
Mais do que uma tradição, o aniversário de Ricardo Salgado, que passou a celebrar-se anualmente no castelo milionário do genro Philippe Amon, nos arredores de Lausanne, Suíça, é um escape para o pesadelo que a vida há muito se tornou, nomeadamente para a mulher do ex-banqueiro, Maria João Salgado, que com o marido doente enfrenta sozinha as polémicas relacionadas com o caso BES. Segundo o Correio da Manhã, a família já está novamente reunida na Suíça para assinalar os 81 anos de uma vida que se tem deteriorado nos últimos anos à custa da doença de Alzheimer.
Com a demência a progredir, e os períodos de ausência de memória cada vez mais frequentes, é Maria João quem reúne com advogados, gere dívidas, penhoras e quem se apercebe, efetivamente, de que o império de outros tempos ruiu de vez. De uma casa cheia de filhos e netos, vive atualmente sozinha com o marido numa moradia que já foi de fausto, em Cascais, e que hoje se transformou numa enfermaria de serviço à custa do estado de saúde do antigo 'dono disto tudo'.
"Está doente, a doença infelizmente tem progredido. O Ricardo tem dificuldade em fazer tudo sozinho. Eu tenho de estar com ele para ele ir à casa de banho. Durmo com ele e tenho de estar com atenção porque ele levanta-se de noite e não acende a luz. Custa-me dizer isto do meu marido, mas ele não tem independência nenhuma hoje em dia. Já se tem perdido em casa", afirmou Maria João, acrescentando que o marido, tal e qual como o conhecia, já não existe.
"A cuidadora dele sou eu e serei sempre, mas às vezes preciso de descansar. Fico sem dormir e já tenho recorrido a uma cuidadora em casa. O nosso quarto é no primeiro andar e arranjei-lhe um quarto cá em baixo para ele não ter de descer escadas e ir à casa de banho, porque tenho medo... Quando eu estou muito cansada, ele fica lá em baixo. Não tem nada a ver... Tinha um marido fantástico e hoje tenho um bebé grande para tratar."
Entre os dias sempre iguais para Maria João, o mês de junho, em que anualmente o casal se ausenta de Portugal, informando o tribunal acerca da estadia prolongada, é uma lufada de ar fresco. Até ao próximo dia 25, a companheira de Ricardo Salgado terá, entre os mimos da filha Catarina e dos netos, a normalidade que perdeu em Portugal e também os luxos que o genro milionário pode pagar. No amplo castelo onde Amon – o multimilionário que é gestor da Sicpa, empresa que fabrica as tintas para as notas do mundo inteiro – há empregados para tudo e mais alguma coisa, até porque a residência de Bougy-Saint- Martin não é uma propriedade qualquer. São hectares e hectares de um campo verdejante a perder de vista, no centro do qual se situa o denominado 'castelo', que conta com piscina, jardins franceses, campos de ténis e várias casas, como mostram as imagens aéreas disponibilizadas por vários meios de comunicação franceses.
É lá que Philippe Amon construiu o seu pequeno forte familiar. Em Aubonne, a pequena comuna onde reside, a sua mansão é a mais sumptuosa, a mais invejada, ainda que a discrição seja a palavra de ordem para o milionário, que até já adquiriu a estrada que circundava o seu castelo para garantir a total privacidade e que ninguém se aproxima do seu palácio.
"A discrição é uma segunda natureza", admitiu o empresário, numa das raras entrevistas que deu.
É ele agora o responsável pela manutenção do estilo de vida de Ricardo Salgado depois da queda do BES, com Maria João a informar o tribunal receber todos os meses uma mesada de 40 mil euros da filha Catarina para fazer face às despesas. Todos os três filhos do ex-banqueiro estão bem na vida, mas Catarina – que há quase duas décadas se casou com Amon, quando o nome dos Salgado ainda impressionava outras famílias influentes na Europa – atingiu um outro patamar, com o marido a ser detentor de uma impressionante fortuna de 2,3 mil milhões de euros, sendo considerado um dos homens mais ricos da Europa.
A MULHER QUE NÃO ABANDONA SALGADO
Nos tempos áureos do BES, para Ricardo Salgado e a mulher, não havia espaços em branco na agenda e entre as festas à porta fechada na Comporta e o glamour da casa de Cascais, sempre havia qualquer coisa de empolgante para partilharem, com as passagens de ano no Brasil, a culminarem anos de ouro, que são agora uma miragem.
Apesar do muito que perderam, do estatuto que já não têm, da vida que se perdeu, Maria João tem honrado os votos de casamento e, na saúde e na doença, mantém-se incondicionalmente ao lado do marido, algo que é enaltecido para os amigos que destacam que, mais do que Salgado, 'protegido' pelo seu mundo à parte da doença, a companheira é quem mais sofre.
Para o padre Avelino Alves, que continua a ser um dos bons amigos da família, Maria João Salgado tem sido um caso de resiliência e é a grande responsável pelo facto de Ricardo Salgado ter suportado as mudanças na sua vida, a revolta popular e o virar de costas daqueles que julgava amigos.
"A Maria João tem sido uma mulher extraordinária. Eu nunca acreditei que ela tivesse tanta força para o segurar. Ela aparece sempre com ele e é a força dele. Ainda ontem estávamos a falar e é ela a alma... o dr. Ricardo nunca teria aguentado se não fosse ela. Eu nunca imaginei que a Maria João tivesse esta capacidade, esta coragem, este amor, este afeto. De não se deixar cair e de não deixar o homem cair no chão e arrastá-lo", reforça o pároco, reforçando o papel de destaque que esta agora tem ao dar a cara pelos processos, numa altura em que a saúde de Ricardo Salgado se apresenta cada vez mais frágil.
"A Maria João tem e mostrou ser uma grande senhora, eu nunca imaginei que ela fosse assim uma mulher de guerra, uma mulher de armas. Sobretudo, mostrou ser ali uma esposa ao lado do marido. Os grandes homens e as mulheres vem-se nas adversidades, nas dificuldades e ela mostrou que é uma grande mulher."