
É da natureza das forças militares e de segurança. Não há democracia na cadeia de comando, a obediência é um princípio de serviço, as ordens emanam da autoridade de que está investido cada militar na cadeia de comando. Alferes comanda sargentos, capitães dão ordens a alferes e tenentes, majores lideram capitães, tenente coronel todos aqueles que já foram referidos e, por aí acima, até general e, no caso da Armada, até almirante.
O exagero do costume transformou um pequeno acidente com a cadeia de comando de unidade da Marinha, com o navio patrulha Mondego, numa rebelião que evocava a revolta na Bounty, um motim rocambolesco, ocorrido no séc. XVIII, com um navio britânico. Um disparate, mas as analogias jornalísticas na maioria das vezes não são apenas disparates. São ignorância.
Essa revolta teve direito a literatura e cinema, a nossa, na Madeira, transformou-se num espetáculo de mau gosto, mal encenado, rasca, ao nível de vulgaridade que os nossos líderes nos habituaram.
A exigência de disciplina militar é indiscutível. Porém, no séc. XVIII, castigavam-se amotinados a golpes de chibata e prisões. Passaram dois séculos desde esse tempo, a Constituição da República exige o exercício de um conjunto de direitos aos cidadãos que interdita a chibata e o achincalhamento público de qualquer cidadão. Seja civil ou militar. O almirante Gouveia e Melo teve saudades da velha Bounty e resolveu chibatar e humilhar publicamente os seus subordinados que, supostamente, se amotinaram. A violência do ataque, com cumplicidades televisivas evidentes, não esperou por inquéritos, e muito menos por tribunais. O Almirante Melo diz que não. Que apenas falou para a Marinha. Tê-lo-á feito mas também falou para o País. Eu, que não sou marinheiro, ouvi e vi como milhões de outros portugueses. Dizem alguns comentadores que o Almirante Melo quis mostrar ao País como se governa e, desta forma, dar mais um passo para se candidatar a Presidente da República. Enganou-se. Perdeu eleitores. O povo detesta que os líderes sejam fortes com os fracos e fracos com os fortes. É o caso. Não se lhe ouviu uma palavra sobre o estado da nossa Armada, reduzida a sucata e falta de meios humanos. Escutou-se-lhe a verborreia inflamada contra marinheiros. É mais uma fanfarronada do que exercício do poder. E se houve motim, existem tribunais para os julgar e, que se saiba, comandante não é juiz.