
A atual crise política é, apenas, o guarda-chuva que abriga outras crises mais profundas que habitam a sociedade portuguesa e, de certa forma toda a Europa. A crise económica com manifestos sinais de agravamento devido ao aumento de combustíveis e à pesada carga fiscal que se abate sobre os portugueses. A inquietação com uma outra crise anunciada que é o regresso da pandemia. A degradação de todos os serviços do Estado, da Saúde à Educação, passando pela impossibilidade histórica de ganharmos competitividade e deixarmos a cauda da Europa, produzindo licenciados, especialistas, técnicos que emigram por falha de expectativas profissionais em Portugal, a que se associa o empobrecimento, o envelhecimento, a desertificação. Tudo isto somado transforma a segurança em maior insegurança. Faz emergir novas realidades marginais, como é o caso dos bandos que roubam e matam como se viu há dias. Degrada as condições de trabalho das forças policiais que nem mesmo em tempo de vacas gordas são tratadas com a dignidade que merecem, quanto mais ao perceber-se que a decadência foi acelerada.
A todas estas crises somam-se outras bem mais perigosas, de índole moral e cívica. Contaminados pelo efémero, incapazes de segurar o tempo para a reflexão, confundimos aprendizagem e comunicação com educação, produzindo jovens desorientados entre modelos sociais e comportamentais diferentes e, por vezes, em conflito.
Este caldo de incultura generalizado potenciado pela emoção do instante, pela paixão deslumbrada ou pelo pessimismo mais profundo, abrem-se portas para o aumento da violência e da explosão de fúria pelos mais singelos motivos.
A situação que está instalada tem condições para o amento do desespero, da angústia e para o despoletar situações de insurgência e de revolta. Perante a impotência da política, será sobre os ombros da polícia que vai cair a maioria dos trabalhos para conseguir consolidar a ordem do Estado e do Direito. Chegámos aqui. Dificilmente sairemos do lugar onde estamos.