baseiam no medo, acima de tudo, o medo do outro são a censura habitual dos populismos e o início das ditaduras e das guerras. Pois para o outro, o outro és tu", escreveu, acrescentando que na sua igreja há espaço para todos. "Abençoam-se as pessoas, não as relações", porque "na Igreja, são todos convidados, mesmo as pessoas divorciadas, mesmo as pessoas homossexuais, mesmo as pessoas transexuais".

A "primeira vez que um grupo de transexuais veio ao Vaticano, saíram a chorar, comovidas porque lhes tinha dado a mão, um beijo… Com se tivesse feito algo de excecional para elas. Mas são filhas de Deus! Podem receber o batismo nas mesmas condições dos outros fiéis e nas mesmas condições dos outros, podem ser aceites na função de padrinho ou madrinha, bem como ser testemunhas de um casamento", disse, com naturalidade para concluir que ainda muito há a ser feito para que vivamos em igualdade.

Por fim, Francisco fala ainda sobre uma sociedade hipócrita em que com tanta facilidade se pisam uns e desculpabilizam outros, mesmo que também tenham pecado.

"É estranho que ninguém se preocupe com a bênção de um empresário que explora as pessoas, e esse é um pecado gravíssimo, ou com quem polui a casa comum, enquanto se escandaliza quando o Papa abençoa uma mulher divorciada ou um homossexual."

Francisco sempre quis que o seu papado tivesse continuidade e tem alertado os seus pares para a importância de uma igreja mais próxima de todos, no entanto, entre os cardeais apontados como sucessores, ninguém mostra ter um perfil semelhante ao de Francisco pelo que se teme que o trabalho do Papa tenha sido como que em vão e haja um retrocesso gigante na Igreja Católica.

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