
O brutal rapto e sequestro, seguido de homicídio tentado, cometido por um indivíduo chamado Paulo contra a sua ex-companheira chamada Anabela, ocorrido nas cercanias de Grândola, tem aspetos extraordinários que são comuns em quase todas as práticas de violência doméstica. A expectativa do agressor que, quanto mais medo difunde, maior será a retribuição afetiva que a sua vítima lhe entregará.
Este homem, incapaz de aceitar que a sua companheira o tivesse abandonado, pondo fim à relação, segundo relatos sérios, terá pensado assim: Vou raptá-la e sequestrá-la até ela me aceitar de volta. Se não aceitar, mato-a.
E só não a matou porque a Polícia Judiciária interveio a tempo, salvando por escassos minutos, a vida á inditosa mulher. Apanharam-no quando ele a garrotava. Embora ainda esteja em estado grave, tudo indica que se salva. Felizmente!
Este raciocínio doentio que julga que através da violência reconstrói laços de amor já desfeitos, muitas vezes, por histórias prolongadas de maus tratos, é não é tão invulgar quanto se julga. Corresponde a um padrão mental primário, incapaz de reconhecer que a esposa, companheira, namorada, não é uma propriedade, um fatalismo milenar que ao longo da História sempre diminuiu a condição e o género feminino.
Esta brutalidade animalesca parte desse princípio material: Casaste comigo, ou namoras comigo, logo és minha!
Durante séculos isto foi aceite com submissão, dando origem a aforismos bestiais, do género, quanto mais me bates, mais gosto de ti. No fundo, é a cultura da barbárie. Porque amar, é dar sem condição. É respeitar o Outro, sem outra condição que não seja dos direitos de ambos a serem felizes. Felicidade repartida, não a felicidade de um em detrimento do outro.
Só no dia em que os homens reconhecerem que a cidadania é um bem comum, sem género, sem raça, sem credo, poderemos sonhar com um tempo em que amar nunca é matar. Mas dar de tal forma que é possível morrer por quem se ama.