
[ele]
Quando chegaste a minha vida tinha acabado.
Primeiro pensei que vinhas ajudar a acabá-la, depois fiquei com essa certeza.
O amor ou acaba connosco ou estamos acabados.
Estávamos à espera do mesmo táxi, no aeroporto. Já não sei, se queres que te diga, de onde vinha. Só fixo o que me excita, como o que me perguntaste quando o táxi chegou: "posso ir consigo e sentar-me no seu colo para não ocupar um espaço no banco?". Demorei a reagir. Explicaste: "assim pode ser que só se pague metade". Sorriste, estendeste a mão, disseste o teu nome. "Claro que sim", foi só o que eu disse. Nem o meu nome tive o discernimento de dizer. Estava perdido e feliz.
O amor ou nos deixa perdidos e felizes ou estamos perdidos.
Entrei no táxi. Tu vieste depois e cumpriste. "Posso", perguntaste, sem dizer o quê. Eu respondi que sim sem saber a quê. Sentaste-te, lentamente, no meu colo. O taxista quis falar mas fizeste-lhe um "shiu" discreto. Arrancou. Eu e uma desconhecida que eras tu na parte de trás de um táxi. Falaste-me de filosofia, de Kierkegaard, e eu só pensava no que raios havia de pensar para o meu sexo não ficar ainda mais excitado. No final saíste e disseste: "obrigado pela boleia".
Foi há um ano. Nunca mais te vi. Até hoje. Estamos os dois olhos nos olhos à saída da lavandaria e um táxi aproxima-se. Ainda bem que hoje vim de carro.
[ela]
Há um ano que sou feliz contigo,
e já não te vejo há um ano.
— Na tua cama ou na minha?
[the end]
Optaram pela cama dele, mas tudo correu mal.
O sexo foi óptimo, o amor que se lhe seguiu (e se lhe precedeu) foi excelente, ficaram juntos para sempre,
mas a cama era altamente desconfortável.
Papel: s.m. O mesmo que vida. Nasces com uma folha em branco e pensas que tens de a preencher — mas na verdade o segredo da felicidade é conseguir manter, nela, o maior espaço em branco possível. Estar feliz é ter sempre o que viver.