
As reflexões mais profundas que faço sobre televisão acontecem invariavelmente durante o período de férias. De comando na mão, com os sentidos em velocidade cruzeiro, dou por mim a navegar por centenas de canais, sendo muito poucos, aqueles onde aporto durante largos minutos.
Essa viagem noctívaga, acomodada pelo silêncio e a privacidade que tanto prezo fez-me pensar na amizade. Tal como na vida, em que não podemos ser verdadeiros amigos de todas as pessoas de quem gostamos, quando vemos televisão, e se assumirmos cada um dos canais como um potencial amigo, também nunca conseguimos estabelecer uma relação intensa com todos eles.
É impossível ter muitos amigos, por mais pessoas que nos rodeiem, por mais vontade que tenhamos de ser amigo de todas as pessoas de quem gostamos. O tempo e o espaço que ocupamos são finitos, cada vez mais exíguos, para o conseguirmos partilhar de forma indiscriminada.
Os amigos, tal como os canais de televisão, companheiros desde que nos conhecemos como gente, têm de ser escolhidos a dedo. Uns e outros carecem de dedicação extrema para se tornarem insubstituíveis, fiéis, interlocutores com quem partilhamos alegrias e tristezas, euforias e depressões; uns e outros têm de ser uma escolha nossa, racional, genuína.
Pouco esclarecidos são aqueles que continuam a achar que têm muitos amigos; que ainda não conseguiram fazer a destrinça entre os verdadeiros amigos e os "amigalhaços" de ocasião. E é com esta última espécie-em franco processo de reprodução-que temos de ter mais cautela.
É muito fácil separar o trigo do joio. Os amigos não são maus e desleais. É esse o preço da amizade: candura e lealdade.
Acreditem que um zapping de várias horas pode ajudar e muito nas nossas escolhas. Fui surpreendido com novas descobertas televisivas e também eliminei várias canais da box. Quanto aos amigos… Eles sabem quem são!