
Está por fazer o estudo aprofundado dos impactos da pandemia nas crianças e jovens, no que respeita à saúde mental após a turbulência de confinamentos, desconfinamentos, aulas presenciais, aulas à distância, num sucessivo entra e sai das escolas, conforme surgem casos de Covid. Falta saber que danos foram provocados nas cabeças desta malta mais jovem no que respeita às aprendizagens, organização crítica do conhecimento, à construção de imaginários onde a criatividade e a sensibilidade tenham o lugar que merecem.
Digo, com a margem de erro que pode ter uma mera reflexão sobre ausências, que a pandemia terá desestruturado os processos educativos. Roubou o espaço para o encontro. Potenciou o vazio. Expropriou-nos, a todos, do viver em comunidade. Foi necessário trocar a presença pela ilusão da presença e os nossos jovens foram submetidos a novas cargas de risco. Impossibilitados do toque, do beijo, da visita e da viagem, muitos perderam o contacto com avós e familiares. A hierarquia de solidariedades e de afetos transfigurada pela simulação de presenças graças às redes sociais e à internet.
Tudo isto remete-nos para um mundo com maiores silêncios que as trocas de mensagens instantâneas ilude. Que os videojogos entregam a ilusão do culto da atenção que se torna fugaz. Do tempo vivido à distância de um clique, sem tempo para a racionalidade e para a compreensão complexa dos problemas e desafios.
Hoje já sabemos que o chavão inicial que nos impingiram, "Vai Ficar Tudo Bem", não passou de uma ilusão suportada na ignorância sobre o efeito devastador da pandemia nas solidariedades sociais. Hoje, sabemos pela experiência vivida, que não ficou tudo bem. Partiram-se redes de afeto que levarão muito tempo a reconstituir. E pressinto que toleramos com maior indiferença o sofrimento, a crueldade, a violência. Como se tivéssemos regredido no tempo assim como os indicadores económicos regrediram. Estamos muito mais pobres e acomodamo-nos. Conformamo-nos com um debate público a tocar o miserável no que respeita às grandes questões do nosso tempo e miseravelmente aplaudimos e muito menos protestamos.
Tempo ruim, este, que espera estudo e reflexão. Para sermos dignos da humanidade que a vida nos entregou.