
Chegou o momento em que os nossos instintos mais primitivos são convocados pela paixão. A partir do dia 14 de junho, até mesmo aqueles que dizem à boca cheia que não ligam "peva " ao futebol, vão acabar por ficar inebriados com a magia do desporto-rei.
Na Rússia, está tudo a postos para que a bola comece a rolar. Ronaldo e companhia aceleram rumo a uma campanha que se espera vitoriosa e nós, portugueses, sonhamos com eles. O peso da distância será mais uma vez mitigado pela televisão, pela rádio e uma miríade de aplicações nos telemóveis.
Até que ponto o avanço tecnológico nos faz viver com mais fervor o maior espectáculo do mundo? Tenho sobre esse assunto as maiores reservas sobretudo quando dou por mim a viajar até 1982, ano em que, pela primeira vez, vivi com intensidade a fase final de um Mundial.
Com a atribuição da organização do evento à vizinha Espanha acreditava, tal como os meus quatro irmãos, que Portugal nunca tinha estado tão perto de poder voltar a participar na prova. O grupo de qualificação não se adivinhava fácil. À Seleção portuguesa juntavam-se Escócia, Suécia, Irlanda do Norte e Israel.
Depois de uma campanha desastrosa, acompanhada a preto e branco, aos meus manos, tal como eu, só nos restava torcer e vibrar com o Brasil, cujo plantel veio estagiar, na altura, em terras lusas.
O fraco consolo transforma-se numa aventura inesquecível quando o meu irmão Raúl (Lito) trás para casa a caderneta da Panini. Aquele objecto passou a ser de culto e ainda hoje me recordo com saudade do toque e do cheirinho dos cromos.
Ao final da tarde, era com os olhos a brilhar que abríamos as saquetas para de lá retirar os craques. Sócrates, Zico, Falcão e Paolo Rossi foram as figuras que acabaram por me marcar para sempre assim como a mascote Naranjito.
Às nossas tertúlias, sem iphone ou um led com resolução em 4 k, juntávamos essa mítica caderneta. Era através dela e de alguns jornais que conjecturávamos sobre a seleção canarinha e os outros candidatos ao título.
O Brasil não venceu e acabou por ser a itália a levantar o caneco depois de derrotar a República Federal Alemã por 3-0 num jogo eletrizante. Desde então nunca mais deixei de comprar a minha caderneta.
Sozinho, é com ela que revivo os tempos de convívio que já não voltam e que tanta falta fazem aos nossos jovens e crianças. Na Rússia, Fernando Santos e os seus pupilos trabalham para fazer história. Por cá, vou torcendo por eles, ao mesmo tempo que preencho a caderneta.