
O Mediterrâneo foi um dos berços de Civilizações com milhares de anos. Ponto de encontro de três continentes, em seu redor criaram os homens a sua História, por ele se encontraram culturas diferentes e produziu-se, em seu torno, muito daquilo que a genialidade humana é capaz de produzir. De certa forma, o Mediterrâneo moldou-nos, testemunhou vitórias e derrotas, guerras formidáveis e tratados de paz, lugar de fortuna e de infortúnio.
É belo! Magnífico para desfrutar, sereno para junto a ele se viver com prazer, para se viajar deslumbrado. Para se ser feliz.
Simultaneamente é um imenso sarcófago que abriga milhões de mortes, motivados pelas guerras, pelas tempestades. Pelas migrações.
É nesta amalgama de pureza e destruição em que nos encontramos. De um lado a Europa rica, gorda de consumismo e fartura e, na outra margem povos aflitos com a fome, com a desertificação, com a guerra. Milhares querem fugir de tanta desgraça, de terríveis sofrimentos, projetando melhor vida no lado rico do mar. Não se importam de ser escravizados, chantageados, ameaçados pela morte, os mais humildes dos servos no Paraíso europeu. Não é difícil de compreender tanto sofrimento quando os vemos despidos de dignidade, almejando paz e trabalho que lhes mate a fome. Quando os vemos morrer em desastres de massa, engolidos pelo mar que sempre foi nosso irmão.
Esta tragédia revela, por outro lado, a hipocrisia europeia que vai ao ponto de empurrar os aflitos para a tragédia humana, recusando abrigo, negando ajuda, tratando-os como párias, socorrendo-se de palavreado sem sentido onde impera a xenofobia, a desconfiança, o racismo, vendo em cada desgraçado esbulhado de direitos, ameaças fantásticas que a realidade desmente. Em Portugal, são os novos pobres dos campos. Apanhadores de mirtilos, de azeitonas, de uvas.
É urgente falar com o Mediterrâneo. Para que a paz que regresse à harmonia entre as duas margens.