
O amor serve para nos pôr direitos, mas serve mais ainda para nos virar do avesso.
Foi isso que fizeste com o que eu era – tão diferente do que eu sou, meu desgraçado. Chegaste e espantaste-me, tão simples.
O amor serve para nos dar espanto.
Era uma mulher tão cómoda, tão imóvel, e pensava que a vida era isso, uma passividade feliz – há lá contradição ("oximoro", dirias tu, com essa mania de que sabes tu, mesmo sabendo) maior do que esta? Tinha um marido equilibrado, uma vida equilibrada, uma profissão equilibrada, e acreditava naquilo, acreditava que era aquilo o que me estava destinado. Mas nunca nada nos está destinado, é esse o nosso destino, graças a Deus.
O alarme não é quando o amor cria confronto – é quando não o cria.
Não se pode amar como se fosse cortar as unhas ou lavar as mãos. O hábito faz o monge mas desfaz o amor.
Um dos melhores momentos da vida é fazer amor – e um dos piores é desfazê-lo, com certeza.
Havia que acabar o que nunca, se calhar, havia começado. Nunca fomos mais do que gente séria de mais, adultos graves de mais, enclausurados de mais. Felizmente vieste e brincaste, foste tão inconsequente quanto temerário, sem perigo há muita coisa nesta vida, excepto vida.
Levo agora o amor a sério – mas nunca deixo de brincar nele.
O amor é alegria, tão simples, o amor é alegria e o meu não era, doeu mas acabou, fui em frente contigo, insensata como nunca, feliz como sempre quando estou contigo, perder o que nos faz perder a razão é a maior das perdas, resiste-se a tudo menos ao irresistível, ao que nem a nós resiste, nem aos nossos medos, aos nossos preconceitos, resisto a tudo menos a saber que não me resistes.
O que nunca aconteceu nunca existiu – e por isso existe para sempre.
O arrependimento é isso, aquilo que nunca existiu a perpetuar-se numa memória de emoções perdidas, de emoções por ser. Somos o que somos capazes de dizer e incomparavelmente mais aquilo que não somos capazes de dizer. Disse-te quero e vou e fiquei inteiramente em diferendo comigo mesma, que maravilha. É da dissonância que nasce a criação – não existe amor sem desacordo. E aos poucos percebi que não eras só sonho, eras realidade – a minha. Amar é também saber que os contos de fadas não existem, e ainda assim vivê-los, queres ser o meu príncipe desencantado todos os dias?
O príncipe encantado deixa encantamento mas também pode muito bem deixar uma pinga de urina na tampa da sanita.
E o amor é tão lindo, não é?
Mundo: s.m. Espaço ocupado pelo que amas. Há quem tenha percorrido o mundo e não tenha conhecido mundo nenhum.